O aparecimento dos smartphones provocou uma inversão da lógica: cada vez se vendem menos máquinas fotográficas e cada vez são publicadas mais fotografias nas redes sociais. O fenómeno pode nem ser assim tão curioso para quem já está tão habituado a ver centenas de fotografias por dia em constante ‘scroll’ pelo Instagram ou pelo Facebook. Desta vez, a fotógrafa Pauliana Valente Pimentel pegou nas melhores fotografias que publicou na maior galeria do mundo — o Instagram –, e apresenta-as numa exposição.

Com trabalho regularmente publicado em jornais e revistas, além de várias exposições individuais e coletivas no currículo, a vencedora dos prémios Artes Visuais da Sociedade Portuguesa de Autores (2016) e Novo Banco Photo 2016 vai inaugurar a exposição “A Vida é feita de likes”, n’A Pequena Galeria, no Cais do Sodré, em Lisboa, esta quarta-feira, pelas 18h.

“A maioria das pessoas guia-se pelo número de likes que tiveram numa determinada fotografia, vídeo, ou comentário”, diz a autora, que, no entanto, explica que esse não foi o critério para montar a exposição que vai estar patente até 30 de março. “Olhei para um todo. Tal como eu faço nos meus trabalhos pessoais, as imagens valem pela sua complexidade e leituras múltiplas, no fundo são universais. (…) O meu intuito foi criar ligações interessantes de umas imagens para as outras“, revela a fotógrafa.

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Para Pauliana, o Instagram é privado, serve “como um diário pessoal, onde registo momentos íntimos com a família, os meus amigos, o backstage do trabalho artístico, os momentos de lazer, como as férias, apontamentos de imagens de outros fotógrafos que eu gosto e que servem como ‘cábula’ para novas ideias ou retratos de um certo acontecimento ou personalidade”. E é por isso que, confessa-nos, a ideia de passar as imagens de uma rede social para uma exposição pode “dar outra dimensão às fotografias”.

Escolha feita, A Pequena Galeria vai receber 77 das mais de oito mil imagens captadas por Pauliana Valente Pimentel, numa auto-curadoria que a fez inverter os papéis que habitualmente desempenha: “”Quem conhece o meu trabalho sabe que eu fotografo sobretudo a intimidade dos outros, e pela primeira vez estou a mostrar a minha própria intimidade, estou a mostrar a minha vida, mas curiosamente, também é através dos outros que o faço, através dos meus mais íntimos“.

“Para ser-se fotógrafo não basta ter uma máquina fotográfica”

Montar uma exposição com base em fotografias captadas com um telefone foi, por si só, um desafio adicional. Para a fotógrafa, “havia a curiosidade de saber até que ponto estas imagens tinham qualidade suficiente para seguirem para o papel, e até que tamanho aguentariam. Para mim, não fazia sentido ter imagens muito grandes, queria aproveitar a resolução ideal de cada imagem”.

Com o aparecimento dos smartphones, qualquer pessoa pode tirar fotografias com mais facilidade, frequência e rapidez. Isto não apaga “uma grande diferença entre um olhar de um fotógrafo profissional e um não fotógrafo”, mas dá a conhecer “fotógrafos amadores que são verdadeiros fotógrafos sem o saberem”. É por isso que, hoje em dia, um fotógrafo se constrói também através de “um historial, de uma prática vivencial, uma cultura visual, um ter algo para dizer com as imagens, e isso não é para todos”.

Foi a recolha de todas essas vivências que levou Pauliana Valente Pimentel a montar esta exposição, porque “ver fotografia, sobretudo a fotografia impressa, quer seja numa exposição, quer seja num livro, é fundamental”. O objetivo passou por “criar um álbum de família, em papel, de memórias” e que marca “o fechar de um ciclo de sete anos que culminou com o falecimento do meu querido pai, uma vida cheia de likes, que me apeteceu partilhar”.

A exposição “A vida é feita de likes” tem inauguração marcada para esta quarta-feira, 27 de fevereiro, pelas 18h, n’A Pequena Galeria, na Avenida 24 de julho, no Cais do Sodré. Está patente até 30 de março.