O deputado socialista José Magalhães considera que Portugal não pode ficar descansado com o que se passou nas presidenciais do Brasil e tem de adaptar as suas leis para tentar travar novas formas de manipulação das eleições. “As regras que existem estão todas viradas para as formas tradicionais de financiamento” de partidos e eleições, que nada falam sobre bit coins, alertou, em entrevista à agência Lusa, o deputado do PS e especialista em ciberespaço.

José Magalhães admite que as chamadas fake news — notícias falsas — possam vir a ser usadas em maior escala nas eleições europeias de maio do próximo ano, incluindo em Portugal, o que explica as ações tomadas ao nível europeu. Em 25 de outubro, o Parlamento Europeu aprovou uma resolução em que apela aos Estados-membros da União Europeia (UE) a “adaptarem as regras eleitorais às campanhas online, como as regras relativas à transparência sobre o financiamento, os períodos de reflexão, o papel dos meios de comunicação social e a desinformação”.

O deputado elogiou a resolução e dá o exemplo dos anúncios eleitorais ou políticos nas redes sociais que “não estão regulados” na lei portuguesa, como os que terão beneficiado Jair Bolsonaro nas presidenciais brasileiras, através do pagamento de anúncios nas redes sociais. No total, segundo foi noticiado, um grupo de empresários gastou 120 milhões de reais (28,5 milhões de euros) a favor de Bolsonaro, candidato da extrema-direita, vencedor das eleições.

José Magalhães dá o bom exemplo do código de boas práticas da Comissão Europeia, que entrou em vigor em outubro, e que estabelece um acordo com “diversas plataformas divulgadoras de conteúdos” de forma a “acertar linhas de ação para combater conteúdos que não devem deixar de ser combatidos”.

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Este texto, ainda não traduzido para português, define também “áreas de atuação conjunta” entre as plataformas e os Estados “para conseguir que sejam escrutinados e evitados os anúncios” nas redes sociais. “Os tais que tanto peso tiveram na campanha brasileira e que, sem dúvida nenhuma terão na campanha eleitoral para o Parlamento Europeu”, afirmou, lembrando que não estão regulados em vários países europeus, incluindo Portugal.

Com a corregulação entre a comissão e as plataformas a dar “passos importantes”, o deputado e ex-secretário de Estado advertiu que esse facto “não dispensa os Estados” de tomarem decisões, em várias áreas, como as políticas antimonetização dos anúncios nas redes ou na legislação eleitoral e de financiamento dos partidos e campanhas eleitorais.

São necessárias “políticas que impeçam a monetização dos ‘maus anúncios'”, ou seja, o “conjunto de cliques que dão rendimento a quem coloca o anúncio”, que pode ser de apoio a um candidato dos extremos, mais ou menos radicais. “Estabelecem-se regras [no código de boas práticas] nessa matéria para disciplinar as plataformas, e elas aceitam ser disciplinadas, e aceitam seguir regras que ataquem os lucros por cliques obtidos por esse tipo de operadores”, explicou.

As bit coins e outras moedas digitais devem também preocupar quem faz as leis, em Portugal ou na Europa. “As formas resultantes do uso de espécies monetárias como bit coins e outras, a colocação por terceiros de anúncios favoráveis a entidades que se confrontam eleitoralmente, como aconteceu no Brasil com um consórcio de empresas” no Brasil, “são figuras completamente novas para os quadros legais” do país, exemplificou.

O facto de Bruxelas ter adotado “regras comuns entre as plataformas e a Comissão” não “dispensa os Estados de agir, defende. Pelo contrário, “dá guidelines (linhas orientadoras) para o que é necessário fazer”, afirmou ainda José Magalhães.

Os fenómenos das fake news e da manipulação eleitoral ganharam relevo com as eleições nos Estados Unidos, no Brasil e o referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia. O Parlamento Europeu quer travar o fenómeno nas europeias de 2019.