A escolha da cidade de Baku, a capital do Azerbaijão, para o local da final da Liga Europa da temporada que está agora a terminar fez correr muita tinta. Desde a praticamente anunciada ausência de Henrikh Mkhitaryan, por ser arménio, até aos apenas 20 mil bilhetes disponibilizados aos adeptos de Chelsea e Arsenal para um Olímpico de Baku com capacidade para 68 mil. Um pormenor, porém, foi passando algo ao lado das notícias, das reportagens e das coberturas: talvez por não afetar diretamente os países de origem dessas notícias, reportagens e coberturas. Em Portugal, no Reino Unido e na Irlanda, a final da Liga Europa arrancava às 20h; em grande parte do continente, o jogo começava às 21h; noutros países, às 22h; mas no Azerbaijão, para respeitar os compromissos televisivos, a final tinha início às 23h. Pela primeira vez na história das competições europeias, um jogo começou num dia e terminou deliberadamente no dia seguinte.

Mas esta não era a primeira estreia desta final totalmente inglesa. Também o VAR se estreava na Liga Europa, já que a derradeira partida era também a primeira da competição que contava com a ajuda do vídeoárbitro. Mas entre estreias, existia uma despedida que tomava protagonismo: Petr Cech, guarda-redes checo que anunciou a meio de janeiro que iria terminar a carreira no final da temporada, realizava o último jogo de um percurso louvável que contou com 15 anos de Premier League, espalhados entre Chelsea e Arsenal. Ora, eram precisamente essas as duas equipas que esta quarta-feira à noite se encontravam em Baku, o que garantia desde logo um final quase romântico à carreira de Cech. Unai Emery, o treinador dos gunners, deixou algum suspense no ar sobre a titularidade do guarda-redes — o checo é habitualmente suplente de Bernd Leno — mas acabou integrar o jogador no onze inicial. Ao defender as redes do Arsenal contra o Chelsea na final da Liga Europa, Cech despedia-se do futebol enquanto o único jogador da história a atuar por e contra a mesma equipa inglesa numa final europeia (esteve na final da Liga Europa de 2013, quando os blues bateram o Benfica).

Nos restantes onzes, Maurizio Sarri fez bluff durante toda a semana em relação à lesão de N’Golo Kanté — esta manhã, a imprensa inglesa garantia que o médio não estava apto para jogar a final — e acabou por incluir o francês na equipa titular, formando a linha de três no meio-campo com Jorginho e Kovacic. Na frente, Pedro, Giroud e Hazard formavam o trio ofensivo que completa o habitual 4x3x3 do treinador italiano e Willian, Higuaín e Ross Barkley eram os principais trunfos no banco de suplentes. Do outro lado, o Mr. Europa League Unai Emery (o técnico espanhol ganhou três das últimas quatro edições da segunda competição europeia de clubes) apostava na eficaz dupla Lacazette/Aubameyang. Özil era o elemento de ligação entre o setor intermédio e o mais adiantado, servindo quase como um segundo avançado, Kolasinac, Xhaka, Lucas Torreira e Maitland-Niles alinhavam no meio-campo. Iwobi, Lichtsteiner e Guendouzi começavam no banco.

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O jogo arrancou algo morno, muito amarrado ao centro do relvado e a sobreviver à custa de uma enorme luta tática entre as duas equipas. Só a partir do primeiro quarto de hora, por intermédio do Arsenal, é que a partida começou a ser lateralizada e a bola entrou nos últimos 30 metros de um dos conjuntos. Lacazette pelo corredor esquerdo e Maitland-Niles pelo direito, já que Aubameyang ia procurando espaço em terrenos mais interiores, tentavam provocar desequilíbrios mas não conseguiram criar muito mais do que cruzamentos infrutíferos para a área de Kepa. Neste período de maior ascendente dos gunners, Aubameyang rematou muito ao lado quando estava em boa posição para atirar à baliza (10′) e Xhaka acertou de raspão na trave com um remate de muito longe, depois de fugir da esquerda para a faixa central (27′). À meia-hora de jogo, não existia qualquer remate enquadrado e ainda pouco se tinha visto do Chelsea.

O remate perigoso de Xhaka, contudo, parece ter tido um efeito catalisador nos blues — que perceberam que uma forma prática de não perder, aquilo que procuravam desde o apito inicial, era marcar golos e ganhar. O Chelsea atirou-se para o ataque e subiu as linhas, principalmente através da posição de Jorginho, que passou a pressionar uns metros à frente, e acabou por alcançar o primeiro remate enquadrado da final: Hazard descobriu Emerson na grande área, o italiano que nasceu no Brasil atirou de pé esquerdo e Cech encaixou (34′). O aviso estava feito e teve uma segunda versão, já que a equipa de Sarri percebeu que tinha encontrado as fragilidades defensivas do Arsenal que deixaram os gunners no quinto lugar da Premier League, fora das posições de acesso à Liga dos Campeões. Aos 40 minutos, a cinco do intervalo, Giroud protagonizou a melhor ocasião de golo da partida, criada a partir da melhor jogada da partida até então. Jorginho colocou em Hazard, o belga assistiu o avançado e o francês, isolado, atirou rasteiro para uma enorme defesa de Cech. No último jogo da carreira, o guarda-redes segurou o nulo no marcador com uma defesa que obriga a reflexos e elasticidade de um miúdo de 20 anos.

Na ida para o intervalo, o Chelsea estava totalmente solto e à procura do golo sem quaisquer reservas. Adivinhava-se um segunda parte mais descomplexada e aberta, já que o Arsenal precisava de arriscar e investir na criatividade de Aubameyang, Lacazette e companhia para fazer face ao superior ímpeto da equipa de Sarri. Os primeiros minutos do segundo tempo, porém, deixaram clara aquela que poderá ter sido a estratégia vencedora do treinador italiano: provocar um confronto tático nos instantes iniciais, aguentar a pressão adversária durante metade da primeira parte, desamarrar a equipa em busca dos erros defensivos do Arsenal e confiar na fantasia de Hazard, no crer de Pedro e na eficácia de Giroud. Foi este último tópico, o acerto do avançado francês, que acabou por dar ao Chelsea o golo da vantagem logo aos quatro minutos do segundo tempo.

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Ficha de jogo

Chelsea-Arsenal, 4-1

Final da Liga Europa

Estádio Olímpico de Baku, no Azerbaijão

Árbitro: Gianluca Rocchi (Itália)

Chelsea: Kepa, Azpilicueta, Christensen, David Luiz, Emerson, Kanté, Jorginho, Kovacic, Pedro, Hazard, Giroud

Suplentes não utilizados: Caballero, Cumming, Marcos Alonso, Ross Barkley, Higuaín, Zappacosta, Willian, Cahill, Ampadu, Gallagher, McEachran

Treinador: Maurizio Sarri

Arsenal: Cech, Sokratis, Koscielny, Monreal, Maitland-Niles, Torreira, Xhaka, Özil, Kolasinac, Lacazette, Aubameyang

Suplentes não utilizados: Leno, Iliev, Elneny, Lichtsteiner, Iwobi, Mustafi, Welbeck, Jenkinson, Guendouzi, Nketiah, Willock, Saka

Treinador: Unai Emery

Golos: Giroud (49′), Pedro (60′), Hazard (65′ gp e 72′), Iwobi (69′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Pedro (56′), Christensen (68′)

Emerson, novamente Emerson, cruzou para uma zona ainda recuada da grande área do Arsenal e Giroud foi resgatar a bola quase ao chão, cabeceando colocado e sem hipótese para Cech. Depois de um sorriso instantâneo, o francês ajoelhou-se, fechou os olhos e pediu desculpa, recordando que trocou o Arsenal pelo Chelsea a meio da temporada passada. Com este golo, o avançado chegou aos 11 nesta edição da Liga Europa, tornando-se o melhor marcador da competição e o primeiro jogador a marcar tanto por um clube inglês na Europa desde 2004/05 (nessa época, Alan Shearer apontou 11 golos pelo Newcastle). A reação praticamente inexistente do Arsenal, já que Unai Emery aguentou a vontade irracional de fazer substituições de forma imediata, deixou o Chelsea muito confortável, muito fluido e muito tranquilo — algo que raramente se viu durante a temporada.

Kovacic recuperou muito bem a bola já no meio-campo do Arsenal, soltou Hazard no corredor esquerdo, o belga conduziu quase sem oposição até à grande área e colocou com qualidade um metro antes da marca de penálti, onde Pedro apareceu a rematar de pé esquerdo para o poste oposto e se tornou o primeiro jogador da história a marcar numa final da Liga dos Campeões e numa final da Liga Europa (60′). Cinco minutos depois, para quase desespero de Unai Emery, Maitland-Niles derrubou Giroud em falta no interior da grande área: o árbitro italiano Gianluca Rocchi não hesitou e assinalou grande penalidade e Hazard converteu no frente a frente com Cech. Só aqui, a perder por três golos de diferença, é que Emery decidiu mexer, trocando Monreal por Guendouzi, passando a jogar com quatro defesas, e o mais recuado Torreira pelo avançado Iwobi. O nigeriano inaugurou o marcador para o lado do Arsenal na primeira vez que tocou na bola — com um remate de belo efeito a partir da direita após uma bola perdida no seguimento de um livre (69′) — mas Hazard apressou-se a explicar que aquele era um golo de honra e não um golo que relançava uma final.

Apenas três minutos depois do golo de Iwobi, e já depois de Sarri trocar Pedro por Willian, o Chelsea recuperou a bola em zona alta, Hazard soltou para Giroud na esquerda, o francês devolveu para o coração da área e o belga rematou de primeira para o quarto golo dos blues. Emery ainda lançou Willock para o lugar de Özil, que em conjunto com Lacazette foi a personificação da exibição apagada do Arsenal, e o avançado que é irmão do jogador da equipa B do Benfica ainda foi a tempo de desperdiçar duas oportunidades de golo. O Chelsea não voltou a marcar e ainda concedeu espaço inconsequente aos gunners nos últimos minutos para acabou por vencer a Liga Europa, voltando às conquistas europeias que escapavam desde 2012/13 e adiando o hiato europeu do Arsenal que dura há 25 anos.

Numa final europeia totalmente inglesa, a despedida de Petr Cech — do Chelsea, do Arsenal, da carreira — foi repetida, sublinhada e recordada. Mas quase todos se esqueceram de que a final de Baku era também o palco de uma outra despedida: a despedida de Eden Hazard dos blues, já que o belga vai certamente deixar o clube londrino neste verão para rumar ao Real Madrid. Hazard despede-se com uma grande exibição, com um bis, com um troféu europeu, com a segunda temporada mais goleadora da carreira (21 golos) e com uma ovação dos adeptos no momento em que foi substituído por Zappacosta a escassos minutos do apito final. Stamford Bridge já ia ter saudades de Hazard mas o médio tornou a separação muito mais difícil.