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Havai. A luta por terras herdadas de um português que conta com a ajuda dos milhões de Zuckerberg

Este artigo tem mais de 5 anos

Manuel Rapozo nasceu nos Açores e mudou-se para o Havai em 1882. Depois de morrer, deixou quatro parcelas de terra a 300 descendentes. Um deles quer ficar com tudo e conta com a ajuda de Zuckerberg.

Manuel Rapozo foi para o Havai, juntamente com o seu irmão, em 1882
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Manuel Rapozo foi para o Havai, juntamente com o seu irmão, em 1882

Manuel Rapozo foi para o Havai, juntamente com o seu irmão, em 1882

O que têm em comum Mark Zuckerberg, quatro parcelas de uma ilha do Havai, um português e mais de 300 descendentes diretos? A resposta é simples, mas a história é complexa: todos estão envolvidos na luta por uma propriedade na ilha de Kauai. De um lado da barricada, vários herdeiros dizem querer preservar a história e o legado de um dos seus antecessores. Do outro lado, o apoio dos milhões do fundador do Facebook pode ajudar um dos familiares a deter toda a propriedade, uma vez que diz ter sido o único a ter cuidado da terra durante vários anos.

Tudo começou a 22 de dezembro de 2016, quando Carlos Andrade, um professor reformado de estudos havaianos, enviou uma carta a vários familiares onde informava que estaria prestes a processá-los. Esses parentes, conta o The Guardian, estavam entre as centenas de proprietários de quatro parcelas de terreno na ilha de Kauai, a quarta maior ilha do Havai. Os terrenos pertenciam a Manuel Rapozo, um homem nascido nos Açores, mas que adquiriu a cidadania havaiana. Em 2017, um proprietário de um terreno vizinho, a Northshore Kalo LLC, quis ajudar Carlos Andrade a pagar as taxas legais para retirar todos os proprietários das pequenas parcelas à sua volta (que pertencem aos vários descendentes de Rapozo), permitindo assim a Andrade assumir a propriedade por completo e compensar os restantes herdeiros através da venda das parcelas.

Mais tarde, soube-se que o proprietário da Northshore Kalo LLC não era uma pessoa qualquer, muito menos um produtor de kalo — uma planta havaiana. Tratava-se de Mark Zuckerberg. O seu novo lar em terras havaianas corresponde a uma propriedade com 700 hectares, no valor de 100 milhões de dólares. O milionário colocou várias ações legais a havaianos que detinham pequenas parcelas da propriedade, um cenário que é comum no Havai, onde os proprietários são forçados a abdicar das terras em prol de um negócio melhor. Assim, os proprietários que iam ser processados tinham duas opções: ou vendiam as suas partes ou teriam de ir a um leilão público e fazer uma oferta superior à de Zuckerberg.

No entanto, e tendo em conta as críticas que começaram a surgir por parte de alguns havaianos — que acusaram Zuckerberg de ser a “face do neocolonialismo” —-, o fundador do Facebook acabou por recuar e pediu desculpa pela abordagem agressiva, prometendo abandonar as ações judiciais que tinha colocado contra os herdeiros. “Com base no feedback da comunidade local, estamos a reconsiderar o processo e a discutir como seguir em frente. Queremos ter a certeza que estamos a seguir um processo que protege os interesses dos proprietários, respeita as tradições dos nativos havaianos e preserva o ambiente”, disse em 2017 Zuckerberg através de comunicado.

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Mark Zuckerberg reconsidera forçar havaianos a vender-lhe pedaço de paraíso no Havai

Só que há um detalhe que mantém Zuckerberg no meio de toda a história: o milionário continuará a apoiar Carlos Andrade na luta pela compra das parcelas de terreno dos restantes herdeiros de Rapozo, ainda que tenha retirado as ações judiciais que colocou. O processo está a chegar ao fim e o juiz ordenou um leilão público onde, mais uma vez, os herdeiros terão que competir com milhões de dólares (dinheiro vindo do fundador do Facebook) para poderem continuar com as suas propriedades.

Em todo este processo, há um grupo de descendentes de Rapozo que não se conforma com a situação e têm resistido às ações de Andrade e Zuckerberg. “Estas quatro parcelas existem legalmente e não são detidas pelo milionário Mark Zuckerberg, apesar de ele possuir cerca de 700 hectares de outra terra que rodeia ou está adjacente à várias parcelas de Kauai”, lê-se num texto que os herdeiros publicaram num site criado especificamente para pedir a ajuda na luta contra o caso.

A família Rapozo respeita totalmente os seus [de Zuckerberg] 700 hectares e apenas pede que ele respeite a propriedade da família de quatro parcelas de Kauai e os acesso para chegar até elas. Independentemente do quanto Mark possa admirar o Carlos ou a racionalização do Carlos desta situação, as quatro parcelas pertencem legalmente e culturalmente a algo maior do que o Carlos — à família Rapozo”, acrescentam os vários herdeiros.

Manuel Rapozo: o português que encontrou no Havai a sua casa

Manuel Rapozo nasceu nos Açores, mas partiu para terras havaianas, juntamente com o seu irmão Francisco, em 1882. Os dois chegaram à ilha a bordo do navio SS Hansa, e “deixaram um mundo que conheciam por algumas ilhas num mar distante e desconhecido, mas com uma promessa em mente”, explica a família.

Foi junto à praia de Pila’a que Manuel Rapozo comprou quatro parcelas na ilha de Kauai, tornando-se parte da vida comercial e cívica havaiana. O Havai tornou-se a sua casa e, por isso, Rapozo decidiu renunciar à cidadania portuguesa e tornou-se cidadão do Reino do Havai (ainda antes do reino ser derrubado e se tornar um estado norte-americano). Quando morreu, em 1928, a propriedade que detinha foi para os seus sete filhos e, a partir daí, foi passando de geração em geração.

Ele era um homem determinado. Gostava de fazer parte da vida cívica e comercial e fez grandes esforços para isso. Ele queria uma grande família e conseguiu uma (…) Adorava música e montava o cavalo com a força e graciosidade de uma águia em pleno voo”, descreve a família.

Para os descendentes de Rapozo, as parcelas são uma parte essencial da sua herança, bem como uma parte da história da ilha que não querem apagar. “As evidências da propriedade são muito muito pequenas, mas são simbolicamente interessantes no papel da família Rapozo durante um período crucial da história do Havai”, diz ainda o grupo de descendentes, acrescentando que “estas quatro parcelas são parte do livro da história contado na ilha e refletem uma fatia da história havaiana”. 

Alika Guerrero, tal como a sua mãe, é uma das familiares que está na luta para manter a pequena percentagem que detém dos terrenos. Ao The Guardian, Alika diz nunca ter entrado na propriedade, mas não quer perder a ligação ao terreno histórico da família. “O nosso nome de família não vai ser ligado a nada relacionado com um milionário que compra terras no Havai e nos obriga a vender terras ancestrais”, referiu, acrescentando que se trata de “mais do que apenas dinheiro”. “Cada pedacinho é importante para nós”, sublinhou.

Já Wayne Raposo, outro dos descendentes, cresceu em Kauai e vive em Londres. E também ele não quer abdicar do que lhe pertence. Segundo Wayne, Zuckerberg e Andrade criaram um modelo para “expropriar famílias comuns de classe média que não têm 40 mil milhões de dólares para jogar com a vida das outras pessoas”. “Estão a fazer com que o Havai pareça a República das Bananas ou um pertence colonial”, referiu ainda ao jornal britânico.

Vivemos e temos família em todas as ilhas habitadas do Havai e vivemos nos Estados Unidos e em outros países do Pacífico. Temos parentes em, entre outros locais, Portugal, Espanha, França e Reino Unido. É tudo uma questão de orgulho. Só desejamos que Manuel e Francisco pudessem ver o que criaram através de trabalho árduo, boa gestão, visão, ambição e amor”, diz ainda a família no site que criou.

“Passei mais de metade da minha vida a cuidar destas terras”

Para Carlos Andrade, que quer conseguir a propriedade completa, a questão é simples: “Não tenho conhecimento de mais algum descendente de Manuel Rapozo que tenha tentado fazer uso das terras ou se tenha oferecido para ajudar a pagar os impostos da propriedade ou contribuir para limpar as terras”, disse numa resposta escrita enviada ao jornal britânico.

Carlos nasceu em Kilauea, local onde o seu bisavô (Manuel Rapozo), avô e mãe trabalharam. Foi em 1970 que teve conhecimento da existência destas parcelas de terra, quando o seu pai estava à procura de uma habitação a um preço que conseguisse suportar. Nesse momento, a sua tia disse para ele ir morar “na terra do avô”. Segundo Andrade, foi ele e a sua mulher que fizeram todo o trabalho de preservação da propriedade: limparam, plantaram e construiram uma casa “confortável”.

O porta-voz de Mark Zuckerberg informou que o fundador do Facebook “manteve a sua palavra e retirou-se das ações de título silencioso [utilizados para clarificar histórias de disputa de propriedade no Havai, que pode resultar na venda dos terrenos em leilão] como mandante”. Segundo Ben La Bolt, “Nem Mark nem a Northshore Kalo vão concorrer ao leilão”. Os vários herdeiros dizem, no entanto, que Zuckerberg não cumpriu a sua palavra.

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