Lisboa sempre foi uma cidade de intercâmbio de culturas, de contacto com povos diferentes e de assimilação de ensinamentos e tradições. Se esta é uma realidade que já se verifica há centenas de anos, hoje então isso sente-se ainda mais — o mundo inteiro parece caber que nem uma luva entre as colinas e as ruas apertadas da capital. Restaurantes italianos, indianos, mexicanos, japoneses e vietnamitas já fazem parte, há uns poucos anos, da lista de possíveis opções para quem quiser ir comer fora. Contudo, nos últimos tempos, o receituário do Médio Oriente e suas nações circundantes tem aterrado em mesas portuguesas e é a propósito disso mesmo que aqui estamos, nestas linhas que em breve irão dar a uma lista dos restaurantes mais recentes que se enquadram neste imaginário gastronómico.

Hummusbar

Mercado de Campo de Ourique, Rua Coelho da Rocha, 104, Lisboa. Das 12h às 23h (sexta e sábado fecha às 00h). 913 654 064. 12€ (preço médio)

A ‘shakshuka’ é um prato típico que mistura a uma base de molho de tomate com especiarias vários ovos escalfados.

Muitas vezes é fácil associar a ideia de restaurante “franchising” a algo de qualidade menos elevada , mais imediato — a fast-food. Apesar de muitas vezes esta ideia corroborar a realidade, o caso deste Hummusbar consegue ser uma honrosa exceção à regra. Criado em dezembro de 2005 na pequena rua Kertész, em Budapest, o primeiro Hummusbar foi o início de uma das maiores aventuras na vida de Uri Gotlibovich. Do nada começou a gerir um pequeno estabelecimento que servia húmus (daí o nome, obviamente), falafels e outros elementos desta tão característica gastronomia. Com o tempo o negócio foi crescendo, juntou-se outro sócio (Pavel Mintz) e 14 anos volvidos o primeiro destes espaços chega a Portugal, depois de já se ter estabelecido em outros países como a Eslováquia e a Bulgária.

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Nesta pequena banca do mercado de Campo de Ourique vai encontrar comida fresquíssima (tudo é feito do zero, todos os dias), saborosa e totalmente vegetariana — não é uma pretensão declarada do restaurante mas não deixa de ser uma inevitabilidade já que o espaço onde estão não tem todas as condições para grandes confeções de carne e este tipo de receituário já é, de base, muito centrado nos vegetais e nas leguminosas. Todos os pães pita que são servidos seguem uma receita do próprio Uri (são feitos no estrangeiro, por enquanto) e acabam por ser a melhor “colher” ou “faca” que poderá usar para comer pratos como a deliciosa shakshuka (prato de ovos com molho de tomate condimentado e ovos escalfados que custa 4,90€), o guloso húmus com salada turca (7,90€), ou , claro, o clássico húmus (6,90€), que é feito com grão-de-bico que vem do Egito, seco, e é todo processado e confecionado cá.  Saiba que muito em breve este Hummusbar vai começar a servir um brunch do Médio Oriente onde croissant e ovos mexidos com farinheira não entram.

Ararate

Avenida Conde Valbom, 70, Lisboa. Das 12h às 23h (sábado fecha às 24h). 925 451 509. 30€ (preço médio)

O Putuk que é servido no Ararate é uma espécie de ensopado de borrego com grão. Murad RM Photography,

A vida é feita de ironias: quem diria que numa das zonas mais planas de Lisboa (as Avenidas Novas) conseguíamos encontrar a montanha mais alta da Turquia? Passemos à explicação. “Ararate” é o nome dessa formação rochosa mas é também o do primeiro restaurante Arménio em Portugal (pelo menos é isso que os seus responsáveis afirmam). “Mas a montanha não era na Turquia? Onde raio é que encaixa a Arménia no meio disso?”, poderá questionar-se. Para responder a essa eventual dúvida basta olharmos para as tradições religiosas arménias para perceber que esse lugar é tão sagrado como para os cristãos, que afirmam ser esse o lugar onde Noé encalhou a sua arca.

Histórias à parte, importa referir que este Ararate é o terceiro restaurante da proprietária do D. Afonso o Gordo, e mora na antiga churrasqueira A Lontra, num dos topos da Conde Valbom, e pretende canalizar um pouco das raízes arménias da proprietária, Karine Sarkisyan. Por curiosidade — ou ironia, se quisermos fazer uma ligação engraçada ao início deste texto — é de assinalar que nas redondezas deste espaço encontra-se uma das mais fortes ligações entre Portugal e Arménia, a Fundação Calouste Gulbenkian. Esse ponto em comum pode parecer demasiado rebuscado mas a verdade é que pelo menos na comida há muito a ligar estas duas nações — e basta sentar-se aqui à mesa para o perceber.

Se pedir como prato principal o putuk (16€), por exemplo, notará que esta especialidade que os arménios reservam para grandes festividades é muito semelhante a um ensopado de borrego ou um cozido de grão alentejano já que leva, essencialmente, os mesmos ingredientes — lombo de borrego, grão, batata e vegetais –, a única diferença é o facto do caldo ser mais aguado e da terrina onde ele vem servido estar selada por um pão achatado muito fino. Caso pretenda petiscar no início da refeição e, para isso, escolher a tábua de enchidos tradicionais (entre 9,5€ e 15€), vai perceber que também existem pontes entre o fumeiro nacional e do Cáucaso. O basturma que é servido nesta tábua é em tudo semelhante ao “nosso” presunto com a exceção de ser feito com carne de vaca e o sujuk quase consegui passar por uma linguiça, por muito que a versão arménia seja bem mais condimentada.

No capítulo das experiências mais inesperadas — porque também as há — vai encontrar o Dolmá (9,50€), una espécie de crepes recheados em que uma folha de videira serve de invólucro para uma mistura de carne picada com vegetais e especiarias, ou até o absolutamente guloso Khachapuri Barco (7,50€), um pão em forma de olho que no centro tem queijo derretido (quase todos os queijos do Ararate são feitos pela equipa de cozinha) e uma gema de ovo, que é remexida no momento de servir. Para sobremesa pode optar pela clássica pakhlava (ou baklava, como é mais conhecida no mundo ocidental, que custa 6€), um ultra-doce folhado com recheio de frutos secos, mel e especiarias como cravinho e canela, ou pela surpreendente gata (5€), um folhado, também, que é servido quente e recheado com mel e farinha.

Treestory

Rua Luciano Cordeiro, 46A, Lisboa. De segunda a quarta-feira das 19h às 23h; Sexta e sábado das 12h30 às 24h; quinta-feira e domingo das 12h30 às 23h. 308 805 376. 18€ (preço médio)

O Treestory tem um pátio nas traseiras, com mesas, onde também se pode comer.

Irina Prokudina, a proprietária deste que será um dos primeiros restaurantes georgianos do país, pode viver entre Portugal e a Rússia, mas é junto ao Marquês de Pombal, que decidiu construir o seu projeto do coração, um espaço que à primeira vista parece apenas um banal café/snack-bar mais moderno mas que, ultrapassadas as suas  portas, revela ser muito mais que isso. Na ementa há várias surpresas, mas já lá vamos: importa destacar primeiro que este Treestory é dono de um invejável pátio interior onde é possível degustar tudo aquilo que esta russa de raízes georgianas decidiu trazer para a rua Luciano Cordeiro — aqui está a transição “subtil” que nos levará a falar daquilo que pode encontrar na ementa.

À semelhança da cozinha arménia do Ararate, a georgiana também tem vários pontos em comum com a gastronomia portuguesa, veja-se a grande atenção dada à carne, vegetais, tubérculos e leguminosas, por exemplo, que se podem ver em especialidades como a sopa de feijão com ou sem fiambre (4€) ou no sortido de legumes chamado pkhali (12€), com espinafres, cenoura e beringela. Há ainda espaço para pratos mais particulares como o previamente mencionado khachapuri (10€ tamanho normal, 20€ o grande), o tal pão recheado com queijos e gema de ovo, ou os khinkali, uma espécie de dumplings que tanto podem ser recheados com carne de porco ou vaca (três unidades/4€).

Sumaya

Rua da Escola Politécnica, 40, Lisboa. Das 12h às 23h (quinta, sexta e sábado fecha às ooh). 213 470 351. 20€ (por pessoa)

Borrego com arroz e amendoins torrados.

Lembra-se do Prego na Peixaria do Príncipe Real? E do restaurante Atalho, que também mora para esses lados? Não parecendo, estas duas referências têm tudo a ver com este recente Sumaya: ele é o mais recente projeto do grupo Atalho e mora no mesmo espaço físico onde outrora se serviu pregos de peixe e derivados.  Tarek Mabsout é o responsável por esta casa que pretende ser um bastião de representatividade gastronómica libanesa, um sítio onde se seja possível conhecer todas as particularidades desta cozinha que vai juntando cada vez mais fãs portugueses. Para o fazer conta com a ajuda do chef libanês que trouxe do Líbano e do mesmo fundo mediterrânico que une os dois países (Portugal e Líbano) — é ele que permite a Tarek encontrar quase todos os ingredientes essenciais para dar vida a pratos icónicos como o húmus de grão-de-bico com tahini e limão (6€) ou na sua variante que vem acompanhada de carne picada (7€). Estes são apenas alguns exemplos de pratos que podemos encontrar neste Sumaya.

Quando aqui passar pode optar por petiscar entre amigos com a ajuda dos vários mezzes como o baba ghanoush, que é feito com beringela tahini (condimento feito à base de sementes de sésamo), limão e romã (6€) ou a salada tabouleh, uma mistura de tomate, salsa, cebola e hortelã picada com bulgur (uma espécie de couscous), azeite e limão (6€). No capítulo dos pratos mais substanciais vai encontrar especialidades como a incontornável shawarma caseira, uma série de fatias de carne de vaca, borrego ou frango que são empilhadas num espeto, banhadas com molho secreto e servidas ora num kebab ora no prato (13€); ou até o borrego no forno (na foto, 15€).

Uma das particularidades mais interessantes neste espaço tem a ver com não só com o que se come mas também com o que se bebe. O Líbano, ao contrário do que muita gente pensa, é uma região do mundo que explora produz vinho há séculos, ora isso é mais do que razão para Tarek trazer um pouco dessa nação para os copos dos portugueses — no total existem 18 referências vínicas na carta, entre tintos, brancos e rosés.

Za’atar

Rua de São Paulo, 24, Lisboa. Das 19h às 24h (fecha segunda e domingo). 211 350 860- 30€ (preço médio)

Trigo verde fumado com perna de borrego. Grupo José Avillez

Cada vez que abre um novo restaurante em Lisboa, começa a haver sempre alguém que pergunta: “Não me digas que é outro do Avillez?”. O cozinheiro português conseguiu em poucos anos criar um autêntico império de restauração e agora, mais recentemente, começou a incluir nele algumas parcerias com outros chefs estrangeiros de renome. É fruto de uma dessas colaborações que nasce este Za’atar, menino prodígio de José Avillez e do libanês Joe Barza.

O nome de Barza pode não dizer muito à grande maioria dos portugueses mas a verdade é que ele é sinónimo de super-estrela, no seu país de origem. Dono de vários restaurantes espalhados por todo o Médio Oriente, Joe alcançou o sucesso a muito custo. Nos anos de guerra que dilaceraram o povo libanês, Barza estava no exército e tinha sido destacado para ser guarda-costas de uma alta patente do exército. O constante estado de conflito rapidamente motivou a fuga do chef. A cozinha foi a sua salvação.

Ora neste espaço pode estar à espera de encontrar mezzes frios e quentes bem como pratos principais que facilmente poderão ser repartidos. Dentro das primeiras categorias vai encontrar o labneh wtoum, um molho composto por iogurte libanês, azeite e hortelã (4,25€), ou até um kebbe nayyeh, tártaro de carne de vaca típico deste país (7,50€). Na categoria seguinte, a dos pratos mais compostos, encontra o trigo verde fumado com perna de borrego assada, alperces secos e especiarias (9,25€), mistura que promete ser remédio santo para o frio que se faz sentir nos meses de inverno. Há ainda uma vasta seleção de espetadas de frango, vaca, porco e peixe (entre os 8€ e os 12€) que vêm sempre acompanhadas do clássico pão pitta, molho de alho e pickles.