Os pedidos de mulheres de vários países ocidentais que foram “ajudar” localmente o grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico para regressar a casa com os seus filhos está a preocupar o Ocidente, pelo fosso que abre entre segurança e questões humanitárias. O Centro Internacional para o Estudo do Extremismo Violento divulgou um estudo em novembro sobre as principais motivações que levaram centenas de mulheres ocidentais a deixar os seus países e partirem para a Síria ou para o Iraque com o objetivo de se juntarem ao ‘jihadista’ Estado Islâmico (EI) ou à Al-Qaida e os papéis que desempenharam nos grupos onde foram acolhidas.

O estudo foi feito com base em mais de 100 entrevistas a pessoas que pertenceram ao EI, mas regressaram, fugiram ou estão presas e visa, perceber as razões para ajudar na prevenção e na reintegração.

De acordo com as conclusões apresentadas, o EI e a Al-Qaida conseguiram atrair centenas de mulheres ocidentais para as suas fileiras – quer da Europa, quer do Canadá, da Austrália, dos Balcãs ou da América do Norte.

De acordo com as estimativas, 13% (4.761) do total de 41.490 pessoas que viajaram para se juntar ao grupo Estado Islâmico eram mulheres, sendo que do total de pessoas que regressaram a casa (aproximadamente 17% ou 7.366), apenas 4% (256) são mulheres.

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Pelas entrevistas feitas a mulheres que conseguiram regressar, o Centro Internacional conclui ser claro que as mulheres enfrentaram mais dificuldades do que os homens para fugir do EI, já que raramente têm acesso a dinheiro, têm quase sempre de estar acompanhadas por um homem e podem facilmente tornar-se alvos sexuais dos contrabandistas que se ofereceram para as ajudar a atravessar o território dominado pelos ‘jihadistas’.

Muitas das mulheres que foram para a Síria e para o Iraque levaram já crianças com elas, refere o estudo, mas muitas outras foram à procura de casar. Tanto umas como outras tiveram mais crianças enquanto estavam no EI.

De acordo com um responsável iraquiano do Centro Internacional para o Estudo do Extremismo Violento, das 700 mulheres do EI que estão presas no Iraque, a maioria tem pelo menos três filhos.

A análise refere ainda que a maioria das mulheres do EI não teve o mesmo treino de armas e lei islâmica que os homens nem tiveram de jurar fidelidade ao grupo.

De acordo com as respostas dadas nas entrevistas, as mulheres ocidentais foram sobretudo postas a trabalhar na ‘hisbah’, ou seja, na polícia da moralidade, ou ficaram dedicadas a recrutar outras pessoas através da Internet.

Muitas ficavam simplesmente em casa, ocupadas a criar filhos pequenos e algumas trabalharam como professoras, médicas, administrativas e um número muito reduzido como guerrilheiras.

De uma forma geral, os seus papéis profissionais eram estritamente femininos e viviam condicionadas pelo grupo. Durante a maior parte do tempo, as mulheres do EI eram mães e esposas e encorajadas a servir o califado através da procriação.

Nos recrutamentos que fez em todo o mundo, o EI passou sempre a imagem de que os homens que faziam parte do grupo eram supre-masculinizados, sempre armados e em posições que imitavam os seus heróis e muito protetores das mulheres.

As mulheres, por seu lado, eram idealizadas como apoiantes e vítimas a precisar de ser salvas por homens “de verdade”, sobretudo de sociedades islamofóbicas.

A sexualidade também foi frequentemente usada como forma de seduzir tanto homens como mulheres para o grupo, com as mulheres a oferecerem-se como parceiras sexuais a homens que fossem para os locais para casar com elas.

O estudo inclui o relato de uma jornalista francesa que se fez passar por uma jovem mulher a ser seduzida pelo EI.

Anna Erelle, pseudónimo da jornalista, relatou a sedução de que foi alvo na rede social Facebook por um guerrilheiro francês do grupo ‘jihadista’ que a contactou no próprio dia em que ela publicou um vídeo dele. Ele pediu-a em casamento, ofereceu-lhe riqueza, uma vida sexual picante e amor. A jornalista admitiu mesmo que se ela fosse de facto a mulher jovem e vulnerável que fingiu ser, ele teria parecido incrivelmente sedutor.

Várias mulheres do Reino Unido que foram para o EI referiram nas entrevistas ao Centro de Estudo do Extremismo Violento que apelidavam estes homens de ‘jihotties’ (brasas da jihad, em tradução livre) e foram motivadas pela aventura de partir para casar com um ‘bad Boy’ (mauzão) e com homens “de verdade”.

Fundado em 2015, o Centro Internacional para o Estudo do Extremismo Violento é responsável por fazer investigação e dar aconselhamento estratégico a líderes governamentais, a serviços secretos, de defesa, organizações internacionais, autoridades policiais e à sociedade civil em todo o mundo.

Parceiro consultivo de órgãos de comunicação como a CNN, a BBC, o The New York Times ou o London Times, o Centro dá formação em organizações como a NATO, a OCDE, à CIA e ao FBI e a várias embaixadas no mundo.

As 10 motivações das mulheres ocidentais para se juntarem ao EI

  • as verdadeiras crentes: acreditavam que o grupo ‘jihadista’ representava o verdadeiro Islão e que queriam ajudar a construir o seu califado. Muitas vezes cansadas das exigências sociais do ocidente e de serem marginalizadas;
  • as vingadoras: zangadas com as geopolíticas, as discriminações, marginalizações e com traumas causados por imagens das zonas de conflito, acreditavam que o grupo conseguiria enfrentar estas questões e iria mudar o mundo para melhor. Algumas vezes procuravam vinganças pela morte, ferimentos, detenções e torturas a membros do seu grupo;
  • as apoiantes: procuravam pertencer a algo, queriam ser protegidas e ser tratadas como companheiras pelo grupo;
  • as que queriam tornar-se alguém: procuravam significado, propósitos, uma identidade ou uma missão de vida;
  • as aventureiras: queriam uma vida divertida, cheia de romance e aventura, quer sexuais quer de outros géneros, muitas vezes eram seguidoras de ‘jihotties’;
  • as românticas: apaixonaram-se ou foram seduzidas por recrutadores. Seguiam o grupo por motivos emocionais;
  • as materialistas: procuravam ganhos materiais, um salário, melhores condições de vida, e isso incluía conseguir ganhos através de crimes;
  • as submissas: aderiram aos papéis tradicionais, obedeceram aos maridos, filhos ou pais e seguiram-nos. Por vezes também foram coagidas através de chantagem, violações, dependência económica, entre outras razões;
  • as artistas em fuga: fugiam dos problemas da vida real, das dificuldades em casa, de condições opressivas, procuravam conquistar independência e uma vida melhor;
  • as que procuram redenção: queriam purificar-se de “pecados” como uma história de crime ou devassidão. Em casos extremos incluem mulheres com tendências suicidas, desesperadas ou deprimidas que se convencem que morrer como “mártires” é a sua melhor opção de redenção e de escapar à dor.