Os alunos oriundos de famílias mais pobres e com menos estudos têm menos probabilidade de se inscrever em cursos superiores de maior prestígio e com notas de entrada mais altas, conclui um estudo do Edulog, da Fundação Belmiro de Azevedo, que é apresentado esta quarta-feira em Matosinhos e cujos resultados são antecipados pelos jornais Público e Jornal de Notícias.

De acordo com estes jornais, o estudo baseia-se em dois indicadores para chegar a esta conclusão: as qualificações dos pais e mães dos estudantes e os apoios sociais que recebem do Estado.

O estudo destaca que os alunos com pais com mais estudos encontram-se sobretudo em cursos com notas de entrada mais elevada, habitualmente nas universidades, como Medicina ou engenharias, ao passo que aqueles cujos pais não chegaram ao ensino superior estão mais concentrados em cursos com menor nota de entrada e mais nos politécnicos.

Um dos números mais expressivos é precisamente no setor da Saúde. De acordo com o estudo, 73,2% dos estudantes de Medicina nas universidades portuguesas são filhos de pais que estudaram no ensino superior; inversamente, 73% dos estudantes de enfermagem (cursos essencialmente lecionados nos politécnicos) são filhos de pais que não chegaram ao ensino superior.

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O indicador dos apoios sociais sustenta a mesma conclusão. Os cursos de Medicina são os que têm menos bolseiros a nível nacional — apenas 15,11% dos alunos de todos os cursos de Medicina em Portugal recebem apoios sociais do Estado. Alguns cursos específicos são ainda mais elitistas: por exemplo, o curso de Engenharia e Gestão Industrial do Instituto Superior Técnico tem apenas 4,92% de alunos bolseiros.

Este número sobe para valores muito mais significativos em cursos tradicionalmente considerados menos prestigiados e que têm menor nota de entrada. Enfermagem, por exemplo, conta com 40,44% de estudantes apoiados pelo Estado. Solicitadoria tem 50% dos alunos a receber bolsas.

No geral, há uma diferença assinalável entre as universidades e os politécnicos: nas universidades, 28,14% dos alunos recebem bolsas; nos politécnicos, o valor é de 37,38%.

Nota-se também uma clara concentração dos alunos mais favorecidos em universidades da cidade de Lisboa face ao resto do país.

No topo da lista de instituições de ensino superior com menor percentagem de bolseiros encontram-se a Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (7,7%), o campus do Taguspark do Instituto Superior Técnico (8,3%); a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (8,9%); o Instituto Superior Técnico (9,4%), e a Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Lisboa (11,9%).

No extremo oposto da tabela, encontram-se a Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Lamego (68,9%); a Escola Superior de Saúde do Politécnico de Viana do Castelo (65,7%); a Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Politécnico do Porto (60,2%); a Escola Superior Agrária do Politécnico de Bragança (57,9%), e a Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Politécnico de Bragança (56,4%).

Alberto Amaral, coordenador do conselho científico do Edulog e presidente da A3ES (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior), explicou ao jornal Público que as notas mais elevadas são uma “barreira de acesso” difícil de ultrapassar pelos alunos mais desfavorecidos, uma vez que “quem não tem possibilidade de ir para um colégio privado ou ter explicações não consegue bater essa dificuldade”.

“Dito de um modo um pouco brutal, as classes mais baixas só podem tirar vantagem da expansão [do sistema de ensino] quando as necessidades das classes mais altas estiverem satisfeitas“, acrescentou Alberto Amaral, sublinhando que este conceito está estudado internacionalmente e dá pelo nome de “maximally maintained inequality” (ou “desigualdade máxima mantida”).

Ao Jornal de Notícias, Alberto Amaral explicou ainda outro conceito, o de “essentially maintained inequality” (ou “desigualdade essencialmente mantida”). Segundo o responsável, “os atores favorecidos socioeconomicamente vão conseguir para si e para os seus descendentes qualquer tipo de vantagem sempre que esta seja possível“.

“Enquanto um determinado nível escolar não é universal os favorecidos vão assegurar esse nível para os seus filhos”, explicou.