As intervenções e os discursos do Papa Francisco na histórica cimeira dedicada à proteção dos menores na Igreja, que decorreu há duas semanas no Vaticano e que reuniu 190 líderes católicos de todo o mundo para discutir a responsabilidade da Igreja Católica nos abusos sexuais de menores, estão a partir desta quinta-feira reunidas em livro, anunciou a editora católica Paulus.

Em comunicado enviado aos jornalistas, a editora explica que o volume “recolhe as intervenções oficiais durante o Encontro sobre a protecção dos menores na Igreja, que teve lugar no Vaticano, de 21 a 24 de Fevereiro de 2019, as palavras do Papa
Francisco, os testemunhos das vítimas e as conferências dos relatores”.

O livro, de 192 páginas, inclui os dois discursos do Papa Francisco na íntegra, nos quais o líder da Igreja Católica exigiu aos bispos de todo o mundo “medidas concretas e eficazes” que vão além das “simples e óbvias condenações” aos abusos sexuais e apresentou oito ideias para acabar com os abusos e o encobrimento institucional dos crimes.

O livro “A Proteção dos Menores na Igreja: Consciencialização e purificação” é editado pela Paulus

Além das palavras de Francisco, estão no livro intervenções de diversos bispos e cardeais, nomeadamente as propostas do cardeal norte-americano Blase Cupich para melhorar os procedimentos internos da Igreja Católica e as ideias do alemão Reinhard Marx para aumentar a transparência das instituições católicas no que diz respeito à colaboração com as autoridades civis.

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Há ainda outras intervenções fortes, como a do cardeal colombiano Rubén Salazar Gómez, que apontou falhas e responsabilidades à Igreja no encobrimento dos abusos. “Os primeiros inimigos estão entre nós, entre os bispos e os padres”, disse Salazar Gómez, antes de lamentar: “Não estivemos à altura da nossa vocação”.

O livro contém ainda o discurso na íntegra da jornalista mexicana Valentina Alazraki, a intervenção mais dura escutada durante os quatro dias pelos 190 bispos, cardeais e outros líderes religiosos presentes na cimeira (incluindo o cardeal-patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, em representação de Portugal).

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No seu discurso, Valentina Alazraki, correspondente da Televisa no Vaticano há 45 anos, pediu aos responsáveis da Igreja Católica que deixem de olhar para os jornalistas como inimigos. “Os jornalistas não são nem os abusadores nem os encobridores”, afirmou a jornalista, antes de desafiar a plateia:

“Façam-se uma pergunta. São inimigos dos abusadores e dos encobridores tanto como nós somos? Nós escolhemos de que lado estar. Vocês, fizeram-no de verdade, ou apenas de palavra? Se vocês não se decidem de maneira radical a estar do lado das crianças, das mães, das famílias, da sociedade civil, têm razão em ter medo de nós, porque os jornalistas, que queremos o bem comum, seremos os vossos piores inimigos.

O livro inclui ainda testemunhos de várias vítimas de abuso sexual que os vários líderes católicos ouviram durante os quatro dias que durou a cimeira.

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A cimeira de líderes católicos sobre a responsabilidade da Igreja na questão dos abusos sexuais decorreu foi convocada pelo Papa Francisco em setembro do ano passado, após um dos anos mais duros para a Igreja Católica no que toca a este problema — sobretudo com os escândalos à volta do cardeal norte-americano Theodore McCarrick e a divulgação dos resultados de investigações nos Estados Unidos.

Participaram 190 líderes católicos, incluindo 114 presidentes das conferências episcopais de todo o mundo, vários bispos, membros da Cúria Romana e superiores das congregações religiosas.

O livro foi colocado à venda esta quinta-feira pela Paulus Editora.