Três Bolas de Ouro e três Ligas dos Campeões. Este domingo faz três anos que Johan Cruyff morreu. O antigo avançado serviu de caneta e papel algumas das páginas mais gloriosas dos livros de história do futebol holandês. De chuteiras calçadas ganhou tudo pelo Ajax e com a braçadeira de treinador no braço levou o Barcelona à glória. Três anos depois, os corações de Amesterdão e Barcelona ainda palpitam por Johan e aqueles que o tornaram célebre fazem planos conjuntos para o futuro, ansiando por novas glórias, como as vividas no passado.

Em semana de aniversário da morte de Cruyff, o jornal catalão Sport avança que Barcelona e Ajax podem estar prestes a assinar um acordo de cooperação. Depois do sucesso das negociações para a transferência de Frenkie de Jong para Espanha e da possibilidade de o central Matthijs de Ligt seguir o mesmo caminho, os dois clubes pretendem aproximar-se ainda mais. O objetivo passa por celebrar um acordo que daria ao Barcelona a prioridade pelos jovens da academia do Ajax e, em sentido contrário, o clube de Amesterdão teria primazia sobre todos os produtos da cantera blaugrana que não tivessem espaço na equipa principal mas que, ainda assim, seriam úteis no campeonato holandês.

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A relação entre Barcelona e Ajax não é nova. Nunca foi um segredo que os dois clubes partilham ideais futebolísticos que se materializam na aposta na formação. Outro ponto em comum é, sem dúvida, Johan Cruyff. O match entre os dois materializa-se com o Ajax a dar o nome do antigo jogador e treinador ao estádio (Johan Cruyff Arena ou Arena de Amesterdão) e o Barcelona fez o mesmo com o estádio reservado para as equipas secundária e feminina. Mas estes pontos em comum não são suficientes para medir o que significa Johan Cruyff para os dois clubes.

De bola nos pés, marcou 269 golos em 367 jogos pelo Ajax e foi preponderante para a conquista de nove campeonatos e três Ligas dos Campeões consecutivas — 1970/71, 1971/72 e 1972/73. Apesar dos 60 golos em 180 jogos, o palmarés com a camisola do Barcelona não vai além de uma Liga Espanhola, conquistada em 1977/78.

Já na pele de treinador, a história inverte-se. Começou a segunda carreira no Ajax onde, em três anos, venceu duas taças. Na casa de partida treinou jogadores como Ronald Koeman, Frank Rijkaard e Marco Van Basten e lançou Dennis Bergkamp, Ronald de Boer e o atual treinador do Sporting, Marcel Keizer. Muda-se para Barcelona em 1988 e treina os blaugrana durante oito temporadas e vence tudo o que há para vencer: primeira Liga dos Campeões (na altura Taça dos Campeões Europeus) do clube, em 1991/92, tetracampeão espanhol, uma Copa do Rei e três supertaças.

No Barcelona treinou o búlgaro Hristo Stoichkov, Romário, Pep Guardiola e Luís Figo.

A equipa do Ajax que venceu a Taça dos Campeões Europeus de 1973. Cruyff é o penúltimo da fila de baixo e Johan Neeskens o penúltimo em cima.

Johan Cruyff foi o pretexto ideal para o casamento entre Barcelona e Ajax, mas não foi o único. Não tão celebrado como o eterno camisola 14, o antigo médio Johan Neeskens, que segurou as três Champions consecutivas do Ajax com Cruyff, seguiu os passos do companheiro até ao Barcelona, onde ficou por quatro temporadas. Cruyff e Neeskens foram apenas o tiro de partida para o que se seguiu.

O miúdo de Cruyff, a geração de 1995 e aqueles que os seguiram

A ponte aérea entre Amesterdão e Barcelona já havia sido estabelecida por Cruyff e Neeskens e, como tal, não é difícil encontrar jogadores que tenham vestido as duas camisolas. A lista de jogadores que foram formados em Barcelona ou Amesterdão e vestiram as camisolas dos dois clubes é extensa e há até quem tenha sido treinado pelo próprio Cruyff nos dois clubes.

Com apenas 17 anos, o médio holandês Richard Witschge foi lançado por Cruyff no Ajax, que o deixou amadurecer em Amesterdão por mais cinco anos antes de o chamar de volta. Em 1991, Witschge reencontrou Cruyff no Barcelona — mesmo a tempo de ajudar na conquista da primeira Liga dos Campeões da história do clube e de se tornar bicampeão espanhol. Esteve apenas duas épocas no clube catalão e, em 1996, voltou para a casa mãe, o Ajax, onde permaneceu por seis anos.

Richard Witschge foi treinado por Cruyff no Ajax e no Barcelona

Em 1995, mais de duas décadas depois de Johan Cruyff e companhia terem conquistado três Taças dos Campeões Europeus consecutivas, o Ajax voltou a levantar a “orelhuda”. Uma geração de ouro que devolveu a glória europeia a Amesterdão com a vitória sobre o AC Milan, em Viena. Depois da conquista o céu era o limite para os protagonistas. Oito jogadores da geração de 1995 viriam, mais tarde ou mais cedo, a representar o Barcelona e a seguir as pisadas de Johan Cruyff. Winston Bogarde, Michael Reiziger, Jari Litmanen, os irmãos de Boer, Marc Overmars, Edgar Davids e Patrick Kluivert — que marcou o golo do Ajax na final de Viena — fizeram parte do primeiro role de viagens de Amesterdão para Barcelona depois de Cruyff e Neeskens.

Equipa do Ajax na primeira mão da meia-final da Champions, contra o Bayern de Munique. Michael Reizinger, os irmãos de Boer, Seedorf, Overmars e Litmanen foram titulares. Bogarde, Kluivert e Davids começaram no banco

Se no início a ligação aérea entre Amesterdão e Barcelona só funcionava num sentido, depois da geração de 1995 começaram as viagens no sentido contrário. Gabriel de la Torre, ou Gabri, foi o primeiro estudante do Barcelona a experimentar o programa de intercâmbio em Amesterdão. Formado no Barcelona, jogou na equipa principal até 2006 e seguiu depois para o Ajax, onde permaneceu até 2010.

Mas existem outros exemplos de carreiras iniciadas em Barcelona que, eventualmente, viram o carimbo de Amesterdão nos passaportes. Roger Junyent iniciou a carreira no Barcelona e acabou-a no Ajax, em 2007, a tempo de ganhar uma taça e uma supertaça. Mais recentemente o Barcelona cedeu dois jogadores ao clube holandês. Isaac Cuenca e Bojan Krkic, que foram apontados como duas grandes promessas de La Masia, fizeram uma época no Ajax e conquistaram o campeonato holandês — Cuenca em 2013 e Krkic no ano seguinte.

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O espanhol Oleguer Presas, o dinamarquês Michael Laudrup, o brasileiro Maxwell, Zlatan Ibrahimovic e Luis Suárez também contam com passagens por Barcelona e Amesterdão. O belga Thomas Vermaelen, formado no Ajax, ainda hoje faz parte dos quadros do Barcelona, mesmo sendo pouco utilizado.

Johan Cruyff estabeleceu uma ponte aérea que tantos outros atravessaram. Frenkie de Jong foi o último a comprar bilhete e De Ligt pode estar no processo de pré-reserva. Resta saber quantos futebolistas ainda vão atravessar a ponte Cruyff daqui para a frente.

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