Ao final da tarde, a expectativa no número 49 da Avenida da República, em Lisboa, estava nos píncaros. No interior da sede do Aliança, o partido que Santana Lopes formou depois de perder o combate pela liderança do PSD com Rui Rio, esperava-se uma noite a acabar com champanhe a correr. Um militante dizia: “No fim da noite vamos festejar”. Paulo Sande, o cabeça de lista às Europeias, até revelou estar convicto de que não seria o único a ser eleito para Bruxelas, à chegada à sede. No final da noite, nem ele garantiu um bilhete de ida para o Parlamento Europeu — nem o champanhe saiu do frigorífico.

A fasquia estava alta. Há quase três meses, quando o Aliança apresentou a sua lista às Eleições Europeias, Santana Lopes colocou ambição no discurso pedindo a eleição de três eurodeputados. Disse à data: “A vitória pequena será a representação, a vitória média diria eleger dois deputados e uma boa vitória eleger três”.

A vitória não chegou: nem pequena, nem média, nem boa. Mas também não houve exatamente derrota, defenderam Pedro Santana Lopes e Paulo Sande ao fazer o rescaldo da noite eleitoral, perante os jornalistas. Ninguém diria, a julgar pelos sons dominantes na sede do partido ao longo da noite: o silêncio, as conversas em surdina e comentários entredentes como “mas as pessoas enlouqueceram?”, “o PAN?!” e “para a próxima é melhor”. Santana ainda concedeu: “Não consideramos uma derrota, [mas] é um pouco uma desilusão para nós”.

Derrota era se não tivéssemos lutado, se não tivéssemos feito um congresso em poucos meses, apresentado um programa, um cabeça de lista, corrido o país todo”, disse ainda o líder do Aliança.

O lamento: “Noutros países escolheu-se a mudança…”

As primeiras projeções da noite feitas pelas televisões traçavam um resultado sombrio para o Aliança: em nenhuma o partido de Santana Lopes e Paulo Sande conseguia eleger um eurodeputado que fosse. As sondagens já o indiciavam muito antes, mas a confiança resistia-lhes.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A tensão foi-se gradualmente instalando, com menos conversas, risos nem ouvi-los e um permanente vai-vem dos elementos do núcleo duro do Aliança entre salas (públicas e abertas à imprensa, mas também fechadas, de análise de resultados). Foi numa sala interior, afastados das câmaras, que Santana e Sande assistiram à confirmação das piores previsões: com o passar dos minutos e a contagem dos votos, não havia maneira de o Aliança subir e contrariar o mau resultado.

Por volta das 21h45 Pedro Santana Lopes e Paulo Sande aproximaram-se do pequeno palco montado para o discurso final, que se esperava de vitória. Fizeram-no juntos, contrariando as convenções de noites eleitorais europeias (cabeça de lista e líder costumam falar à vez). Primeiro falou Sande e Santana ouviu-o, mesmo ao lado. Logo a seguir, assumiu as despesas do resultado.

Os dois discursos tiveram pontos de mira distintos. Sande, europeísta que foi assessor de Marcelo Rebelo de Sousa para os Assuntos Europeus, lamentou a abstenção. E contrariou a ideia de derrota, tentando explicar o resultado não-tão-bom-quanto-se-desejava: “O partido começou agora. Em Portugal é muito difícil, a muralha de vidro [entre partidos tradicionais e novos partidos], de que costumo falar, não foi derrubada. Fizemos o possível mas tivemos muito pouco tempo, nomeadamente nas televisões, que todos os dias passam [transmitem] o trabalho de todos os partidos que já lá estão”, na Assembleia da República.

Houve uma (curta) vitória de consolação: o partido foi o mais votado entre as novas formações partidárias sem representação parlamentar. Paulo Sande foi o primeiro a falar disso, depois de classificar a abstenção de “gravíssima” e dizer que “noutros países escolheu-se a mudança”, enquanto em Portugal foram eleitos os de sempre (excluindo o PAN, já anteriormente eleito para o Parlamento). Santana Lopes haveria de falar dessa vitória de consolação de seguida, dizendo que o partido foi “quase o primeiro da Liga de Honra” — só não chegou a Bruxelas como pretendia.

Santana: “O resultado ficou aquém, mas temos muito trabalho para fazer”

Mal chegou a sua vez de falar, Pedro Santana Lopes foi questionado sobre se este resultado era ou não era uma derrota eleitoral, depois de ter dito que a eleição de um eurodeputado seria somente “uma pequena vitória”. Santana contornou a questão como pôde, disse que “se este fosse um partido com a idade de outros partidos com representação parlamentar [o resultado] seria uma derrota”, mas que não o sendo não lhe chamaria assim.

A direção política do Aliança não está satisfeita com o resultado, mas está satisfeita com Paulo Sande, reiterou o antigo líder do PSD: “Continuo plenamente convencido que tínhamos uma grande equipa, a começar pelo cabeça de lista. Temos de respeitar a vontade da maioria mesmo quando a maioria é uma enorme abstenção”.

O resultado ficou aquém do que gostaríamos mas temos muito trabalho para fazer. Quero dizer aos militantes que é um partido extraordinário. Não nos contenta sermos o primeiro dos que não têm representação parlamentar, é quase o primeiro da Liga de Honra, agora estamos satisfeitos com o seguinte: ficou claramente demonstrado que fizemos uma campanha de propostas substantivas sem ofender, sem caluniar, querendo construir uma alternativa”, apontou.

De seguida, os recados: aos extremistas (Basta?), ao PAN, ao PSD e CDS

Pedro Santana Lopes é o chamado animal de palco, um político mais elogiado pela capacidade de contagiar pelo discurso (nos comícios, desde logo) do que pela estratégia das decisões “a frio”. Nos grandes comícios do PSD, quando aparecia, chegava a roubar o espetáculo aos presumíveis protagonistas — foi assim, por exemplo, no discurso do famoso “keep cool”, em que chutou para o lado a hipótese de se candidatar à Câmara Municipal de Lisboa. Foi assim também no primeiro comício do Aliança, há alguns meses, quando improvisou, voltando (como mais gosta) a deixar os discursos lidos de lado e dizendo que preferia “conversar” com os militantes. Daí arrancou para um discurso com uma pergunta como unidade temática: “Que país é este?”

Esta noite, depois do mau resultado eleitoral, Santana voltou a puxar pela voz, projetá-la para os ataques certos e receber aplausos de militantes pelas críticas e avisos que fez, à direita e à esquerda. Aproveitou e reclamou louros por uma proposta anterior de convergência anti-“frente de esquerda”, lembrando que ela poderia ter sido ser útil e pode vir a ser necessária.

É bom que o espaço do centro-direita medite nos resultados de hoje. Talvez alguns possam perceber melhor a proposta que fiz sobre necessidade de convergência do centro-direita para constituir alternativa à frente de esquerda e a derrotar. Não estamos contentes, não estamos satisfeitos, mas estamos convencidos que noutras sedes do centro-direita também não haverá grande satisfação”, referiu.

Santana mudou então a mira para partidos extremistas como o Basta, de André Ventura. Sem o nomear diretamente, atacou-o, reclamando-se diferente: “Somos um partido, como disse Paulo Sande, radicalmente moderado. É estranho aparecer um partido novo que não seja populista, extremista. Persistimos nesse caminho, queremos ser um partido novo que não defende nem penas de prisão perpétua, nem castrações [o Basta defende castração química para pedófilos] nem perseguição seja a quem for. Defendemos a construção de soluções e defesa de liberdades”.

Já com olho nas eleições regionais da Madeira e nas eleições legislativas, que acontecem até ao final do ano, Santana ainda desvalorizou o resultado obtido pelo PAN, considerando-o “nitidamente um sucedâneo do voto de protesto de Marinho e Pinto há cinco anos”. Apesar do resultado, que o Aliança garante que não é derrota nem vitória (embora ninguém tenha citado O’Neill para lhe chamar “uma coisa em forma de assim”), o partido teve “um começo que nos dá força” e “nasceu para ficar, para lutar e vai agora continuar o seu trabalho programático e a sua ligação aos portugueses”.