“Tempo executivo”. Foi este o termo cunhado pelo ex-chefe de gabinete de Donald Trump, John Kelly, para definir o período da agenda do Presidente que não está a ser ocupado por eventos, reuniões, conversas e discursos oficiais. O problema é que, de acordo com a informação divulgada por uma fonte anónima ao site Axios, esse “tempo executivo” ocupa mais de metade da sua agenda — o que lançou o debate sobre se aquilo que Trump faz nesse período pode ser considerado ou não trabalho presidencial.

Vamos então por partes: o que está na agenda pessoal do Presidente? De acordo com as agendas passadas ao Axios, é possível perceber que o “tempo executivo” ocupa uma média de 60% do dia de Donald Trump. O dia começa cedo, por volta das 6h da manhã, mas a primeira reunião oficial na Sala Oval da Casa Branca só acontece geralmente às 11h. Antes disso, segundo explica o site, Trump ocupa a manhã na sua residência vendo televisão, lendo jornais e fazendo muitos, muitos telefonemas: a funcionários, membros do Congresso e chefes de Estado, mas também a amigos e conselheiros.

Como exemplo da gestão horária do presidente, o Axios destaca o dia seguinte às eleições intercalares, em que Trump ocupou 30 minutos do seu tempo com uma reunião oficial com o seu chefe de gabinete e gastou mais de sete horas em “tempo executivo”. “Ele está sempre a telefonar a alguém, sempre a falar com alguém”, declarou um responsável da Casa Branca ao site. “Ele está sempre a fazer alguma coisa, só que não é na estrutura que consideramos típica.”

O trabalho do Axios provocou um debate sobre se este “tempo executivo” de Trump corresponde ou não a verdadeiro trabalho à frente dos destinos do país. Michael D’Antonio, comentador da CNN, aponta como muitos outros presidentes norte-americanos ocupavam grande parte da sua agenda de forma oficial, dando como exemplo George W. Bush que chegava à Sala Oval antes das 7h da manhã e só saía às 17h30 ou 18h.

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Já o correspondente do jornal The Guardian em Washington, David Smith, ouviu várias pessoas sobre este tema. Começou por concluir que parte do “tempo executivo” de Trump é gasto em telefonemas para os apresentadores da Fox News Sean Hannity e Lou Dobbs, para amigos de longa data como Rudy Giuliani ou o empresário Richard LeFrak, e para membros do Congresso como Lindsey Graham. “Ele também telefona a jornalistas do New York Times e de outros sítios para se queixar da cobertura que lhe dão”, pode ainda ler-se na mesma peça.

Os especialistas ouvidos pelo The Guardian dividem-se na interpretação sobre a utilidade deste “tempo executivo”. Chris Whipple, autor do livro The Gatekeepers: How the White House Chiefs of Staff Define Every Presidency, considera que este período “não tem nada a ver com a governação” e que consiste apenas “em conversas com os seus amigalhaços, escrever tweets e ver programas de televisão”. Sidney Blumenthal, antigo conselheiro do Presidente Bill Clinton, considera que esse tempo poderia ser usado de forma produtiva, dando como exemplo a atitude de Clinton, que utilizava as horas da madrugada para telefonar a outros chefes de Estado. “Não acredito que Trump pegue no telefone para ter qualquer tipo de conversa construtiva com um líder estrangeiro”, afirma. “Ele fala com a sua própria caixa de ressonância e tem uma necessidade patética de se afirmar de forma narcisista. O ‘tempo executivo’ é uma perda de tempo.”

Já Cliff Sims, antigo diretor de estratégia de Trump, afirma que se trata apenas de uma questão prática: “Seria impossível ter um horário impresso, enviado para toda a gente, onde se poderia ler ‘o Presidente acordou e decidiu fazer estes 10 telefonemas’. Não vejo a utilidade disso.” Também o empresário Chris Ruddy, para quem o Presidente telefona frequentemente no seu “tempo executivo”, defende Trump, que considera ser “um dos tipos mais trabalhadores” que já conheceu. “Ele trabalha ao telefone, falando com as pessoas e interagindo com elas. Está sempre a fazer isso.”

Em resposta oficial, a secretária de Imprensa da Casa Branca, Sarah Sanders, pegou nesta mesma ideia, definindo o “tempo executivo” como um exemplo do “estilo de liderança diferente” de Trump. “Há tempo para permitir um ambiente mais criativo que tem ajudado a torná-lo no Presidente mais produtivo da História moderna”, resume a responsável.