A presidente da Fundação Calouste Gulbenkian acredita que, 150 anos depois do seu nascimento, Calouste Sarkis Gulbenkian estaria “orgulhoso” da instituição, que mantém os pressupostos que presidiram à sua criação e o respeito pelo pensamento e preocupações do fundador.

Falando à Lusa a propósito dos 150 anos do nascimento de Calouste Sarkis Gulbenkian (1869-1955), que se assinalam no sábado, Isabel Mota enalteceu o pensamento do empresário e filantropo, que, “apesar do passar do tempo, das mudanças económicas, políticas, sociais e culturais no mundo, se mantém de uma enorme atualidade, como arquiteto de negócios, como filantropo, como colecionador de arte”. Todas estas paixões e preocupações justificaram a criação, em Lisboa, da fundação que herdou o seu nome, e que até hoje continuam na base do seu funcionamento e existência, salientou a responsável.

Todas estas preocupações continuam a ser a motivação e inspiração de quem trabalha, diariamente, na Fundação. Estou confiante que, 150 anos após o seu nascimento, Calouste Gulbenkian estaria orgulhoso da instituição que todos os dias ajudamos a construir, a partir de Portugal, mas sempre com uma perspetiva internacional”, afirmou, numa declaração escrita enviada à Lusa.

Calouste Gulbenkian nasceu nas margens do Bósforo, na fronteira entre o Oriente e o Ocidente e como poucos conseguiu fazer, ao longo da sua vida e através da Fundação que arquitetou, a ponte entre duas culturas, duas formas de viver e de ver o mundo — foi um precursor daquilo a que hoje chamamos globalização, acrescentou.

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A presidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) destacou ainda que, apesar de ter querido ser um “homem de ciência e sonhador num jardim”, Calouste Sarkis Gulbenkian “foi um visionário na área do petróleo e um arquiteto de empreendimentos de grande sucesso, preocupado em fazer sempre mais e em construir um futuro melhor”. “Tinha já, no início do século passado, a preocupação que as grandes empresas têm hoje, com a responsabilidade social, com a filantropia”, além de um “grande amor pelo belo, pela arte e pela história da humanidade, mostrando grande empenho na sua preservação, para que as obras que colecionou ao longo da vida pudessem ser mostradas às gerações que se lhe seguiriam”, salientou.

Isabel Mota lembrou ainda o “grande interesse pela natureza”, que Calouste Gulbenkian sempre demonstrou e que o levou a integrar-se, “muito antes do tempo, no grupo cada vez maior que hoje se preocupa verdadeiramente com o ambiente”.

Calouste Sarkis Gulbenkian, nascido a 23 de março de 1869, em Üsküdar, na província de Istambul, foi um empresário arménio otomano naturalizado britânico, que se afirmou no setor do petróleo, tendo-se tornado um dos pioneiros no desenvolvimento desse setor no Médio Oriente. Em janeiro deste ano, já a assinalar os 150 anos do nascimento de Calouste Gulbenkian, a editora Objetiva publicou a biografia deste negociador arménio que foi o homem mais rico do mundo e que deixou a Portugal a maior coleção de arte privada do país.

Intitulada “O homem mais rico do mundo — As muitas vidas de Calouste Gulbenkian”, foi escrita por Jonathan Conlin, a partir da consulta dos arquivos pessoais de Gulbenkian, em arménio, francês, inglês, alemão, russo e turco.

A obra revela quem foi na realidade o “senhor cinco por cento” — assim conhecido devido à sua participação na primeira companhia petrolífera a extrair petróleo no Iraque — que, em julho de 1955, quando morreu em Lisboa com 86 anos, era o homem mais rico do mundo.

O seu nome está associado ao mecenato e à maior e mais importante coleção privada de arte do país, exposta na Fundação Calouste Gulbenkian, mas a fortuna que acumulou ao longo da vida teve origem nos negócios do petróleo e acordos de alto nível que mediou entre governos e barões desta indústria.

Como explica Jonathan Conlin, Calouste Gulbenkian “trabalhou como facilitador de bastidores, um intermediário entre os mundos dos negócios, da diplomacia e da alta finança”. Produtores de petróleo da Califórnia ao Cáucaso procuravam-no pela sua habilidade para angariar capital nos mercados bolsistas de Nova Iorque, Londres e Paris, e foram as suas intermediações que apresentaram as companhias de petróleo norte-americanas ao Médio Oriente, ao ponto de, em 1955, quando morreu, a indústria petrolífera mundial já não ser um monopólio americano, mas “um cartel internacional”.

“Nenhuma outra figura dos negócios da história da indústria petrolífera exerceu tanta influência, em tão larga escala e durante tanto tempo”, e este seu poder permitiu-lhe reivindicar cinco por cento da produção de petróleo do Médio Oriente, explica o biógrafo.

Gulbenkian soube, além de tudo, conservar esse prémio, tendo construído um palácio em Paris que encheu com tesouros variados, como quadros do Hermitage, moedas gregas, antiguidades egípcias e tapetes persas, coleções essas que estão atualmente depositadas na Fundação Calouste Gulbenkian, que continua a ser uma das mais ricas do mundo.

Contudo, a criação e estabelecimento desta fundação não foi pacífica, com o Governo português a fazer um braço de ferro com Inglaterra, França e Estados Unidos, para receber a fortuna de Gulbenkian, na qual estavam envolvidas aquelas “poderosas nações”, explica Jonathan Conlin.

A escolha final acabou por recair sobre Portugal, como figura no seu último testamento, e é explicada principalmente pela vontade de Gulbenkian evitar um Estado onde tivesse que pagar impostos.