O Presidente angolano, João Lourenço, está a terminar uma semana de férias em Moçambique, num momento em que analistas consideram que se assiste a uma aproximação crescente entre os dois países. “É claramente um sinal de aproximação”, refere Fernando Lima, presidente do grupo de comunicação social Mediacoop, que compara os dois países a “irmãos que sabem que são irmãos, mas com uma relação marcada por uma grande e inexplicável frieza”.

No seu entender, “os dois países só têm a ganhar” se aprofundarem a cooperação bilateral, acrescenta, destacando um encontro informal entre João Lourenço e Filipe Nyusi, Presidente de Moçambique, à margem da cimeira da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada em julho, na ilha do Sal, Cabo Verde.

“Há um novo posicionamento de Angola em relação a Moçambique com a entrada de João Lourenço”, que tomou posse como presidente em setembro de 2017, nota Muhamad Yassine, analista político moçambicano, especialista em relações internacionais.

Os sucessivos encontros entre dirigentes dos dois países são “um sinal inequívoco de que há um reatar efetivo do relacionamento”, algo diferente do que se passava na era de José Eduardo dos Santos, ex-presidente angolano, “que nem participava na tomada de posse dos chefes de Estado moçambicanos”, recorda. Os tempos eram outros e havia uma “relação gelada” que agora mudou com Lourenço e Nyusi. No caso, “a relação interpessoal entre ambos sempre foi muito forte”, lembrando que “foram ministros da Defesa” dos respetivos países — Fiipe Nyusi entre 2008 e 2014 e Lourenço entre 2014 e 2017.

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Calton Cadeado, especialista moçambicano em relações internacionais, nota que “Moçambique e Angola tem relações históricas, políticas, desde os tempos da luta pela independência” e posteriormente, face a um inimigo comum, o regime do apartheid, na África do Sul.

No entanto, “terminada a guerra em Moçambique [1992], sentiu-se um certo distanciamento”, com Maputo a implementar a democratização do país e Luanda a enfrentar uma luta que só acabou em 2002. Armando Guebuza ascende ao poder em Moçambique em 2005 e “a primeira visita que faz é a Angola”, mas não houve um sinal recíproco, ou seja, tratou-se de “um impulso de pouca dura”, refere.

O distanciamento registava-se também “ao nível da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC)”, diz Muhamad Yassine: Moçambique tem defendido a livre circulação de bens, enquanto Angola tem sido mais cautelosa e privilegiado a soberania do Estado. Mas os dois são “os únicos países que falam português” na SADC e perspetiva-se que Moçambique regresse a um crescimento económico acelerado com o início da exploração de gás natural nos próximos anos. Ou seja, há todos os ingredientes para que se inicie uma nova relação, mais próxima, considera o analista.

Fernando Lima acredita que a diplomacia moçambicana “sempre se mexeu melhor na África Austral” do que a angolana, pelo que o país do Índico “também pode ser importante nesse sentido, para fazer passar uma imagem diferente” de Angola. Por outro lado, Moçambique está na “reta final para entrar na era de produção e exportação de gás natural”, pelo que pode ter “muito a ganhar com a experiência de Angola”.

Moçambique é ainda um dos países africanos com maiores credenciais em relação ao investimento chinês no continente, papel que o poderá colocar num patamar privilegiado para ajudar a estabelecer pontes entre Pequim e Luanda, acrescenta Muhamad Yassine.

Uma medida que aproximou os dois povos foi o estabelecimento de voos diretos entre as duas capitais, atualmente operados pelas Linhas Aéreas de Angola (TAAG), sublinha Calton Cadeado, que destaca também a importância da supressão de vistos alcançada no início do ano. O acordo entrou em vigor em fevereiro e permite a isenção para cidadãos dos dois países que queiram viajar para fins de turismo ou visitas familiares por um período de 30 dias — e já antes tinha entrado em vigor a isenção para passaportes diplomáticos.

A medida tinha sido preparada em novembro de 2017, no âmbito da visita do ministro do Interior de Moçambique, Jaime Basílio Monteiro, a Angola, altura em que defendeu, com o homólogo, formas de aumentar a mobilidade dos cidadãos dos dois países e dinamizar os fluxos de investimento e turismo. “É um sinal da aproximação que está a acontecer entre ambos países”, realça Cadeado.

No final de agosto, o embaixador de Moçambique em Luanda, Santos Álvaro, despediu-se de João Lourenço, ao deixar o posto diplomático, e anunciou a intenção de o presidente angolano se deslocar a Moçambique antes do fim do ano para uma visita oficial, com Filipe Nyusi a passar por Angola em 2019. Aguardam-se por desenvolvimentos desta agenda avançada pelo diplomata.

O ministro das Relações Exteriores de Angola, Manuel Domingos Augusto, visitou Moçambique há pouco mais de um mês e, além de estreitar relações de cooperação, a visita de três dias serviu para preparar a visita de Estado do Presidente angolano.

“Tivemos conversações produtivas e muito importantes para o futuro próximo desta cooperação bilateral. É do nosso desejo estreitar as relações com a república irmã de Moçambique”, declarou, na altura, Manuel Domingos Augusto, acrescentando que é imperioso que as partes passem “do discurso político para a ação”.