O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, defendeu esta quinta-feira que apoiar e dar meios à agência Lusa “é uma forma de contribuir para combater a crise na comunicação social”. No final de uma visita à agência Lusa, que terminou com um discurso perante os trabalhadores, Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado sobre o apelo que fez, em novembro do ano passado, sobre a situação de emergência que vive a comunicação social.

Apoiar a Lusa, dando-lhe meios, é uma forma de contribuir para combater a crise na comunicação social”, começou por dizer Marcelo Rebelo de Sousa

Há, no entanto, “um problema sobre o qual o Presidente da República não pode opinar”, que tem que ver com a ideia de que existir “um membro do Governo para a comunicação social é negativa”.

Isso depois implica um preço que é a comunicação social ter dificuldade em encontrar um interlocutor com tempo, com espaço, com disponibilidade e com poderes funcionais para saber quais são os problemas dessa área”, alertou

O chefe de Estado percebe esta reação “atendendo a muitos episódios passados”, admitindo que “em termos administrativos” corre que a “melhor solução é não haver”. “Mas aqui há questões que não são meramente burocráticas, há aqui questões que implicam uma sensibilidade política, no sentido amplo do termo. Aliás eu tenho dito que isto devia ser transversalmente considerado e objeto da preocupação do parlamento, todo ele”, avisou.

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O tempo, infelizmente, “não é muito bom para isso porque é um período eleitoral”, prosseguiu Marcelo Rebelo de Sousa, compreendendo “há outras prioridades e há outros debates”. “Mas vamos esperar pela próxima legislatura. Como ainda há um período de tempo até ao fim do meu mandato, ainda dá para eu repetir o apelo e o desafio a partir de outubro, novembro deste ano”, prometeu.

Questionado se esperava ter tido outro tipo de respostas do Governo ao seu repto, o Presidente da República deixou claro que, “para ser justo”, não tem “dúvida nenhuma que o Governo tem a exata noção disso”. “Mas têm a tal questão que é o temor de que qualquer passo dado seja visto, sobretudo em período pré-eleitoral, como uma intromissão indesejável”, justificou.

Este calendário, portanto, “foi um mau calendário”, assumiu Marcelo Rebelo de Sousa. “Mas também se vamos esperar sempre pelo bom calendário qualquer dia a situação vai-se agravar de tal forma que o bom calendário é, para os crentes, algures entre o purgatório, o inferno e o céu, e para os não crentes de acordo com a sua conceção do pós-vida terrena”, observou.

Marcelo defende “missão fundamental” da Lusa na projeção da lusofonia e coesão do país

Perante os trabalhadores da Lusa, o Presidente da República defendeu também esta quinta-feira que a missão da agência Lusa é fundamental na projeção da lusofonia e na cobertura noticiosa da totalidade do país, que é tantas vezes desconhecido, como mostraram os incêndios de 2017.

“Depois daquelas tragédias, nós reganhámos coletivamente a noção exata dos diferentes portugais a várias velocidades que havia em Portugal e mais facilmente se compreende a importância do vosso papel”.

Numa outra intervenção disse “pasmar” quando há “quem duvide do papel da Lusa”, ignorando o seu relevo na “projeção linguística, cultural, humana e estratégica” do país.

“Recordo com alguma estupefação debates a que assisti sobre a vossa antecessora [ANOP], se devia ser extinta sumariamente ou não. Por várias vezes assisti a esses debates e pergunto-me o que teria sido, o que seria hoje, se tivesse sido extinta. Esteve por um triz para ser extinta, na base do debate político, na base da mera contabilidade, da mera aritmética político-partidária”, contou.

O Presidente da República argumentou que a “missão da Lusa é fundamental” para a coesão interna, em particular desde que a crise na comunicação social fez com que uma parte do país “começou a não ser conhecida do resto do país”.

“A Lusa cumpre aí uma missão que é não deixar morrer. Podem morrer outros correspondentes, podem morrer outros que operavam no terreno, mas nós não morremos, nós tentamos cobrir o que é possível cobrir”, sublinhou.

Marcelo Rebelo de Sousa destacou igualmente o papel da agência no “mundo que fala português”: “Nós não podemos dizer que queremos apostar nesse mundo se esse mundo não se conhece entre si”.

Como é que podemos formar uma comunidade na base do desconhecimento? Quem não se conhece não se ama, nem sequer se compreende”, sublinhou.

O Presidente da República saudou a “luta por uma informação séria, verdadeira, o mais objetiva que é possível no quadro da inevitável subjetividade de todo o ser humano” dos jornalistas da agência, no quadro do combate às fake news (notícias falsas).

A Lusa vai organizar uma conferência internacional em fevereiro sobre conteúdos falsos designada “O combate às fake news, uma questão democrática”, que terá o alto patrocínio da Presidência da República, um apoio que o presidente do conselho de administração da Lusa agradeceu.

“Efetivamente, o que está em cima da mesa é uma questão democrática. Termos uma imprensa, um jornalismo fraco, é meio caminho andado para que os conteúdos falsos vençam e que as democracias fiquem seguramente mais fragilizadas”, afirmou Nicolau Santos.

“Pode contar com o corpo muito competente de jornalistas da agência Lusa, porque aquilo que nós fazemos são notícias verdadeiras e essas efetivamente contribuem para fortalecer a democracia portuguesa”, frisou o administrador da Lusa.

Nicolau Santos ofereceu a Marcelo Rebelo de Sousa uma fotografia sua a nadar numa praia fluvial, da autoria do fotógrafo da Lusa Paulo Novais. Durante a visita à redação, o Presidente da República recordou a sua passagem pelo mundo dos jornais e, cumprimentando todos os jornalistas que encontrou, foi constatando as diferenças, sobretudo a atual prevalência das mulheres no jornalismo. “No meu tempo, eram homens divididos por tabiques”, contou, sempre em passo acelerado.

Sem abdicar de imagens políticas, o Presidente mostrou-se espantado com a dimensão da editoria de Economia: “Isto é tudo a Economia? Ainda são resquícios do doutor Cavaco Silva… ou se quiserem do doutor Centeno… A Política ali a um cantinho e a Economia a espraiar-se”, observou.

Marcelo Rebelo de Sousa falou de como “era muito diferente” a comunicação social quando nela viveu, sem nunca ter conseguido ter carteira de jornalista, porque tinha rendimentos de outras atividades, como jurista e, desde 1972, como professor de Direito.

“Hoje é muitíssimo mais difícil, mais arriscado, mais responsabilizante, mais desgastante”, considerou acerca das condições em que se exerce a profissão, já que “o tempo acelerou e o espaço alargou”. O desgaste faz afinal parte da natureza do trabalho, porque “o grande desafio de ser jornalista” é “estar sempre atento, estar sempre alerta, não haver um segundo de repouso, mesmo quando está a repousar”.

Antes de sair da agência, o Presidente olhou para trás e voltou a constatar como as mulheres dominam o jornalismo: “Só senhoras. O que eu teria gostado no tempo do Expresso e do Semanário”.