São sete e lutam, realisticamente, pela eleição de apenas um eurodeputado. Nas eleições europeias mais participadas em termos de proliferação de novos partidos e movimentos, os sete partidos que hoje não têm representação no Parlamento Europeu mas querem vir a ter, debateram a Europa: das crises migratórias à abstenção, passando pela crise de credibilidade das instituições e pela proliferação dos movimentos de extrema-direita em toda a Europa. Rui Tavares, do Livre, atirou contra os partidos “tradicionais” que estão numa “redoma” e contra os movimentos que ocupam o espaço por eles deixado vazio, que para lá de serem movimentos “nacionalistas, fascistas ou de extrema-direita”, são acima de tudo movimentos “vigaristas”. André Ventura falou em nome do que “os portugueses querem” e defendeu que ou há “controlos sérios nas fronteiras ou não entra ninguém em Portugal”.

Além de André Ventura (Basta!) e Rui Tavares (Livre), também Paulo Sande (Aliança), Francisco Guerreiro (PAN), Ricardo Arroja (Iniciativa Liberal), Paulo Morais (Nós, Cidadãos) e Luís Júdice (PCTP/MRPP) estiveram nos estúdios da SIC a debater algumas das principais questões europeias — deixando críticas pelo caminho ao facto de, por não terem representação parlamentar atualmente, não poderem sentar-se à mesma mesa dos partidos ditos “grandes”, ou seja, dos que hoje já estão representados no Parlamento Europeu, numa espécie de ciclo vicioso de poder.

André Ventura candidata-se pelo movimento “Basta!”

Imigração e refugiados: o controlo ou a “bandalheira”?

Num debate a sete na SIC (e SIC Notícias), o acolhimento de refugiados e crise migratória foi um dos temas centrais. Questionados sobre o que fariam num cenário hipotético em que um barco com refugiados estaria perto da costa portuguesa e pedia para entrar, André Ventura foi o mais taxativo a responder que, embora não quisesse fazer da Europa “uma fortaleza”, sem controlo sério e rigoroso de fronteiras não deixava o barco entrar no país.

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“Não pode ser a bandalheira que temos hoje. Temos de ser criteriosos. Ou há controlo a sério ou [o barco] não entra. Se não há controlo, um dia vamos ter problemas sérios com a nossa segurança. Não podemos dizer ‘entre quem quiser, não queremos saber, e se um dia acontecer alguma coisa logo se vê’. Uma Europa fraca não protege os cidadãos”, disse o candidato pelo movimento Basta!, dando o exemplo de um indivíduo que chega à fronteira sem documentos e diz que vem de um país em guerra — “mas nós não sabemos se vem desse país ou não” — pelo que não deve ser permitida a sua entrada.

Ricardo Arroja é o candidato do Iniciativa Liberal (foto retirada do Facebook)

O tema é fraturante e dividiu os candidatos. Paulo Sande (Aliança) e Ricardo Arroja (Iniciativa Liberal), que disputam o mesmo espaço político da direita liberal, foram taxativos a dizer que deixavam o barco imaginário entrar, com Paulo Sande a pedir que não se confunda imigrantes com refugiados.

Entram aqueles que têm direito a entrar de acordo com a lei internacional e de acordo com aquilo que a União Europeia é, uma união de acolhimento. É muito fácil dizer que isto alimenta o terrorismo, mas o acolhimento dos refugiados é uma questão que tem de claramente de ser separada”, disse, defendendo mais recursos para a Europa resolver o problema do excesso de pedidos de entrada. Também o candidato da Iniciativa Liberal defendeu o mesmo: mais recursos, mais orçamento, para fazer face ao problema. “O fundo para o asilo não é mais do que mil milhões, enquanto a PAC, por exemplo, tem destinados 60 mil milhões: há uma descoordenação entre prioridades políticas e orçamentais”, disse.

Paulo Sande é o cabeça de lista do partido de Pedro Santana Lopes. JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Também Paulo Morais (Nós, Cidadãos) defendeu o acolhimento dos refugiados “com dignidade” e nos termos da lei, acusando a “esquerda com ar moderno” de confundir imigrantes com refugiados. Luís Júdice, do PCTP/MRPP, preferiu focar-se na “conivência” e “agressão” por parte da Europa aos países que hoje estão em guerra e que motivam a multiplicação de refugiados, e Francisco Guerreiro, do PAN, defendeu uma “seleção”. “O processo de integração tem de ser selecionado, tem de haver critérios para conhecer o tipo de pessoas que entram”, disse.

Já o cabeça de lista do Livre, Rui Tavares, considerou que “a Europa não tem lidado bem com a questão dos refugiados”, sublinhando que “98% quer regressar a casa”, o que faz com que “só uma pequena minoria sejam de facto refugiados que precisamos de reinstalar” — a prioridade aqui deve ir para os chamados prioritários: mulheres, crianças, vítimas de violência, pessoas debilitadas e doentes. Coisa diferente, disse, é a forma “desumana” como alguns países, como a Hungria, estão a tratar os refugiados que lhes batem à porta. “Os náufragos salvam-se e há gente que, para singrar na política, é capaz de dizer que ‘se naquele barco fosse a minha família, deixava morrer'”.

Rui Tavares já esteve no Parlamento Europeu, pelo BE, mas desvinculou-se daquele partido. É desde então o cabeça de lista pelo Livre, tendo falhado a eleição por pouco há cinco anos

Extrema-direita. “Pessoas zangadas votam em quem grita mais alto”

Numa altura em que o partidos populistas, nacionalistas e de extrema-direita proliferam nos Parlamentos e nos governos da UE, os candidatos às europeias foram questionados sobre se isso é motivo de preocupação em Portugal — que, até ver, ainda é exceção. André Ventura afirmou que não se sentia como “o rosto da extrema-direita”, embora isso não o preocupasse de todo. “O que me importa não é que digam que sou de extrema-direita porque isso para as pessoas não diz nada. O que me preocupa é o que os portugueses sentem nas ruas, e o que sentem é que pagam impostos a mais, e vivem num clima de impunidade”, disse, notando que metade do que uma pessoa trabalha vai para impostos, e defendendo um “nível mínimo para cobrança de impostos em todos os países da UE”.

Falando sempre em nome daquilo que julga serem “as preocupações e angustias dos portugueses”, André Ventura, que foi candidato pelo PSD à câmara de Loures nas últimas eleições autárquicas, voltou a defender que não haja comunidades a viver de subsídios, como se referiu na última campanha à comunidade cigana. “Os portugueses não toleram que haja comunidades que vivam de subsídios quando têm de trabalhar para pagar a água e a luz. Isto é ser de extrema direita?”, perguntou.

Paulo Morais continua com a bandeira da luta contra a corrupção. É cabeça de lista pelo Nós, Cidadãos

Em nome do equilíbrio como forma de combater os extremos, Paulo Sande, do Aliança, apontou que o crescimento dos extremos era em parte explicado pela desilusão dos cidadãos face às instituições e à política mas também do “aproveitamento dessa circunstância por parte de certos movimentos políticos”. E foi aí que admitiu que, neste contexto, é de certa forma mais fácil falar para os extremos do que para o centro moderado, mas garantiu que o Aliança iria resistir a discurso extremado. “Pessoas zangadas votam em quem fala mais forte e grita mais alto. Nós temos uma ideologia muito simples: somos liberais, humanistas, defendemos uma sociedade moderada, equilibrada. Só que ser moderado hoje em dia é quase mais radical que ser radical  — as pessoas tendem a procurar soluções extremadas”, disse.

À esquerda, Rui Tavares lembrou que apesar da proliferação de movimentos de extrema-direita na Europa é a família política dos verdes, pró-Europa e anti-austeridade, que mais cresce. Quanto aos movimentos “nacionalistas ou fascistas”, preferiu chamar-lhes de movimentos que muitas vezes são apenas “vigaristas” por usarem dados falsos nas suas narrativas, e aproveitou a boleia para apontar aos partidos ditos tradicionais, “que só fazem debates entre eles”, por estarem “vazios de ideias” e deixarem, nesse sentido, outros movimentos extremados ocupar-lhes o lugar.

Francisco Guerreiro, do PAN, alertou para o pré-colapso ecológico e defendeu o fim do transporte de animais vivos dentro da UE

Já Ricardo Arroja (Iniciativa Liberal) centrou-se muito naquilo que é a base do programa eleitoral do seu partido: a redução de impostos. “Há muitas contradições que temos de corrigir para não fomentar a má alocação de recursos e a impossibilidade de reduzir impostos”, defendeu, depois de Francisco Guerreiro, do PAN, ter posto o foco central no combate às alterações climáticas, já que vivemos, disse, “no pré-colapso ecológico”. Paulo Morais, por sua vez, disse que a ascensão dos extremismos e a elevada abstenção foram as razão de ser da sua candidatura, sublinhando que os portugueses estão “dececionados” e “fartos de pagar impostos para nada”. É isso que justifica a ascensão dos extremismos, e é isso que tem de mudar, disse.

Mais isolado aparecia Luís Júdice (PCTP/MRPP), defendendo que o único caminho para a Europa tem de passar pelo desmantelamento da UE e saída do euro, e defendendo que o PCTP/MRPP é o único partido que tem uma visão a montante do que causou o estado a que a Europa chegou hoje.

Metas? Todos a lutar por um (Aliança aponta aos dois)

Quase nenhum se comprometeu com metas, nem com a ideia de que vai conseguir eleger (pelo menos) um eurodeputado para o Parlamento Europeu. Apenas Paulo Sande, do Aliança, o fez, e foi otimista: “Acreditamos que vamos eleger dois deputados, pelo menos um, mas acreditamos em dois, é realista. Essa é a lógica desta candidatura. Estamos em todos os distritos, temos gente no terreno sempre. Há um crescimento enorme e orgânico do partido”, disse, referindo-se ao Aliança como um partido que não se insere no leque dos “partidos tradicionais”, apesar de o líder ser um ex-líder do PSD e ex-primeiro-ministro.

Em confronto direto com Sande, Ricardo Arroja reiterou que se for eleito não vai aceitar a subvenção partidária, porque isso é alinhar nas regras da “clubite partidária”, e Paulo Morais chamou a si a possibilidade de dar voz “aos que estão fartos” da política tradicional. Francisco Guerreiro lembrou que o PAN tem uma forte presença nas redes sociais e, depois de André Ventura ter desmentido ter recebido financiamento de organizações internacionais (nomeadamente dos EUA), reconhecendo que é ilegal, também o candidato do PAN quis deixar claro que o partido “não paga nenhum conteúdo na internet — é tudo orgânico”.

Em nome da esquerda moderada, Rui Tavares foi claro a definir o seu alvo: apontar ao “falhanço das elites políticas”, mas jogando dentro das regras da União Europeia e procurando “democratizar” ainda mais a UE.