O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) admitiu esta terça-feira estar “seriamente preocupado” com a instabilidade provocada pela greve dos juízes e entende que os cidadãos tenham dificuldade em compreendê-la.

“Estou preocupado seriamente com a instabilidade gerada pela greve no sistema de justiça, cujo funcionamento é essencial para os cidadãos”, afirmou à agência Lusa o juiz conselheiro António Joaquim Piçarra, que é por inerência presidente do Conselho Superior da Magistratura.

Treze anos depois, os juízes voltaram esta terça-feira a cumprir o primeiro de 21 dias alterados de greve, em protesto contra a aprovação de um Estatuto “incompleto”, que alegam não assegurar questões remuneratórias, o aprofundamento da independência judicial e os bloqueios na carreira.

António Piçarra mostrou-se muito preocupado com a paralisação dos magistrados, mas esperançoso de que a greve não se cumpra na sua totalidade, evitando assim mais instabilidade no sistema de justiça e incompreensões por parte dos cidadãos.

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Entende o juiz conselheiro que o sistema judiciário está a ser “seriamente afetado com as notícias” sobre a paralisação dos tribunais devido à greve, mas acredita que ainda é possível reverter a situação. “Tenho a convicção de que o momento do diálogo [entre o Ministério da Justiça e Associação Sindical dos Juízes] ainda se mantém. Sei que há divergências que se foram atenuando e que hoje são apenas de alguns pormenores. Estou convicto de que o diálogo irá prosseguir”, referiu.

António Joaquim Piçarra mostrou-se confiante de que as duas partes chegarão “a uma solução em breve de modo a evitar que haja novas paralisações”, e diz continuar disponível para ajudar a encontrar consensos. “Mantenho a minha total disponibilidade para tentar aproximar as partes de modo a permitir que o diálogo prossiga e se encontre uma solução que evite novas paralisações”, frisou.

Contudo, disse, caso os juízes cumpram os restantes dias de greve, constante no pré-aviso, ficará “muito mais preocupado” e o sistema de justiça sairá mais afetado.

O sistema de justiça, essencial para o país, é seriamente afetado com as notícias que correm e com a instabilidade que vai gerando a greve, associada à dos funcionários judiciais”, sustentou.

Questionado se os cidadãos comuns entendem a greve e as reivindicações dos magistrados, o juiz conselheiro diz compreender a dificuldade em entenderem os motivos da paralisação. “Há duas perspetivas de entendimento: uma perceção interna entre juízes e a perspetiva dos cidadãos e, se internamente é entendível e compreensível, os cidadãos têm alguma dificuldade em a compreender e isso eu aceito”.

Francisca Van Dunen diz que greve de juízes retira credibilidade às instituições

A ministra da Justiça, Francisca Van Dunen, considerou esta terça-feira que a greve dos juízes pode retirar credibilidade às instituições e que o executivo está disposto a encontrar soluções para resolver o conflito.

“Este tipo de situações acaba por redundar em alguma descredibilização das instituições que são indesejáveis e é por isso que vamos continuar a fazer tudo para evitar que seja assim”, disse a ministra da Justiça à margem da Cimeira Internacional dos Direitos Humanos das Mulheres que decorre em Lisboa.

Para Francisca Van Dunen a reação dos juízes foi desproporcional face ao processo que está a correr e que desconhecendo os níveis de adesão à paralisação realça que uma greve é a resposta “mais radical” quando um conflito se agudiza. “Eu diria que, neste caso, o conflito não só não se agudizou como pelo contrário houve conversas no sentido de se removerem os obstáculos que impediam o consenso”, considerou.

“Aquilo que está em causa é que são profissionais que são simultaneamente titulares de órgãos de soberania e este ambiente transmite para o exterior uma imagem que não corresponde aquilo que efetivamente deve ser o relacionamento institucional dos titulares de órgãos de soberania”, acrescentou Francisca Van Dunen.

A Associação Sindical dos Juízes Portugueses marcou uma maratona de 21 dias de greves que se iniciou na terça-feira, com uma paralisação geral que abrange todos os tribunais do país e envolve, à partida, cerca de 2.300 magistrados judiciais. A associação defende que a revisão do Estatuto dos Juízes não pode abranger só “metade” daquela carta de direitos e deveres, sem resolver os “bloqueios remuneratórios” criados nos anos 1990.

Para a ministra da Justiça aquilo que aconteceu foi a circunstância de os juízes não terem uma carreira o que significa, acrescentou, que os escalões superiores, nomeadamente desembargadores e conselheiros, tenham o ordenado limitado ao teto equiparado ao ordenado do primeiro-ministro. “Essa questão foi resolvida”, frisou acrescentando que a reunião que decorreu na segunda-feira no Ministério da Justiça e os representantes da associação sindical foi “amena e franca”.

“Eu pensava que todas as questões estavam trabalhadas para ser possível com mais tempo formalizarmos um acordo. Entretanto a resposta que obtivemos foi no sentido de que quereriam (associação sindical) ter uma formulação escrita sobre as propostas. Ora essa formulação só é possível fazer com um bocado mais de trabalho”, afirmou.