A “ansiedade da autonomia” terá os dias contados, mas não na Europa. Ao abrigo do acordo a que a Volkswagen chegou com os Estados Unidos da América, na sequência do escândalo das emissões, o construtor alemão aceitou uma penitência na forma de 25 mil milhões de dólares. Desse pack faz parte um investimento de 2.000 milhões de dólares, destinado a acelerar a transição para a electromobilidade e, assim, limpar a reputação da marca junto dos consumidores norte-americanos. Como? Dando-lhes (literalmente) aquilo que os impede de optarem por veículos eléctricos: a tranquilidade de poderem carregar o seu veículo sempre que necessitarem.

Actualmente, o parque circulante dos Estados Unidos da América ainda tem uma fracção mínima de automóveis mais amigos do ambiente, o que se explica (em parte) pela ausência de uma rede pública onde híbridos plug-in e eléctricos possam suprir as suas necessidades de abastecimento. Para se ter uma ideia, a melhor rede é privada – da Tesla, cujos clientes, para cúmulo, não só podem carregar depressa, como alguns (a esmagadora maioria) ainda o fazem à borla.

Ora, agora que está cada vez mais perto a introdução da sua nova família de veículos eléctricos, a Volkswagen encarregou a sua subsidiária Electrify America de “semear” milhares de pontos de carregamento em todo o território norte-americano. Como a ideia é permitir que os utilizadores de veículos eléctricos possam percorrer o país de costa a costa, a rede da Volkswagen vai estar ligada a outras redes privadas, com os condutores a poderem carregar em qualquer uma delas sem para isso terem de ter uma conta ou um cartão específicos para cada operador – ao contrário do que se passa em Portugal.

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Em meados do próximo ano serão já mais de 12.500 os postos de carga instalados nos EUA, sendo que os da Volkswagen se localizarão prioritariamente nas zonas mais povoadas, regra geral junto ao litoral, e nas áreas onde há maior volume de eléctricos a circular. Será a marca a decidir onde vai colocá-los, uma vez que também é ela que os vai pagar. Já a electricidade poderá ou não ser cobrada, ficando isso ao critério do operador dos postos de carregamento.

Mas se está pensar que o plano de electrificação da América será um investimento a fundo perdido, desengane-se. É bom ter presente que quatro dos fabricantes que compõem o Grupo Volkswagen – incluindo o que dá nome ao conglomerado – vão lançar um total de 27 modelos eléctricos nos próximos anos.

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Mais, o investimento na nova plataforma MEB – a arquitectura desenhada especificamente para veículos 100% eléctricos – só será rentabilizado se a Volkswagen conseguir vender os 10 milhões de unidades que planeia vir a produzir. Uma vez que os EUA são “só” o segundo maior mercado automóvel mundial, deduz-se que grande parte dessa dezena de milhões terá como destino o mercado norte-americano. A confirmá-lo, as previsões da consultora IHS Markit, segundo a qual 12% do parque circulante dos EUA, em 2025, será representado por BEV ou PHEV. Um e outro precisam de electricidade e é aí que a Volkswagen pode capitalizar, pois quando os seus eléctricos chegarem ao mercado, os potenciais clientes já terão a percepção de que carregar não será um problema. O melhor exemplo disso chega-nos pela mão da Tesla, cujos 11.200 superchargers lhe permitiram ganhar uma ampla vantagem competitiva face à concorrência.

Em declarações à Automotive News, o vice-presidente da Electrify America, Brendan Jones, revelou que o investimento será faseado, em períodos de dois anos e meio, ao longo dos quais se instarão dois tipos de estações: carga rápida nos centros urbanos, carga “ultra” rápida nas vias rápidas (passe o pleonasmo). As primeiras terão três a seis carregadores com potências entre 50 e 150 kW, as segundas serão dotadas com um mínimo de quatro e um máximo de 10 carregadores de 350 kW, o que significa conseguir em 10 minutos a electricidade necessária para percorrer mais 320 km. De destacar ainda que os postos ultra-rápidos são compatíveis quer com o CCS (standard) quer com CHAdeMo, prevendo-se logo na primeira fase a instalação de 484. Já os carregadores de nível 2 (potências entre 50 e 150 kW) totalizarão 2.800 unidades, distribuídas por 500 localizações, entre centros de negócios e áreas residenciais. Tudo isto representa apenas um quarto do valor total a investir na próxima década. Ou seja, se com 500 milhões de dólares a cobertura da rede da Volkswagen ganha esta expressão, quando os 2.000 milhões já estiverem no terreno, é praticamente certo que a marca terá semeado boas hipóteses de ter montado um novo negócio. O compromisso é o de manter a rede durante 10 anos. Se der dinheiro, com certeza que será (mais) um negócio a explorar.