Sete milhões de euros: de acordo com a agência de notícias Ansa, este foi sido o valor que convenceu a federação italiana de futebol a levar para a Arábia Saudita a sua Supertaça, não apenas na edição deste ano, já a 16 de janeiro, mas em três das próximas cinco edições. O negócio que vai rechear os cofres da organização que gere o futebol italiano surpreendeu tudo e todos, mas a polémica maior estava por chegar: para o jogo que vai opor a Juventus ao AC Milan no estádio Cidade Desportiva Rei Abdullah, localizado a 60 quilómetros a norte da cidade de Jeddah, as mulheres terão zonas do estádio interditas, podendo apenas comprar bilhetes para bancadas com menor visibilidade para o relvado.

O modelo de venda de bilhetes do estádio saudita é complexo. Por um lado, há um modelo de bilhete para bancadas próximas do relvado que é exclusivo a espetadores “individuais”… homens. Os restantes bilhetes, a que as mulheres poderão ter acesso, são para zonas do estádio com menor visibilidade para o terreno de jogo.

A interpretação das regras de vendas de bilhetes chegou a originar alguns mal entendidos. Numa primeira fase, entendeu-se que as mulheres que se deslocassem sozinhas ao estádio Cidade Desportiva Rei Abdullah para assistir ao jogo entre as duas equipas italianas teriam a entrada barrada. Matteo Salvini, atual ministro do Interior e militante do partido de extrema-direita Liga Norte, interpretou assim o regulamento e indignou-se, através de uma mensagem no Facebook. “Que a Supertaça italiana se jogue num país islâmico onde as mulheres não podem ir ao estádio se não forem acompanhadas por um homem é uma tristeza, um asco. Este jogo não vejo. (…) Um futuro parecido em Itália para as nossas filhas não o quero”.

Matteo Salvini, o ministro do Interior de Itália, mostrou-se muito crítico da opção de realizar a Supertaça de futebol do país na Arábia Saudita (@ ETTORE FERRARI/EPA)

Afinal, segundo o presidente da Liga Italiana (também conhecida como Serie A), Gaetano Micciché, as mulheres vão poder entrar sozinhas no estádio. O que ainda não foi possível perceber é se não terão de comprar bilhetes mais caros (familiares) para o poder fazer. Micciché, no entanto, defendeu o acordo que levou a Supertaça italiana a realizar-se em terreno saudita. Disse que “será uma primeira vez histórica”, referindo-se à permissão da entrada de mulheres sozinhas no estádio, e apontou: “Cada mudança requer tempo, paciência e vontade de confrontação com mundos distantes”.

A decisão de levar o futebol para zonas com culturas e modos de governo diferentes não é uma decisão exclusivamente italiana. O desporto precisa de plateias globais para crescer. Vamos disputar uma competição oficial num país que tem as suas próprias leis, estabelecidas há anos, e onde as tradições locais impõem vínculos que não se podem mudar da noite para o dia”, referiu Micciché.

O presidente da Serie A relembrou que só recentemente foi permitida a entrada de mulheres em estádios de futebol da Arábia Saudita. E afirmou com orgulho que “a nossa Supertaça vai ser recordada como a primeira competição oficial internacional que as mulheres da Arábia Saudita podem ver em pessoa” e garantiu que a organização que tutela o futebol italiano está a trabalhar “para que nas próximas edições que forem jogadas nesse país as mulheres possam aceder a todos os lugares do estádio”. Apesar das justificações do principal líder do futebol italiano, as críticas têm-se multiplicado nas redes sociais e nos jornais italianos, sendo Micciché acusado amiúde de ter trocado os valores fundadores das democracias ocidentais (entre as quais a italiana) por dinheiro.

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