A ajuda a externa recebida por Cabo Verde aumentou mais de 15% no primeiro trimestre de 2019, em termos homólogos, ultrapassando os 11 milhões de euros, mas está a deixar de ser feita em alimentos e bens.

Segundo dados compilados esta sexta-feira pela Lusa com base num relatório estatístico de agosto do Banco de Cabo Verde, mais de metade da ajuda externa recebida no primeiro trimestre – 1.227 milhões de escudos, equivalente a 11,1 milhões de euros – foi proveniente de governos “parceiros”, totalizando 834,6 milhões de escudos (7,5 milhões de euros).

As doações de organizações supranacionais ascenderam no mesmo período, segundo os mesmos dados, a 339,7 milhões de escudos (três milhões de euros), uma quebra de 31,3% face ao primeiro trimestre de 2018, enquanto os donativos das organizações não-governamentais (ONG) representaram 36,6 milhões de escudos (331,3 mil euros), equivalente a uma descida homóloga de 16%.

O essencial dos donativos atribuídos nos primeiros três meses do ano diz respeito a divisas e ajuda orçamental, totalizando 1.151 milhões de escudos (10,4 milhões de euros), enquanto a ajuda em bens e outros equipamentos é praticamente residual, chegando a 76,1 milhões de escudos (688 mil euros) e numa tendência de queda.

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Há dois anos que Cabo Verde vive uma profunda seca, mas desde 2017 que o arquipélago também não recebe qualquer ajuda alimentar do exterior.

A ajuda externa a Cabo Verde atingiu em 2018 os 5.644 milhões de escudos (51 milhões de euros), uma descida de 21,8% face a 2017. O relatório do Banco de Cabo Verde não refere quais são os países doadores.

Um estudo apresentado no final de julho, na cidade da Praia, concluiu que Cabo Verde perdeu subvenções internacionais e tem vindo a aumentar a sua dívida pública após graduar-se país de rendimento médio, em 2008.

O estudo foi apresentado pelo especialista português para o desenvolvimento Jorge Moreira da Silva, durante uma reunião dos Pontos Focais dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS).

O investigador, antigo ministro do Ambiente de Portugal e atual diretor-geral de Desenvolvimento e Cooperação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) começou por recordar que Cabo Verde graduou-se a país de rendimento médio numa altura em que decorria uma crise financeira global, o que afetou muitos países parceiros do arquipélago africano.

Com a graduação, segundo Jorge Moreira da Silva, aconteceu uma alteração muito significativa da relação dos doadores, em que não houve mudança do volume financeiro da ajuda ao país, mas transformou a natureza dessa ajuda, com menos subsídios, mais empréstimos e mais investimento privado.

Além disso, o estudo concluiu que com a transição de País Menos Avançado (PMA) para País de Desenvolvimento Médio (PDM) houve um sobre-endividamento, já que Cabo Verde perdeu acesso a algumas subvenções internacionais, passando a estar dependente de empréstimos.

Outra consequência da graduação foi uma alteração da composição de parcerias, com alguns “doadores tradicionais a afastarem-se gradualmente” do apoio a Cabo Verde, e novos doadores, como a China, com maior presença.

“Defendemos que esse tipo de fenómeno de transição e de graduação precisa de uma melhor abordagem da parte dos doadores, não pode haver circunstâncias em que um país gradua-se e os doadores deixam de ter um apoio continuado, sustentável e previsível a este país”, aconselhou.