Podia dizer-se que o jogo desta quarta-feira entre Benfica e AEK era a feijões: afinal, tanto portugueses como gregos estavam já eliminados da Liga dos Campeões e já se sabia que seriam os encarnados a garantir o terceiro lugar do Grupo E, que dá acesso à Liga Europa. Mas os feijões que estavam em jogo eram daqueles que enchem cofres, pagam salários e dão prémios de jogo. 2,7 milhões de feijões. Isso e a possibilidade de ser cabeça-de-série no sorteio dos 16 avos de final da Liga Europa. E, claro, algo importante chamado orgulho.

O Benfica chegava ao último jogo da fase de grupos da Liga dos Campeões para enfrentar a única equipa que conseguiu vencer na principal competição europeia de clubes. Já eliminados, os encarnados recebiam o mesmo AEK que bateram na Grécia, a jogar com dez e com um grande golo de Alfa Semedo do meio da rua, e Rui Vitória tirava da convocatória Jonas e Fejsa: Alfa Semedo assumia o lugar do sérvio no meio-campo e lá à frente jogava Seferovic. Na ala, saía Zivkovic mas não entrava Franco Cervi; o menino João Félix acrescentou mais uma medalha de dia de estreia e cumpriu o primeiro jogo na Champions. O Benfica, ainda que não dependesse apenas de si mesmo, sabia que ganhar tornava quase definitivo o estatuto de cabeça-de-série no sorteio de segunda-feira que vai decidir o emparelhamento da Liga Europa. O AEK, por seu lado, apresentava-se na Luz com uma linha defensiva de quatro elementos, com cinco jogadores no meio-campo e o argentino Ezequiel Ponce solto na frente.

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Ficha de jogo

Benfica-AEK, 1-0

6.ª jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Bobby Madden (Escócia)

Benfica: Vlachodimos, André Almeida, Jardel, Rúben Dias, Grimaldo, Alfa Semedo, Pizzi (Cervi, 59′), Gedson, Rafa (Zivkovic, 35′), Seferovic, João Félix (Castillo, 76′)

Suplentes não utilizados: Svilar, Conti, Gabriel, Krovinovic

Treinador: Rui Vitória

AEK: Barkas, Bakakis, Oikonomou, Chygrynskiy, Hult, Cosic, Moran (Rodrigo Galo, 76′), Galanopoulos, Klonaridis (Gianniotas, 60′), Ponce, Boye (Mantalos, 68′)

Suplentes não utilizados: Tsintotas, Giakoumakis, Svarnas, Mpotos

Treinador: Marinos Ouzounidis

Golos: Grimaldo (88′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Rúben Dias (37′), Hult (73′), Mantalos (82′), duplo cartão amarelo a Galanopoulos (83′ e 87′)

O Benfica entrou em campo com vontade de chegar depressa à área adversária: afinal, os encarnados não vencem em casa para a Liga dos Campeões desde 2016 (1-0 ao Dínamo Kiev) e era necessário espantar os fantasmas que a série positiva de três vitórias consecutivas ainda não conseguiu apagar. A Liga dos Campeões, mais do que calcanhar de Aquiles, tem sido a farpa dolorosa num já doloroso calcanhar de Aquiles que tem sido a temporada do Benfica e de Rui Vitória. A par dos desaires nas competições internas, como são exemplos as derrotas com o Belenenses e com o Moreirense, o treinador encarnado sofreu a maior vaga de contestação e estava à beira da saída depois da goleada da última jornada europeia, em Munique, onde o Benfica perdeu com o Bayern por 5-1 e confirmou a eliminação. Era necessário, por isso, vencer o AEK, aumentar o registo para quatro vitórias seguidas e sair da Liga dos Campeões com a pontuação aceitável de sete pontos e o currículo sofrível de duas vitórias, um empate e três derrotas (tendo em conta que no Grupo E estavam também Ajax e Bayern Munique). E, para isso, era bom arrancar bem.

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Pizzi, que tem passado ao lado dos últimos jogos do Benfica e tem deixado as posições de destaque para Zivkovic e Rafa, parecia esta quarta-feira mais inspirado e foi durante o minutos iniciais o maestro que nas últimas épocas tanto contribuiu para os feitos do Benfica de Rui Vitória; aos 15 minutos de jogo, o médio português tinha já 22 ações com bola e tinha acertado todas as tentativas de passe. Até aos 20 minutos, os encarnados bloquearam por completo o AEK logo na primeira linha de pressão e jogaram com dez elementos dentro do meio-campo grego. Jardel surpreendeu depois de um canto batido na esquerda e cabeceou sozinho mas ao lado, Grimaldo assustou Barkas com um livre direto marcado em jeito e Alfa Semedo tirou o lance de Jardel a papel químico para surgir sozinho a cabecear depois de um canto e atirar ao lado. À meia-hora, não havia qualquer oportunidade de golo e o AEK tinha acabado de realizar a primeira ação nos últimos 30 metros do relvado.

O Benfica desceu ligeiramente as linhas nos 15 minutos finais da primeira parte e abriu mais espaço entre os setores e nas costas do meio-campo, dando origem a lançamentos longos do lateral Hult que provocaram desequilíbrios na organização defensiva encarnada. Ainda assim, de forma organizada, pensada e apoiada e à exceção de uma aceleração inconsequente de Ponce, os gregos não causaram quaisquer problemas a Jardel e Rúben Dias. Do outro lado, Grimaldo e Pizzi eram os jogadores mais inconformados com o nulo no marcador e Seferovic podia ter marcado ao aproveitar um mau atraso da defesa do AEK. Quando o escocês Bobby Madden apitou para o intervalo, o acontecimento mais relevante da primeira parte era a lesão de Rafa, o melhor marcador encarnado, que teve de ser substituído por Zivkovic depois de sentir dores numa das pernas.

No regresso para a segunda parte, o jogo era uma simples fotocópia daquilo que tinha sido a primeira. O Benfica tinha mais bola mas faltava criatividade e soluções para ultrapassar a boa organização defensiva do AEK. Já os gregos estavam no jogo como queriam: sem sofrer golos e com um ponto, o primeiro nesta fase de grupos, evitando a marca negativa de ser a única equipa desta edição da Liga dos Campeões a não conquistar qualquer ponto nesta fase.

Se na primeira parte o AEK ainda teve um fôlego final e aproximou-se da área de Vlachodimos, na segunda os gregos remeteram-se à defesa do resultado e permitiram ao Benfica fazer o que quisesse na ala esquerda do ataque — Grimaldo, à imagem do que tinha mostrado no passado sábado, contra o V. Setúbal, é o impulsionador do fluxo ofensivo encarnado. Todo o ataque do Benfica passa pelos pés do lateral esquerdo espanhol, que passa, recebe, distribui e remata. Grimaldo está num extraordinário pico de forma, ao contrário da generalidade da restante equipa, e é ele que tenta levar avante os objetivos encarnados. Se o jogo tivesse terminado sem golos, o Benfica tinha realizado uma exibição com pouco sal, Seferovic tinha atirado uma bola ao poste e outra à barra, Castillo tinha voltado a entrar sem qualquer impacto e João Félix tinha passado um jogo a ver jogar, numa partida onde se exigia um espírito mais combativo do que aquele apresentado pelo jovem avançado; com o resultado final, tudo isto continua a aplicar-se com uma adenda: Grimaldo coroou uma exibição fantástica com um grande golo.

A menos de cinco minutos do final, Galanopoulos fez falta sobre Gedson à entrada da área do AEK, viu segundo cartão amarelo (tinha visto o primeiro cinco minutos antes) e foi expulso. Na conversão do livre direto, a descair na direita, Grimaldo bateu em jeito de pé esquerdo e levantou as bancadas da Luz. Aos passes, aos ataques, às arrancadas, aos cruzamentos, o espanhol acrescentou um bonito golo. O Benfica não fez um grande jogo e foi incapaz de ultrapassar a barreira defensiva que o AEK trouxe até Lisboa; mas beneficiou de um grande golo de Grimaldo, carimbou a quarta vitória consecutiva, aproveitou a conjugação de resultados dos restantes jogos e é cabeça-de-série no sorteio dos 16 avos de final da Liga Europa (os outros melhores terceiros são Nápoles, Inter e Valência). Os encarnados terminam a fase de grupos da Liga dos Campeões com sete pontos, duas vitórias, duas derrotas e um empate — o que, face aos zero pontos e seis derrotas da época passada, é francamente positivo. Rui Vitória voltou a vencer e a crise parece estar cada vez mais longe. Grimaldo bateu em jeito de pé esquerdo e os cofres da Luz receberam 2,7 milhões de feijões.