Não foi uma resposta direta a António Costa. Tão pouco foi uma forma de o ignorar. Foi um meio-termo que deixa o primeiro-ministro a falar sozinho. “Só merece crescer quem cumpriu“, sentenciou Catarina Martins já no final da sua intervenção esta noite no comício do Bloco de Esquerda na Alfândega do Porto. O discurso da líder não destoou da estratégia traçada pelo partido para esta campanha — não responder a ataques diretos e/ou pessoais — mas serviu para que o BE não passasse a noite como uma força que foge ao confronto.

Falando de uma campanha que “está a crescer” — e nunca de sondagens –,  ou do “milhão de pessoas que disseram que queriam mudar” e nunca da geringonça, Catarina Martins sublinhou que o seu partido foi aquele que mais cumpriu. Tudo para cavalgar a onda das sondagens e, lá do alto, poder atacar a esquerda sem nunca mencionar os alvos. E, pelo meio, deixou a garantia de que o partido não se iria acomodar “ao estado de coisas” pelo acordo assinado em 2015. Uma segunda versão de resposta teleguiada para Costa.

O discurso da líder do Bloco de Esquerda teve muitas mensagens nas entrelinhas. O BE tem calado muitas vezes os seus desejos para a noite eleitoral, mas esta noite Catarina Martins deu um pequeno sinal de qual é a ambição do partido. Não falou em números mas citou os nomes dos três primeiros candidatos da lista, insinuando assim que espera vê-los serem eleitos. “No domingo o voto é no Bloco de Esquerda, é na Marisa Matias, é no José Gusmão, é no Sérgio Aires, é em toda uma equipa que esteve em todas as lutas”. Um detalhe no discurso que mostra o efeito que as sondagens têm tido nas expetativas do partido.

Contra a “frente progressista”

Marisa Matias foi a última a subir ao palco. Tinha a missão de encerrar um comício onde não podia apostar todas as fichas. Esse chegará na sexta-feira, no encerramento da campanha. Por isso, levou uma mensagem que funciona como uma espécie de resumo daquilo que tem sido a campanha. Pelo menos aos olhos do Bloco de Esquerda, que assentou este tempo pré-eleitoral em três eixos: clima, serviços públicos e emprego. “Vimos uma Europa de vencedores e de vencidos. O nosso projeto é o projeto da União. E no domingo é a união que vai a votos”.

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A nuance colocada na palavra não foi ao acaso. Serve para lembrar qual o propósito da criação da UE mas também para sublinhar o motor da campanha de Marisa Matias.

Já o número dois da lista, que falou antes das duas dirigentes, trouxe um discurso muito político. Dos mais politizados que a campanha bloquista já viu. José Gusmão tentou desmontar a “frente progressista” defendida pelo PS e, assim, enviar mais um recado envenenado para o Largo do Rato.

“Na Europa temos atualmente três exércitos. Temos o exército da publicidade, cuja batalha é convencer as pessoas de que as suas vidas estão erradas. O segundo é o do lamento, de quem a cada cinco anos reconhece que os problemas não se resolveram, que participou nas decisões que fizeram com que tudo ficasse na mesma e que diz que a próxima reforma é que vai ser. E agora temos um novo exército: o da frente progressista. Esse exército irá juntar o da publicidade ao do lamento. Dois grupos sem ideias para mudar a Europa que vão juntar-se para fazer um grupo sem ideias para mudar a Europa. Só que maior”.

Todo um programa sobre como a esquerda, em particular a do Bloco, olha para aquilo que António Costa está a tentar fazer na Europa.