A seleção feminina de futebol do Afeganistão acusou o presidente da federação afegã, Keramuudin Karim, de abuso sexual, agressões físicas, assédio e ameaças, noticiou o jornal The Guardian. A Procuradoria-Geral afegã decidiu suspender o presidente e mais quatro membros da Federação de Futebol do Afeganistão (FFA) depois de ter investigado as acusações tornadas públicas pelo jornal britânico.

A FIFA também está a investigar o caso e tem trabalhado com a ONU para garantir a segurança das jogadoras. A FFA disse, por sua vez, que “rejeita vigorosamente as falsas acusações que se relacionam com a seleção feminina de futebol” e que tem “uma política de tolerância zero em relação a esse tipo de comportamentos”.

O caso foi tornado público por várias mulheres ligadas ao futebol afegão, incluindo Khalida Popal, que chegou a ser dirigente da secção de futebol feminino antes de fugir do país em 2016. A antiga capitã da seleção afegã apercebeu-se de que havia algo errado, em fevereiro, num campo de treino na Jordânia que organizou para equipas nacionais. A equipa feminina afegã chegou com dois homens que dormiam no mesmo quarto que as jogadoras e que as coagiam e agrediam. Popal ligou ao presidente da federação para acabar com esta situação, mas as agressões continuaram e nove atletas acabaram por ser expulsas da equipa.

“É muito difícil para nós, vivendo no país, falar destas coisas, porque estes são tipos muito poderosos. Se uma jogadora do Afeganistão levantar a voz pode ser morta”, disse Khalida Popal ao The Guardian. Por isso mesmo, as atletas que falaram com o jornal britânico, preferiram manter o anonimato, receiam pela própria segurança e a das famílias.

Uma das atletas diz que Keramuudin Karim lhe apontou uma arma à cabeça, depois da agressão sexual, ameaçando-a que a mataria e à família se falasse com a comunicação social. Outra diz que ele ameaçou que lhe cortava a língua, porque ela fugiu depois de ter sido agredida sexualmente. Uma terceira foi expulsa da equipa e acusada de ser lésbica depois de ter evitado as investidas do presidente.

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O quarto escondido

Pelo menos duas atletas contaram ao The Guardian que no gabinete do presidente existe uma divisão escondida, como um quarto de hotel, que só abre com a impressão digital de Karim. A uma das jogadoras, a que viu a arma apontada à cabeça, terá dito depois de a fechar no quarto: “Grita o quanto quiseres, ninguém te vai ouvir, não te conseguem ouvir”. A atleta conta que foi agredida na cara, sangrou do nariz e da boca, caiu na cama e acabou por perder os sentidos por causa das agressões. “Quando acordei, as minhas roupas tinham desaparecido e havia sangue por todo o lado. Estava a tremer, não sabia o que me tinha acontecido. A cama estava coberta de sangue, o sangue vinha da minha boca, nariz e vagina.”

Foi quando ameaçou que ia contar tudo à comunicação social que terá visto uma arma apontada à cabeça e ouviu a ameaça à sua vida e da família. Depois disso foi expulsa da equipa e acusada de ser lésbica, o que no Afeganistão é, já por si, um risco. Porque é que as atletas não apresentam queixa às autoridades? Por um lado, Karim tem muito poder e influência, foi governador de uma província afegã e pertenceu ao Ministério da Defesa. Por outro, apresentar queixa depois de serem expulsas da equipa dá a ideia de que só se querem vingar.