É como se o Reino Unido fosse um avião prestes a fazer uma aterragem de emergência e a comandante Theresa May dissesse a toda a tripulação e passageiros: preparem-se para o impacto. Tudo isto porque esta terça-feira, conta o The Guardian, os ministros do governo britânico ativaram os planos de emergência para a possibilidade de o Reino Unido sair da União Europeia sem um acordo.

Nos ministérios, o executivo de Theresa May chegou a acordo para que fossem transferidos 2 mil milhões de libras (2,2 mil milhões de euros) atualmente depositados num fundo para emergências para ministérios como a Administração Interna ou o Ministério para o Ambiente, Agricultura e Assuntos Rurais.

O ministro da Defesa, Gavin Williamson, adiantou também esta terça-feira à tarde, numa sessão na Câmara dos Comuns, que vai haver 3500 militares — nos quais se incluem nos só tropas no ativo mas também na reserva — para “apoiarem qualquer ministério na aplicação dos seus planos de contingência”.

De acordo com aquele jornal, o governo também está a preparar, neste momento, um conjunto de conselhos a enviar às empresas do Reino Unido, entre os quais está a sugestão de que também eles comecem a preparar os seus planos de contingência. Esta informação vai ser divulgada pela Her Majesty’s Revenue Customs (HMRC, análoga às Finanças portuguesas), que deverá preparar um documento de 100 páginas sobre como as empresas devem agir.

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Aos cidadãos, serão transmitidas mensagens através da televisão e redes sociais, onde serão descritos passos a tomar para que estes se preparem para um hard Brexit.

“Há bastante tempo que levamos a sério a possibilidade de não haver um acordo”, disse o secretário de Estado para a Habitação, Comunidades e Autarquias, ao The Guardian. “Não vou fingir que não estamos a dar um passo em frente nas preparações para a ausência de um acordo. Embora, francamente, e tal como outros diriam de forma contundente, a maneira de evitar isso é a de o parlamento votar a favor do acordo.”

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O Reino Unido vive neste momento um impasse político e também diplomático, à medida que a data prevista para a sua saída da União Europeia, 29 de março, se aproxima sem que seja ainda claro de que forma se dará o Brexit. O acordo obtido por Theresa May junto dos restantes 27 países da União Europeia não agrada dentro do seu país — até dentro do seu partido, onde alguns tentaram, sem sucesso, conseguir a sua demissão na passada semana — e, ciente disso, o governo está a tentar adiar ao máximo a data da votação do acordo na Câmara dos Comuns.

Neste momento, prevê-se que esse acordo seja votado na semana iniciada a 14 de janeiro. Até lá, Theresa May vai procurar usar o tempo para convencer os seus próprios deputados, do Partido Conservador, e também os unionistas do DUP, que sustentam o seu governo minoritário, dos méritos do acordo — e vai tentar demovê-los dos defeitos que lhe têm sido apontados, entre eles o backstop na fronteira entre as duas Irlandas.

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Caso o acordo venha a ser chumbado nessa votação de 14 de janeiro, as dificuldades de Theresa May seriam ainda maiores. Em primeiro lugar, porque um chumbo em Londres obrigá-la-ia a voltar a Bruxelas para renegociar praticamente em cima do prazo da saída do Reino Unido da UE. Em segundo lugar, porque Bruxelas e os 27 da UE já disseram claramente que o acordo finalizado a 25 de novembro não é negociável.

De acordo com o Tribunal Europeu de Justiça, o Reino Unido pode suspender unilateralmente a aplicação do Artigo 50 do Tratado de Lisboa, a cláusula ativada em 2017 para dar início à saída do Reino Unido. Porém, esta estratégia ainda não é assumida diretamente pelo governo britânico. De acordo com o que foi dito esta terça-feira a partir Downing Street, conseguir a aprovação do acordo de 25 de novembro continua a ser a “principal prioridade” do governo britânico.

Porém, esse não parece ser um caminho totalmente certo — e, a chegar lá, a estrada será certamente tortuosa. Por isso, para já a mensagem começa a ser cada vez mais apenas uma: preparem-se para o impacto.