O presidente do Governo Regional dos Açores, Vasco Cordeiro, salientou este sábado a importância de ter em conta os interesses das comunidades piscatórias açorianas na discussão sobre as alterações climáticas e a preservação dos oceanos. Sublinhando que “não há uma oposição” entre aqueles que têm de se preocupar com o salário ao fim do mês e os que se preocupam com o futuro do planeta, Vasco Cordeiro assinalou que falta “sermos capazes de evidenciar que há um valor económico” na preservação da natureza.

Numa palestra no encontro “O Futuro do Planeta”, que decorre este fim de semana em Lisboa promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e pela Fundação Oceano Azul, Vasco Cordeiro disse que os pescadores e todos aqueles que dependem dos oceanos para terem o seu sustento “também reconhecem as ameaças” e também “dão valor a ações, a elementos e a valores como a proteção do ambiente e a preocupação com o oceano”. É necessário, continuou, que “quem se preocupa com o fim do mês” saiba que “tem algo a ganhar” se se empenhar na proteção do planeta.

Questionado por um membro da plateia sobre como se conjugam os interesses dos trabalhadores locais com o trabalho de preservação do oceano, Vasco Cordeiro respondeu com um exemplo, destacando que a atividade de whale watching [observação de baleias] rende “muito mais” do que alguma vez rendeu ou renderá a caça à baleia. Nada do que se faça, disse, “vale se não tivermos nos pescadores, mas não só, os primeiros defensores desse processo”. “Certamente que os preocupa também a escassez de recursos. No fim do dia, eu preciso de ter uma resposta para aquele pescador: ‘Não é pelo facto de te preocupares com isso [a preservação do oceano] que deixarás de ter o pão em cima da mesa.”

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Vasco Cordeiro referia-se especificamente ao projeto da Região Autónoma de criar uma área marinha protegida em 15% da Zona Económica Exclusiva dos Açores. “É fácil fazê-lo no discurso, num decreto legislativo regional, num mapa desenhando a área. O mais difícil é a batalha do espírito, a de fazer ver a todos — e desde logo àqueles que retiram o seu sustento dessa área — que têm algo a ganhar se a sua abordagem for conforme a esses objetivos do que se não for conforme a esses objetivos.”

“Uma componente fundamental é o envolvimento das comunidades piscatórias. Não é possível, com a vastidão do oceano que temos, descansarmos na componente sancionatória de qualquer tipo de regulamento. A batalha das mentes tem de ser vencida a priori. Se conseguirmos demonstrar que é do seu interesse — não do interesse altruísta, mas do seu interesse ao fim do mês —, essa batalha está ganha”, acrescentou Vasco Cordeiro.

Antes, o presidente do Governo Regional dos Açores tinha dado aquilo que disse ser uma “visão açoriana” das alterações climáticas. “Será que ainda estamos a tempo de discutir ou de debater o futuro do planeta? Será que todas as evidências que nos vão chegando e que nos entram pela porta dentro todos os dias nos permitem ter a calma e a serenidade para estarmos na discussão do futuro do planeta? Ou estamos a discutir o presente?”, questionou Vasco Cordeiro.

Na mesma conferência falou o apresentador britânico Paul Rose, explorador e mergulhador, que está à frente da National Geographic Pristine Seas Expeditions, expedição internacional destinada a mapear o fundo dos oceanos em algumas zonas nunca antes exploradas — incluindo algumas regiões dos Açores. Classificando os Açores como “epicentro do oceano global”, Paul Rose apresentou algumas das imagens da expedição, cujos resultados deverão ser conhecidos nos próximos meses.

O encontro “O Futuro do Planeta” decorre este fim de semana em Lisboa com um foco especial na questão dos oceanos e da importância do mar na história e economia de Portugal. Entre os oradores internacionais encontram-se o ex-secretário de Estado dos EUA John Kerry e a bióloga marinha Sylvia Earle.

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