“Se isto fosse nos anos 80, tinha originado um motim”, escrevia no Twitter um jornalista no Emirates Stadium (que por acaso também torce pelo Arsenal) a propósito do golo de Eric Dier à meia hora de jogo e respetiva celebração. A rivalidade entre gunners e Tottenham no North London Derby é conhecida, já teve momentos tão díspares como acusações de corrupção ou trocas diretas de capitães (como aconteceu com Sol Campbell, ex-central que assinou esta semana como técnico do Macclesfield Town do quarto escalão inglês), mas os únicos ânimos quentes até esse momento vinham do ritmo frenético a que tinha sido disputado o encontro; a partir do momento em que o antigo jogador do Sporting festejou mandando calar os adeptos visitados, numa zona onde estavam jogadores em aquecimento, andaram sempre exaltados. Mas foi sobretudo um grande jogo de futebol.

Apesar de ter perdido Özil no período de aquecimento, devido a um problema de última hora nas costas, o Arsenal, que levava uma série de 18 encontros consecutivos sem perder depois das derrotas iniciais com Manchester City e Chelsea, “atropelou” o rival londrino nos primeiros 20 minutos em que o Tottenham quase nunca conseguiu sequer ligar três passes consecutivos. Son Heung-min ainda tentou incomodar Leno pelo meio numa única ocasião mas o terreno parecia inclinado para os gunners que tinham a artilharia toda na frente e disparavam de qualquer lado. A vantagem tangencial até era curta.

Aubameyang, que converteu sempre as últimas nove grandes penalidades batidas em jogos da Premier League, fez de penálti o 1-0 aos dez minutos, naquele que foi então o seu quinto golo em seis jogos frente ao Tottenham e o 15.º em 17 encontros realizados ao domingo (nisto das estatísticas versão NBA, os ingleses não perdoam). Mas ainda houve uma bola certa de golo de Alex Iwobi, após cruzamento atrasado da esquerda, que Lloris conseguiu travar com as pernas. Os laterais dos spurs, em especial Aurier na direita, não sabiam o que fazer e Vertonghen, que cortara uma bola na mão sem necessidade, não sabia mais o que fazer. Todavia, um golo pode mudar num jogo de futebol. Ainda mais quando esse golo é na Premier League.

O árbitro Mike Dean tinha acabado de exibir o cartão amarelo a Eric Dier por causa de uma falta anterior (e com uma conversa que não lhe dava muita margem para novas infrações daquelas) quando o Tottenham beneficiava de um livre lateral descaído na esquerda do ataque. Eriksen, o mágico que puxa os cordelinhos de todo o jogo da equipa, bateu em arco, o jogador formado no Sporting desviou ao primeiro poste e Leno voltou a ficar mal na fotografia (30′). Festa dos spurs, revolta dos gunners: depois do internacional inglês ter celebrado a mandar calar os adeptos da casa, os suplentes do Arsenal ainda se embrulharam com os do Tottenham, Ramsey e Dele Alli andaram agarrados e os ânimos já quentes entraram em ebulição.

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O Tottenham pouco ou nada tinha feito para chegar ao empate mas conseguiu mudar tudo em menos de cinco minutos e com mais polémica à mistura: num lance onde Son – o melhor dos visitantes no primeiro tempo – não pareceu ser tocado antes de cair na área (e onde voltou a haver jogadores embrulhados, neste caso Kolasinac e Sissoko), Mike Dean assinalou mais uma grande penalidade e o goleador Harry Kane fez o 2-1 aos 34′. Mustafi, nos descontos antes do intervalo, ainda acertou de cabeça na trave mas o descanso chegaria com um Arsenal a jogar e um Tottenham a marcar, estando na frente do marcador.

Eric Dier aqueceu os ânimos ao celebrar desta forma o golo do empate do Tottenham no Emirates Stadium (ADRIAN DENNIS/AFP/Getty Images)

Se contassem apenas os resultados ao intervalo, o Arsenal estaria agora no antepenúltimo lugar da Premier League. Mais: não houve um único jogo até ao momento no Campeonato em que os gunners tenham saído na frente. É um sinal preocupante mas um defeito que se torna na maior das virtudes tendo em conta as reações nas etapas complementares: marcou sempre, apenas por duas vezes perdeu e quando estávamos ainda em agosto, e mantém-se na corrida ao título, tendo igualado agora os 30 pontos do rival. Neste caso, a chave esteve nas alterações ao intervalo, com as entradas de Ramsey e Lacazette.

O Tottenham até entrou melhor, com Leno a ter mais uma saída aos papéis de bola parada antes de defender com nota artística um livre direto de Kane (50′), mas um fantástico golo de Aubameyang (56′), num remate em jeito colocado de fora da área, mudou por completo o encontro: Dele Alli ainda salvou uma bola em cima da linha mas Lacazette (75′, a beneficiar ainda de um desvio na perna de Eric Dier antes de bater no poste e entrar) e Torreira (77′, a culminar da melhor forma uma grande jogada coletiva) apontaram o 4-2 que “matou” o encontro e levou os adeptos da caca a abrirem um pote de fumo numa das bancadas, algo anormal na Premier League onde tudo o que seja artefactos pirotécnicos e afins quase não se veem.

Aubameyang marcou o sexto golo em seis dérbis contra o Tottenham desde que chegou ao Arsenal (ADRIAN DENNIS/AFP/Getty Images)

Com dezenas de adeptos dos spurs a tentarem abandonar o Emirates Stadium antes do apito final, Vertonghen ainda viu vermelho por acumulação após uma entrada perigosa sobre Lacazette, houve mais umas picardias em campo e tudo acabou com uns “olés” que nunca ninguém gosta de ouvir mas o resultado não voltou a mexer, naquele que foi mais um grande dérbi entre rivais do norte de Londres (com oito amarelos, seis golos, duas reviravoltas e um vermelho pelo meio) onde o Arsenal foi claramente superior e aumentou a série sem derrotas para 19 partidas antes da deslocação a Old Trafford, onde defrontará o Manchester United de José Mourinho na quarta-feira.