Uma das coisas boas dos jogos da Liga dos Campeões é aquele momento antes da entrada das equipas no relvado, tudo contado de forma quase mecânica tipo relógio suíço – ou não fosse esse o país de onde chegam as pesadas multas caso algum pormenor não seja cumprido. Foi nessa fase que vimos a amena cavaqueira entre os uruguaios Godin, Giménez, Betancur e Cáceres, foi aí que vimos o cumprimento entre os ex-benfiquistas João Cancelo e Oblak. Cristiano Ronaldo, como é normal, ficou para o fim. Sorridente, bem disposto, a falar a Griezmann e Diego Costa. Quase se esquecia da criança que o iria acompanhar na descida da escadaria dos balneários ao relvado mas lá voltou atrás com uma cara quase a pedir desculpa pelo momentâneo lapso, ajeitou o capuz da sua camisola e lá seguiu atrás dos restantes jogadores. Podia ser o último mas como sempre estava em primeiro. E foi assim que começou, antes de 15 minutos de pesadelo que colocam a Liga dos Campeões em risco.

Estava em primeiro nas tarjas dos adeptos da Juventus num Wanda Metropolitano cheio e com o habitual ambiente a escaldar dos colchoneros. Estava em primeiro no foco das câmaras televisivas, que tentam apanhar todos os pormenores do português. Estava em primeiro na escala de assobios sempre que a bola estava nos pés do conjunto italiano. E estava em primeiro quando começámos a ter lances de maior perigo, com um livre direto muito bem marcado (que, já agora, pode ter sido um dos primeiros na presente temporada que saiu como queria porque as bolas paradas não andam a sair) para grande defesa de Oblak. Só estavam decorridos oito minutos mas o cartão de visita nesta primeira mão dos oitavos da Champions estava apresentado.

Pouco depois, num canto, foi Bonucci a chegar mais alto ao primeiro poste para um desvio desenquadrado mas que poderia ter resultado em muito mais. Simeone, de mãos nos bolsos, abanava a cabeça na sua zona técnica, de um lado para o outro (e já sabia também que não poderia contar com Diego Costa no encontro em Turim, por ter visto um amarelo quando estava na barreira no livre de Ronaldo…). Aos 14′, Thomas teve um remate de meia distância para defesa segura de Szczesny. E esse foi o momento que sossegou o Atl. Madrid, que voltou a defender bem e a ter alguma capacidade nas saídas rápidas em transição, como a que deu um livre em posição muito perigosa para Griezmann – inicialmente foi marcado penálti mas o erro foi corrigido pelo VAR – atirar colocado de pé esquerdo para nova defesa de Szczesny para canto (28′). Dybala ainda teve um remate ao lado da baliza de Oblak mas o encontro entrou depois numa fase mais quezilenta, com algumas entradas duras que, no caso de Ronaldo, deixaram a sua marca, neste caso de forma dupla num lance onde foi atingido por Giménez e Juanfran.

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No segundo tempo, e depois de nova entrada com personalidade da Juventus, o Atl. Madrid teve duas oportunidades flagrantes que poderiam ter mudado por completo o jogo e a eliminatória, sempre com Griezmann em destaque: primeiro o francês, no seguimento de um corte mal feito por Chiellini, isolou Diego Costa que, pressionado por Bonucci, atirou ao lado (50′); depois, o avançado a meias com De Sciglio tentou fazer o chapéu a Szczesny após novo erro defensivo dos bianconeri mas o polaco ainda conseguiu tocar de raspão na bola com os dedos, levando-a a tocar na trave antes do alívio da defesa italiana (53′). Num e noutro lance, os colchoneros tiveram nas mãos lapsos anormais da defensiva contrária mas não aproveitaram.

Cristiano Ronaldo, sem bola (ele como Dybala ou Mandzukic, porque a bola não chegava à zona ofensiva da Juventus), ia respondendo aos “mimos” que vinham da bancada com cinco dedos de uma mão bem abertos, assinalando as cinco vitórias que leva nesta Liga dos Campeões. Mas este regresso a Madrid não estava propriamente a ser aquele que desejaria e só não ficou pior por intervenção do VAR: num lance de saída rápida do Atl. Madrid, Filipe Luís cruzou da esquerda, Morata cabeceou sem hipóteses ao ângulo mas o golo seria anulado por falta do espanhol que passou pelo campeão italiano sobre Chiellini (70′). Não seria aí, seria pouco depois: no seguimento de um canto, Giménez acabou por aproveitar uma bola a pingar na área para desviar para a baliza, num lance que valeu mesmo apesar dos protestos da formação transalpina (78′).

Pouco depois, mais uma bola parada, mais um livre lateral bem batido por Griezmann, mais um golo de um central uruguaio, neste caso Godín, a aproveitar nova atrapalhação na área para rematar forte e sem hipóteses para o guarda-redes polaco, perante a cara incrédula dos jogadores da Juventus que iam olhando uns para os outros sem perceberem ao certo o que se tinha passado para de repente estarem com uma desvantagem que será muito complicada de recuperar. Ainda mais porque, num livre em que Ronaldo simulou bater direto antes de assistir Bernardeschi, Oblak voltou a fazer uma grande defesa para canto. 225 dias depois, o português, que teve ainda um cabeceamento perigoso nos descontos ao segundo poste mas por cima, voltou a jogar em Madrid mas o regresso terá sido tudo aquilo que menos desejava, colocando o grande objetivo da temporada em risco.

O português até acabou por ser um dos melhores da Juventus na noite em que ouviu os adeptos do Atl. Madrid cantarem uma música a propósito dos problemas que o internacional teve com o Fisco espanhola mas uma série de erros fora do comum da defesa italiana na segunda parte acabou por colocar em sérios riscos a passagem aos quartos de final da Champions, ainda para mais tendo em conta o registo das equipas de Simeone em eliminatórias em que ganham a primeira mão sem sofrer golos.