A comissão parlamentar de inquérito aos atos de gestão da Caixa Geral de Depósitos já aprovou as datas indicativas para todas as audições que terão de se realizar até meados de junho, por causa do fim da legislatura. José Sócrates será o único antigo primeiro-ministro a ser chamado, e deverá fechar o ciclo de audições, mas enquanto antigo chefe do Governo tem a prerrogativa de responder por escrito. O ritmo das audições vai por isso acelerar, estando previstos alguns dias com duplas audições, de manhã e ao início da tarde.

O calendário provisório aprovado esta terça-feira na reunião de coordenadores indica que Joe Berardo será o primeiro cliente com um crédito problemático a ser ouvido, isto se se confirmar a data indicativa de 7 de maio. Berardo está neste momento a ser alvo de um processo de execução sumária por parte dos três bancos que reclamam mais de 960 milhões de euros, sendo que a Caixa é um deles.

Para o mesmo dia ficou prevista a audição a Manuel Fino, o empresário que investiu na Soares da Costa, BCP e Soares da Costa com financiamento da CGD. Neste caso, e dada a idade avançada do investidor, os deputados admitem chamar outra personalidade que tenha estado envolvida na gestão dos negócios de Manuel Fino com a Caixa que estão ser escrutinados na comissão de inquérito.

Manuel Matos Gil, empresário português que esteve ligado ao projeto da La Seda e da Artlant, a fábrica de produtos químicos construída em Sines com dinheiro da CGD, está indicado para uma audição a 8 de maio. No dia seguinte, está prevista a audição de Diogo Gaspar Ferreira, o investidor privado e presidente de Vale do Lobo até ao final de 2017.

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A audição de Joaquim Barroca, acionista e ex-presidente do Grupo Lena, está marcada para 10 de maio. O grupo é um dos grandes devedores da Caixa, sendo que o antigo gestor é um dos acusados na Operação Marquês que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates.

Todos estes investidores e empresas estão na lista dos créditos mais problemáticos sinalizados na auditoria à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, que causaram maiores perdas ao banco público. Em algumas destas operações, a auditoria EY identificou pareceres condicionados ou mesmo desfavoráveis por parte da direção de risco que não travaram a concessão de empréstimos. E algumas personalidades, antigos responsáveis do banco público, já ouvidas no inquérito reconheceram a natureza “especial” de alguns clientes, como Joe Berardo, ou a natureza única da aprovação de alguns projetos como o caso de Vale do Lobo.

Estes clientes serão chamados já depois de serem ouvidos, ainda este mês, os antigos presidentes da Caixa Geral de Depósitos, António de Sousa — 2000/2004, Carlos Santos Ferreira — 2005/2007 e Fernando Faria de Oliveira — 2008/2012, cujas audições já estão agendadas para os dias 20 e 31 de abril.

Depois de identificar e circunscrever o grupo de de devedores a ouvir na comissão parlamentar de inquérito, os deputados pretendem ouvir um dois antigos diretores do Banco de Portugal com o pelouro da supervisão bancária durante os anos abrangidos pela auditoria da EY, bem como o administrador do BdP que teve essa responsabilidade, Pedro Duarte Neves.

Os trabalhos serão interrompidos durante a campanha eleitoral para as europeias a partir de 16 de maio e deverão ser retomados após estas eleições, com a audição de antigos administradores do banco, até para conferir informação que venha a ser dada durante as audições dos investidores.

E a primeira audição prevista após esta interrupção é a de António Tomás Correia. O atual presidente da associação mutualista Montepio, que tem estado debaixo de fogo após ser conhecida uma condenação do Banco de Portugal à sua gestão da caixa económica, foi administrador da CGD até 2002, mas não aparece associado aos créditos que mais perdas provocaram à Caixa e que foram aliás decididos mais tarde. Também Almerindo Marques, administrador da CGD que se demitiu em discordância com o ex-presidente António de Sousa, deverá ser chamado para o final de maio.

Ainda antes do final do mês, os deputados pretendem chamar Jorge Tomé que foi administrador da Caixa e teve a seu cargo a Caixa Banco de Investimento, que esteve evolvida em dossiês que trouxeram prejuízos ao banco público, como o La Seda e a Artlant. Vítor Fernandes — que acompanhou Armando Vara e Santos Ferreira na transferência para o BCP — , Francisco Bandeira, Rudolfo Lavrador e Norberto Rosa — que fizeram parte das administrações de Santos Ferreira e Faria de Oliveira — também serão chamados. Para a escolha destes nomes um dos critérios foram as presenças em conselhos de crédito onde foram discutidos ou aprovados as operações sob escrutínio do inquérito parlamentar.

É neste grupo que aparece também Armando Vara, o único ex-administrador que foi chamado à primeira comissão de inquérito à Caixa em 2017, mas que agora se encontra detido após condenação no processo Face Oculta. A ex-ministra do CDS e antiga administradora não executiva da Caixa, Celeste Cardona, também consta das audições discutidas esta terça-feira.

Os trabalhos devem terminar com com o ex-ministro socialista das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, que teve a tutela da Caixa nos anos em que foram sinalizados empréstimos que mais perdas geraram. É também esta a justificação para ouvir o primeiro-ministro que esteve em funções no mesmo período, entre 2005 e 2011, e cuja audição tem uma data indicativa de 14 de junho. Sócrates pode responder por escrito, como o fizeram até agora todos os primeiro-ministros, em funções ou não, quando questionados em comissões de inquérito.