As autoridades angolanas e uma associação de antigos alunos assinalam esta sexta-feira, em Luanda, o centenário da criação, durante o período colonial, do histórico Liceu Salvador Correia, no qual estudaram dois dos três Presidentes da República de Angola.

Entre as iniciativas agendadas para esta sexta-feira pelo Ministério da Cultura de Angola e pela Associação dos Antigos Estudantes do Liceu Salvador Correia contam-se o descerramento, no local, no centro de Luanda, de uma placa de identificação como Património Histórico-Cultural Nacional e outra do centenário da instituição, entre outras.

O governo angolano deu em março de 2018 como concluídas as obras de reabilitação do centenário liceu, as quais decorreram durante oito anos e custaram cerca de 20 milhões de euros.

A renovada escola, que mantém toda a traça arquitetónica original do período colonial português, renomeada entretanto como Magistério Mutu-Ya-Kevela, foi entretanto reinaugurada pelo Presidente angolano, João Lourenço. Estará voltada para a formação de professores para o pré-escolar, ensino primário e primeiro ciclo do ensino secundário, informou o governo.

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No antigo Liceu Salvador Correia estudaram várias gerações de portugueses e angolanos — neste caso, nomeadamente, os ex-Presidentes da República de Angola Agostinho Neto (1975-1979) e José Eduardo dos Santos (1979-2017) –, e o seu avançado estado de degradação chegou a mobilizar uma associação de antigos alunos, que em 2006 divulgaram um projeto de reabilitação do edifício.

As obras realizadas nos últimos anos envolveram a reabilitação integral do edifício, a total remodelação da canalização de água, rede de esgotos e instalação elétrica, a reconstrução das casas de banho, do ginásio e da área exterior ajardinada, a colocação de portas, janelas, vidros e portões e a pintura de todo o complexo.

A enorme quantidade de estudantes que ficaram ligados a este liceu reflete-se no facto de existirem hoje associações de antigos alunos não só em Angola, mas também em Portugal, no Brasil e em Macau. Em 2005 chegou a realizar-se um almoço-convívio em simultâneo nos quatro países, tendo os antigos alunos estado em contacto através de videoconferência.

As origens do Salvador Correia remontam a 25 de abril de 1890, quando cerca de três dezenas de cidadãos se reuniram em casa de Caetano Vieira Dias e decidiram solicitar ao governo português a criação de um liceu nacional em Luanda. A ideia era criar um estabelecimento de ensino na capital angolana que ministrasse os programas em vigor nas escolas em Portugal, o que permitiria aos alunos transitar deste liceu para as escolas portuguesas.

A criação desse liceu só veio, no entanto, a ser decidida a 19 de fevereiro de 1919, quando o Conselho de Instrução Pública aprovou por maioria uma proposta nesse sentido apresentada por António Joaquim Tavares Ferro.

Inicialmente denominado Liceu de Luanda, a escola começou por funcionar num edifício na baixa da capital angolana, assumindo em 1924 a designação de Liceu Nacional Salvador Correia de Sá e Benevides, numa homenagem ao homem que reconquistou Luanda para a coroa portuguesa em 1648 depois de a cidade ter sido ocupada pelos holandeses.

O atual edifício, situado no cimo de uma encosta que desce para o mar, começou a ser construído em novembro de 1938, tendo a inauguração ocorrido a 5 de julho de 1942.

Alunos do Liceu Salvador Correia de Luanda pedem classificação como Património Mundial

Alunos do antigo Liceu Nacional Salvador Correia, de Luanda, manifestaram esta sexta-feira pretensão de ver classificada a centenária instituição, do período colonial português, como Património da Humanidade, lamentando, contudo, a falta de água e manutenção do agora Magistério Mutu-Ya-Kevela.

A pretensão foi manifestada pelo presidente da Associação dos Antigos Estudantes do Liceu Nacional Salvador Correia, Pedro Guerra Marques, nas celebrações que esta sexta-feira se assinalam sobre o centenário do histórico edifício, recordando que o apelo não é novo.

“Na altura em que a instituição foi proclamada Património Histórico-Cultural Nacional [de Angola], em 1992, a associação também meteu um processo na Unesco [Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura] para o candidatar a Património Mundial”, recordou Pedro Guerra Marques.

Um processo que, lembrou, logo à partida foi barrado face à existência, dentro da instituição, de construções que não faziam parte do antigo liceu, inviabilizando a candidatura.

Na cerimónia, que decorreu na sede da instituição, entretanto designada Magistério Mutu-Ya-Kevela, após ser reinaugurada a 24 de março de 2018 pelo Presidente angolano, João Lourenço, o líder associativo apresentou inúmeras preocupações sobre o funcionamento do edifício.

“O que nos preocupa é que uma instituição como esta, com este tamanho, tudo novo, 3.800 alunos, não tem água, tem o acervo em quatro contentores, não tem meios, não tem dinheiro, não tem pessoas”, lamentou.

“E não tem equipamentos para digitalizar esse acervo que faz parte da história desse país”, realçou.

Pedro Guerra Marques pediu às autoridades “maior atenção ao edifício” para que se pense na sua manutenção.

“Sei que não é fácil, sei que Angola tem milhares de prioridades. Mas essa atenção é não esquecer que esta instituição, felizmente, destina-se agora à formação de professores e, como tal, agradecíamos que o Executivo olhasse um bocadinho mais para ver se conseguimos mantê-la por muitos e longos anos”, apelou.

Aproveitando as comemorações (1919-2019), foi também descerrada esta sexta-feira a placa comemorativa em homenagem da Associação dos Antigos Alunos pelo centenário e outra indicativa da sua classificação como Património Histórico-Cultural Nacional pelo despacho da secretaria de Estado da Cultura, de 08 de julho de 1992.

Na ocasião, Roberto Vítor de Almeida, deputado do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e antigo estudante do Liceu Nacional Salvador Correia, no período colonial, mostrou-se lisonjeado pelo momento.

“É uma forma de reconhecimento do trabalho ali realizado. Este é um monumento nacional, por aqui passaram várias gerações de estudantes, portugueses e angolanos, e naturalmente aqui se edificaram algumas das mentalidades que mais tarde seguiram os caminhos do progresso e da ação política”, referiu.