“Se se toca em ministros, em generais, não se toca em cidadãos que – mesmo sendo filhos de quem são – não deixam de ser cidadãos comuns? Acho que a afirmação de que é uma perseguição à família do anterior Presidente não colhe”. Foi desta forma que João Lourenço esclareceu em entrevista à RTP que as acusações de perseguição face ao afastamento de cargos de três elementos da família do antigo Presidente angolano José Eduardo dos Santos, incluindo de Isabel dos Santos, que foi exonerada da empresa estatal Sonangol, não têm fundamento.

“Por que razão é que as medidas que acabou de citar foram tomadas só contra esses três?”, rematou o Presidente de Angola, garantindo de seguida que “não é perseguição a ninguém”. “Seria perseguição se os tocados fossem apenas eles, mas há outras individualidades, outras figuras públicas, pessoas de peso, ministros…”, explicou, numa entrevista dada no âmbito da visita de Estado do Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa a Angola.

João Lourenço afirmou ainda que quando chegou à presidência, sucedendo a José Eduardo dos Santos, “os níveis de corrupção no nosso país tinham atingido níveis insustentáveis. Era preciso fazer alguma coisa sob pena de afugentar o investimento privado estrangeiro”.

Questionado sobre uma nova era do combate à corrupção em Angola, o chefe de Estado angolano garantiu que “não haverá impunidade”, independentemente do cargo ou do poder. “Há pessoas que hoje estão a contas com a Justiça que, há dois anos, era impensável falar-se sequer da possibilidade de esses nomes estarem hoje com problemas com a Justiça”, acrescentou o Presidente de Angola. “A única garantia que podemos dar é que poderá haver corruptos, mas não ficarão impunes”.

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O Presidente angolano deu ainda a garantia de que os investimentos da Sonangol em empresas portuguesas são para continuar. E, pela primeira vez, afastou a hipótese de a petrolífera angolana sair do capital da Galp, onde está presente de forma indireta através de uma parceria com o Grupo Amorim e com Isabel dos Santos. “No caso da Galp, está ligada ao setor do petróleo, não há razões para sair“, referiu, acrescentando que se trata do “mesmo tipo de atividade que faz parte do mesmo negócio. A questão não se põe na Galp”.  Já no caso do Millennium BCP, João Lourenço reafirmou o que disse na visita de Estado que fez em Portugal: “Em princípio, vamos manter-nos”.

João Lourenço sossegou BCP sobre saída da Sonangol e não confirma venda da Galp

Sobre as relações entre Angola e Portugal, João Lourenço garantiu que “neste preciso momento, as relações estão no pico da montanha, lá bem acima”, mas salientou a necessidade de “continuar a trabalhar”. O Presidente angolano explicou ainda o facto de no seu discurso inaugural, em setembro de 2017, não ter feito qualquer referência a Portugal, numa altura em que as relações entre os dois países estavam tremidas devido ao processo Manuel Vicente. “A interpretação é vossa quando dizem que foi intencional não ter feito referência explícita a Portugal. Não fiz referência explícita a todos os países que estavam presentes na cerimónia e havia bastantes países, na sua maioria africanos”, explicou, acrescentando que “não houve nenhuma omissão intencional”.  Questionado sobre se faria hoje o mesmo discurso, o Presidente angolano deixou no ar a promessa de “uma boa surpresa”.

Mas há ainda uma questão por resolver: as dívidas do Estado angolano a algumas empresas portuguesas. João Lourenço não adiantou valores dessa divida, mas garantiu que o país tem vindo a reduzir, gradualmente, esse valor. O objetivo, assumiu o chefe de Estado, é conseguir pagar a totalidade da dívida. “O importante é que toda a dívida é para ser paga desde que o devedor reconheça que deve e Angola reconhece que deve. Ao nível das equipas ministeriais tem havido um trabalho, quase permanente, no sentido do reconhecimento da dívida”, explicou.