Esta quarta-feira, enquanto passeava o cão, um sargento da Guarda Civil espanhola encontrou um cadáver em La Peñota, na Serra de Guadarrama. O agente, que vive perto do local, alertou para a presença do corpo e disse desde logo que se tratava de uma mulher, morta há vários dias, numa janela que podia ir dos sete aos dez. A chegada da polícia e dos responsáveis de medicina legal depressa confirmou aquilo que ninguém em Espanha queria ouvir: o corpo era de Blanca Fernández Ochoa, uma antiga esquiadora olímpica desaparecida há 11 dias, e cuja morte, avança o El Mundo, não foi acidental, segundo as primeiras investigações conduzidas pela polícia, que descarta a hipótese de uma queda.

Com 56 anos feitos em abril, Fernández Ochoa era uma pioneira não só para as mulheres atletas como também para os desportos de inverno no geral, já que se tornou a primeira espanhola a ganhar uma medalha nos Jogos Olímpicos de inverno. Tida como a melhor esquiadora espanhola de sempre, era uma de sete irmãos que cresceram em Puerto de Navacerrada, uma localidade conhecida por ter uma famosa estância de esqui — não porque a família ali tinha uma casa de férias mas sim porque o pai era gerente da Escola Nacional de Esqui. “Nasci em Madrid mas, segundo os meus pais, vim para aqui quando tinha três dias. Sempre estive aqui, entre estas montanhas. Aos onze anos fui logo para os Pirinéus de Lérida. Calcei os esquis antes de ter oito anos mas nem sequer gostava muito de esquiar, não gostava de passar frio nas pistas. Eram os meus irmãos e o meu pai que me entusiasmavam, e sobretudo a minha mãe, que se via livre de mim durante um bocado e ficava mais tranquila”, contou a atleta ao ABC em 1981, quando tinha apenas 17 anos.

A espanhola foi medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de inverno de 1992

O esqui era uma tradição de família. Os quatro irmãos mais velhos — Dolores, Francisco, Juan Manuel e Luis — competiram nos Jogos Olímpicos de inverno e um deles, Francisco, foi mesmo medalha de ouro em 1972, na prova de slalom dos Jogos de Sapporo, no Japão. Blanca Fernández Ochoa competiu em quatro edições dos Jogos, de 1980 a 1992, e foi precisamente na década de 80 que se tornou uma das figuras maiores do desporto espanhol. Recebeu o Prémio Rainha Sofia para Melhor Atleta em 1983 e em 1988 e somou vitórias, pódios e tops 10 nos Campeonatos do Mundo. O melhor, porém, estava para chegar. Já com 28 anos, nos Jogos Olímpicos de Albertville, ficou em terceiro na final de slalom, conquistou a medalha de bronze e garantiu a primeira distinção olímpica em provas de inverno para uma espanhola.

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Retirou-se das pistas pouco depois e abriu uma loja de equipamento de esqui em conjunto com os irmãos, que se manteve uma referência na área durante 24 anos mas que acabou por falir nos primeiros anos desta década. Tornou-se depois personal trainer, novamente com os irmãos Lola, Juan Manuel e Luis, e em 2015 criaram um plano de treino chamado En Forma 8A, “uma sistema de treino no domicílio que conta com a tecnologia alemã Loncego de eletroestimulação muscular”, como explicou na altura ao El Mundo. Entre os negócios, começou a aparecer em vários programas de televisão e reality shows, como “La Selva de los Famosos”, um formato semelhante àquilo que em Portugal foi o “Survivor”, e ainda “¡Mira quién baila!”, a edição espanhola de “Dança com as Estrelas”.

David Fresneda, o filho de Blanca Fernández Ochoa, esta quarta-feira de manhã no local onde a antiga esquiadora foi encontrada morta

Foi casada duas vezes, primeiro com um antigo esquiador que acabou por abandonar a competição devido às lesões e se tornou preparador físico de Blanca, e depois com o dono de uma escola de mergulho, com quem teve dois filhos. Em 2006, numa altura em que já estava separada do segundo marido e prestes a divorciar-se, um dos irmãos, Paco, morreu de forma inesperada. Desde aí, Blanca Fernández Ocho desapareceu progressivamente da vida pública e dedicou-se por inteiro aos dois filhos e aos negócios, acabando por ir viver com uma das irmãs no início deste ano. Desapareceu então no dia 23 de agosto, depois de ter saído de casa de carro em direção à Serra de Guadarrama para fazer uma caminhada. Numa fase inicial, as autoridades admitiram que a antiga esquiadora poderia ter desaparecido por vontade própria, mas o testemunho de um homem que a encontrou na manhã de sexta-feira, e a quem Fernández Ochoa disse que ia ao ponto mais alto de La Peñota, tornaram o cenário de acidente mais provável. Esta quarta-feira, depois de vários dias de buscas, a antiga medalhada olímpica foi encontrada morta e ainda não se conhecem os pormenores do que aconteceu.