Quem nunca deu palpites de treinador para o ar durante um jogo de futebol, que atire a primeira pedra. Desde substituições, à escolha do onze titular, até à tática escolhida, todos os adeptos têm dentro de si um pequeno “treinador de bancada” que provavelmente nunca será utilizado. Pelo menos até agora, porque já há meios para pôr em prática os seus dotes de José Mourinho. Se não acredita, conheça a história do Avant Garde Caennaise, do sexto escalão do futebol francês: têm cerca de 2.000 adeptos como treinador de bancada.

A equipa do Avant Garde alinhada… provavelmente escolhida pelos adeptos

A história ganhou relevo mundial quando a BBC a deu a conhecer e o conceito é tão ilusório que nos faz questionar como tem funcionado. A base é uma aplicação chamada “United Managers”, lançada precisamente em Caen por Frédéric Gauquelin. O software permite aos adeptos que se registarem – os chamados Umans – a possibilidade de treinarem o Avant Garde Caennaise, que joga na Liga Regional da Normandia, um equivalente às nossas Ligas Distritais. A app oferece igualmente aos “Umans” a possibilidade de assistirem aos jogos e aos treinos da equipa via livestream, para que possam fazer as escolhas mais acertadas possível. E como são feitas elas?

Cada utilizador faz as suas escolhas em votações especificas – como no tweet abaixo – para eventos como o onze titular, substituições ou tipo de treino, usando as estatísticas fornecidas pelo famoso site de análise Opta e baseando-se naquilo que viram durante a semana. Depois, o treinador principal da equipa – sim, há um e é verdadeiro – vê quais as opções com mais votos e põe em prática a escolha dos adeptos. Para Julien Le Pen, o tal treinador principal, isto tem tanto de bom como de mau. “Por um lado é confortável para mim. Se um jogador é substituído, tem noção que quem fez a alteração foi um adepto e não eu, as culpas não caem em mim. Mas por outro lado tive de pôr o meu orgulho um pouco de lado. Mas fiz bem, estou muito feliz!”, conta Julien.

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Já do lado dos jogadores, a apreciação parece ser igualmente positiva. O médio de 29 anos Nicolas Suzanne, por exemplo, assinou mesmo com o Avant Garde pelo desafio que era ser treinado por tantos adeptos: “Vim para aqui porque queria fazer parte de um projeto tão inovador como este. Motiva muito sabermos que os adeptos estão a ver-nos na aplicação. Damos tudo para que nos escolham para o onze titular”, explica o jogador. Do lado dos fãs, então, nem há dúvidas de que o projeto é um sucesso. Há “Umans” de vários países e todos seguem o clube com muito afinco. Alguns chegam até a viajar até a Caen para verem a equipa de perto, nem que seja por uma vez.

Por enquanto tem resultado: o Avant Garde subiu de divisão na temporada passada e na atual está em primeiro lugar da Regional 1 da Normandia. Contudo, e se a app tem tido algum sucesso, em breve isso pode mudar. E mudar a sério, porque mete ao barulho a Federação Francesa de Futebol. A mais importante instituição do futebol francês teve conhecimento deste caso, dado o seu mediatismo, e achou-o reprovável. O resultado? Uma série de regras feitas exclusivamente para esta situação para adicionar aos regulamentos e a suspensão imediatada do projeto. Em causa parecem estar as transmissões em direto dos jogos e a influência de entidades externas na performance da equipa. As novas leis, que proíbem precisamente isso, entraram em vigor em dezembro, mas com a empresa responsável pela “United Managers” já a entrar em ação, com uma ação judicial.

É assim a app United Managers, que permite ao adepto gerir a equipa do Avant Garde

O certo é que o próximo jogo do Avant Garde é dia 23 de fevereiro e tudo está a ser feito como de antes, com a preparação do  jogo por parte dos Umans. O Observador tentou contactar o Avant Garde Caennais e a Federação Francesa de Futebol, mas não obteve resposta.