O governo da Argentina decidiu avançar com a imposição de controlos de capitais este domingo, depois de a moeda argentina ter perdido mais de 25% do valor em apenas um mês. Foi nessa altura que eleições primárias sinalizaram que o governo em funções, bem visto pelos mercados, não deverá conseguir manter-se no lugar, provavelmente perdendo as eleições de outubro. A crise já levou a que o país tenha indicado, na última semana, que não tem condições para cumprir os pagamentos sobre um conjunto de 101 mil milhões de dólares em dívida.

A decisão é uma tentativa de conter a crise financeira e evitar que as empresas presentes no país continuem a retirar capitais da Argentina, um movimento súbito que pressiona o peso e que o banco central argentino tem estado a tentar atenuar, sem grande sucesso. Só nos últimos dois dias da última semana, o banco central gastou cerca de três mil milhões de dólares das suas reservas de moeda estrangeira, tentando limitar a queda do peso.

O banco central definiu um prazo para que as empresas exportadoras repatriem, para a Argentina, todas as divisas estrangeiras que tiverem fora do país, no âmbito dos seus negócios. Passa, também, a ser necessária uma autorização para que se possa vender pesos no mercado cambial. E vai ser proposto aos detentores de parte dos títulos de dívida soberana argentina, no valor de 50 mil milhões de dólares, que aceitem uma “reestruturação voluntária” dos títulos que detêm.

Ao mesmo tempo, o Governo vai tentar renegociar o pagamento dos empréstimos do Fundo Monetário Internacional (FMI), que ascendem a 44 mil milhões.

Esta não é a primeira vez que os argentinos são confrontados com medidas de restrição monetária, depois de, no final de 2001, terem visto as suas poupanças aprisionadas nos bancos. Anos mais tarde, durante o Governo de Cristina Fernández (2007-2015), os argentinos viveram mais restrições cambiais, ficando obrigados a solicitar autorização para comprar dólares e para realizar transferências para o exterior, pagando uma taxa adicional pela compra de cartões de crédito no exterior e vendo um mercado florescente paralelo à moeda oficial.

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Essas restrições – a chamada “taxa de câmbio” — foram na altura criticadas pelo atual Presidente, Macri, que agora é forçado a impor idênticas medidas, afetando a sua popularidade e colocando em risco as suas aspirações a uma reeleição, em outubro próximo.

“O executivo viu a necessidade de adotar uma série de medidas extraordinárias para garantir o funcionamento normal da economia, sustentar o nível de atividade e emprego e proteger os consumidores”, argumenta o decreto assinado pelo Presidente.

De acordo com fontes oficiais, ninguém ficará limitado a retirar dólares das suas contas bancárias e não haverá restrições para viajantes. Para quem quiser comprar moeda, o valor mensal máximo para pessoas singulares será de 10.000 dólares (cerca de oito mil euros) e será necessária autorização prévia para compras que excedam esse valor. No caso de transferências de fundos de contas no exterior, o máximo será também de 10.000 dólares por pessoa, por mês.

Para atender ao impacto das medidas, os bancos foram autorizados a estender o horário de atendimento a clientes, em setembro.

As medidas restritivas sucedem após o que ficou já conhecido como o “agosto negro”, nos mercados, depois de, em 11 de agosto, nas eleições primárias do partido do Presidente, Frente de Todos, o peronista Alberto Fernández, ter obtido 47,78% dos votos, muito à frente do resultado de 31,79% obtido por Macri.

A crise financeira na Argentina, além de afetar gravemente títulos e ações públicas, provocou o pânico entre os investidores, o que, por sua vez, aumentou o preço do dólar em 35,8%, em agosto. Em agosto, as reservas monetárias da Argentina caíram cerca de 12 mil milhões de euros, para 54.098 milhões.