Ao longo da temporada, desde o início da Liga dos Campeões, a rotina manteve-se. No sorteio da fase de grupos, no sorteio dos oitavos de final, no sorteio dos quartos de final, a história foi sempre igual: ninguém, nenhum clube, queria cruzar com o Liverpool. As eliminações precoces de Real Madrid e Juventus ajudaram ao caráter de intimidação dos reds — mas a verdade é que a vertigem, a velocidade, a intensidade, o crer interminável da equipa orientada por Jürgen Klopp tornou-a a mais temível de todas aquelas que estavam na edição 2018/19 da Champions.

Parte disso deve-se a Klopp. Parte disso deve-se aos adeptos e ao “You’ll Never Walk Alone”. Muito disso deve-se ao trio de ataque, Salah, Mané e Firmino, sempre — e merecidamente — tidos enquanto responsáveis dos sucessos recentes do Liverpool. Egípcio, senegalês e brasileiro assistem, marcam golos, criam vitórias e são, sem dúvida, o setor mais forte dos reds. Seria um cliché dizer que, apesar da qualidade do ataque, foi toda a equipa o elemento mais importante na conquista da Liga dos Campeões por parte do Liverpool: mas é preciso sublinhar que, pelo menos de forma tão fulcral, tão decisiva e tão cirúrgica quanto o trio ofensivo, Virgil Van Dijk é grande parte daquilo que explica porque é que ninguém queria encontrar o Liverpool.

No final de dezembro de 2017, quando o Liverpool anunciou que tinha acabado de gastar 85 milhões de euros num defesa central, a reação da imprensa internacional foi praticamente unânime. O Liverpool não tinha contratado Van Dijk, não tinha contratado o central do Southampton, não tinha reforçado o setor mais frágil da equipa; o Liverpool tinha contratado o defesa mais caro da história do futebol. O nome do holandês não era amplamente reconhecido e os números surpreendentes da transferência pareciam mais interessantes do que dizer aquilo que a temporada que agora terminou confirma: no mercado de inverno da época passada, o Liverpool contratou o melhor defesa central da atualidade e o melhor jogador do ano da Premier League.

Cerca de ano e meio depois, Van Dijk é titular indiscutível no eixo da defesa dos reds, é capitão de equipa na ausência de Henderson e James Milner e é um dos líderes incontestados no balneário da equipa orientada por Jürgen Klopp. Prova disso, mais do que a forma como o central se comporta dentro de campo, sempre a dar indicações à restante equipa e quase como um treinador no relvado, é o facto de ter sido escolhido pelos colegas para ter a braçadeira de capitão contra o Estrela Vermelha, em outubro, quando Henderson e Milner lesionados (ficou como terceiro capitão a partir daí).

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“Quando cheguei, instituí um comité de jogadores. Eram cinco, seis jogadores, incluindo o Lucas Leiva, o Adam Lallana e o Philippe Coutinho. A equipa cresceu entretanto e existem jogadores muito confiantes, por isso, podemos decidir qual deles queremos para capitão. Foi uma decisão renhida. O Lovren ficou perto, o Adam [Lallana] também. Todos votaram. O Virgil [Van Dijk] ainda é novo, parece muito mais velho do que realmente é. É bom para ele ter esta responsabilidade. É uma coisa natural”, explicou Klopp na altura, na conferência de imprensa de antevisão do jogo com o Estrela Vermelha.

Van Dijk completa 28 anos em julho. Não sendo tremendamente jovem, principalmente quando comparado com outros elementos do Liverpool — Alexander-Arnold tem 20, Origi tem 24 –, o central tem uma maturidade acima da média, muitos pontos acima da idade que traz no documento de identificação, e assume-se cada vez não só como líder dos reds como também da seleção holandesa que tenta voltar às conquistas de outros tempos com base numa geração muito nova. Maturidade essa que foi este sábado totalmente útil para a exibição irrepreensível de Van Dijk, considerado o melhor jogador da final da Liga dos Campeões, que teve dois pontos fulcrais: o momento depois do primeiro golo, em que o central é a balança de um conjunto que tem de segurar o entusiasmo para não deixar o Tottenham chegar a terrenos adiantados, e o momento antes do segundo golo, em que os spurs correram atrás do prejuízo e procuraram o empate como ainda não haviam feito. Van Dijk, como sempre, aliviou o que havia para aliviar, cortou o que havia para cortar, salvou o que havia para salvar. E conquistou o primeiro grande troféu de uma carreira que se adivinha memorável: nos últimos 64 jogos para todas as competições, nenhum jogador adversário passou por Van Dijk.