O economista francês Thomas Piketty é o principal autor de um manifesto publicado esta segunda-feira em vários jornais europeus — e subscrito por mais de 50 personalidades de vários países, maioritariamente de esquerda — para “salvar a Europa de si própria”, que tem como proposta central a criação de uma assembleia europeia para garantir a justiça no pagamento de impostos na UE, especialmente no que toca às grandes multinacionais.
Publicado numa altura em que a tensão em torno do Brexit se adensa, o manifesto pretende lutar contra o “impasse tecnocrático” em que, consideram os signatários, a União Europeia se encontra mergulhada. “Na sequência do Brexit e da eleição de governos anti-europeus em vários Estados-membros, não é possível continuar como antes”, escrevem os autores, acrescentando: “Não podemos simplesmente continuar a esperar as próximas partidas ou um maior desmantelamento sem fazermos mudanças fundamentais na Europa de hoje”.
Entre os signatários encontram-se o antigo primeiro-ministro italiano Massimo D’Alema, o líder do espanhol Podemos, Pablo Iglesias, ou Michael Jacobs, antigo conselheiro do primeiro-ministro britânico Gordon Brown.
Uma das preocupações centrais dos autores é o combate ao chamado défice democrático da UE, com a criação de uma assembleia europeia, um organismo soberano e independente dos tratados que regem o funcionamento da União, mas com relações de proximidade com as instituições europeias tradicionais.
Esta assembleia seria, idealmente, uma “instituição pública capaz de lidar com crises na Europa de forma imediata e de produzir um conjunto fundamental de bens e serviços públicos num quadro económico duradouro e baseado na solidariedade”. Nesse sentido, teria a última palavra no que toca à política fiscal da União Europeia e poderia aplicar medidas fortes em casos como os da Google ou da Apple, empresas que têm procurado reduzir a quantidade de impostos que pagam com base na legislação dos Estados-membros em que se registam.
A assembleia europeia iria supervisionar um orçamento de 800 mil milhões de euros por ano (quatro vezes o atual orçamento), que seria financiado através de quatro impostos europeus: sobre as grandes empresas; sobre os rendimentos acima dos 200 mil euros por ano; sobre as fortunas acima de um milhão de euros; e sobre as emissões de carbono. Este dinheiro, sustenta o manifesto, poderá “financiar investigação, formação e universidades europeias”. O objetivo declarado é reduzir a desigualdade “dentro dos países, não entre eles”.
De acordo com a informação publicada no jornal britânico The Guardian, as prioridades da nova assembleia deverão ser o investimento em inovação e desenvolvimento (200 mil milhões de euros); a promoção de tecnologias verdes para combater as alterações climáticas (80 mil milhões de euros); a criação de um fundo para apoiar os países que estão a lidar com a crise de refugiados (80 mil milhões); e ainda o apoio à agricultura e à indústria que estão em processo de transição para uma economia mais verde. O restante seria distribuído aos Estados-membros. A nova assembleia europeia seria composta por eurodeputados e por políticos nacionais dos vários Estados-membros.
O manifesto foi publicado esta segunda-feira nos jornais The Guardian (Reino Unido), Le Monde (França), Der Spiegel (Alemanha), La Vanguardia (Espanha), Gazeta Wyborcza (Polónia), La Repubblica (Itália) e Politiken (Dinamarca).