Reportagem na Madeira

A dois dias das eleições na Madeira, nenhuma sondagem aponta para o cenário de maioria absoluta. Será, ao que tudo indica, uma mudança histórica para a Região que, pela primeira vez, terá ou um governo minoritário apoiado na Assembleia Regional ou um governo de coligação. Assim, os partidos que até agora têm estado na oposição com uma capacidade de influência quase nula vão poder ter uma palavra a dizer na governação da ilha nos próximos quatro anos. A vitória pode cair para o lado do PSD — a maior parte dos estudos de opinião apontam para este cenário — ou para o lado do PS. Mas, como se viu no continente nos últimos quatros anos, nem uma vitória garante a presidência do governo. Tudo dependerá da margem com que ganhem e da distribuição de lugares no parlamento. O objetivo é atingir o número mágico: 24 assentos parlamentares, mais de metade do hemiciclo.

Com alta probabilidade, PSD e PS vão ver-se obrigados a negociar com os restantes partidos no dia seguinte ao das eleições. O PSD parece estar limitado à sua direita e quiçá a algum estreante. O PS está disponível para se entender com qualquer um, “exceto com o PSD”, como referiu Paulo Cafôfo em entrevista ao Observador. É nestes partidos mais pequenos que se esconde a chave para a formação do próximo governo regional da Madeira.

CDS-PP pode ser o fiel da balança

Os centristas são atualmente o maior partido da oposição no parlamento regional, detendo sete assentos parlamentares. Esta situação, quer segundo a sondagem divulgada na terça-feira pela RTP quer na que foi publicada quinta-feira no Diário de Notícias da Madeira, deve alterar-se. A primeira indica que se ficarão pelos dois ou três deputados, a segunda, mais otimista, aponta para os quatro. Mas não é por isso que o CDS-Madeira perde importância no próximo quadro parlamentar.

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Até podem perder deputados, mas ganhar influência. Até ao momento, o CDS é o único dos partidos mais pequenos que está disposto a entender-se tanto com o PSD como com o PS. A preferência dos centristas recai sobre o parceiro mais tradicional — os socias-democratas — mas Rui Barreto, líder do partido na região, não põe de lado a hipótese de viabilizar um governo socialista minoritário. Ainda assim, neste segundo caso, o partido coloca uma condição prévia: só há acordo com o PS se os partidos de esquerda não fizerem parte da solução.

Ao longo da campanha, Rui Barreto foi sempre fugindo das questões sobre se preferia PSD ou PS. “O nosso programa é o nosso caderno de encargos”. Do outro lado, nem socialistas nem social-democratas pareceram muito incomodados com esta postura. Albuquerque só aceita coligações com o CDS e Paulo Cafôfo não exclui os centristas da equação para fazer um acordo pós-eleitoral. Só uma coligação de esquerda evitaria que o CDS ficasse de fora de uma solução de governo.

Com o Bloco só mesmo à esquerda

Paulino Ascenção é o candidato número um do Bloco de Esquerda. Com ele leva a experiência de ter sido deputado eleito pelo partido na Assembleia da República nesta legislatura. Embora só tenha cumprido meio mandato sabe o que é fazer diretamente parte da “geringonça”. Um trunfo que pode aliar ao facto de poder vir a ser o primeiro dos últimos partidos à esquerda, com as sondagens a colocarem os bloquistas a eleger tantos ou mais deputados do que o JPP e do que a CDU.

Atualmente contam com dois lugares no parlamento regional mas há a possibilidade de aumentarem este número para três. O BE está disposto a entrar para uma solução tipo “geringonça” — a preferida de Paulo Cafôfo. Quem o disse foi a própria Catarina Martins, no sábado passado, quando passou pela Madeira. “Bem precisamos de outra solução que afaste o PSD e que possa responder pelas pessoas. O BE não faltará a essa solução exigente e não haverá uma mudança exigente sem o BE”, afirmou.

Uma frase que Paulino Ascenção tem vindo a repetir desde então e que aponta baterias a uma só possibilidade: um entendimento entre o PS e os partidos de esquerda.

JPP. O partido madeirense que recusa absolutamente o PSD

O Juntos Pelo Povo (JPP) começou por ser um partido regional mas já se foi expandido pelo continente. No entanto, é na Madeira que continua a ter mais peso e mais poder de influência. Atualmente com cinco assentos parlamentares, o objetivo é manter o número de deputados, embora nenhum sondagem preveja que esse cenário esteja perto de ser alcançado, com os resultados a variarem entre um e três assentos, passando o partido de quarta para quinta força política no parlamento regional.

O partido é liderado por dois irmãos: Élvio Sousa, deputado regional e cabeça-de-lista do partido a estas eleições, e Filipe Sousa, presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, onde detém seis dos sete mandatos. Cabe ao primeiro decidir que apoios parlamentares estão dispostos a dar e em que condições. Mas há algo que parece definido à partida: o PSD não contará com o JPP para ter a maioria que parece estar a escapar.

Todos os deputados podem contar e mesmo que o grupo parlamentar fique muito reduzido não há nenhuma aritmética à esquerda que possa desvalorizar o JPP. Até porque o apoio do BE e da CDU a um eventual governo minoritário do PS pode não ser suficiente e o “bocadinho assim” que faltar pode ser o partido dos irmãos Sousa.

CDU aceitaria geringonça à moda da Madeira

À semelhança do que Jerónimo de Sousa vai dizendo no continente, Édgar Silva vai respondendo a todas as questões sobre acordos pós-eleitorais com clichés típicos dos comunistas: “A CDU está disposta a contribuir para uma solução que defenda os trabalhadores e o povo”. Dito assim, para muitos, não quererá dizer nada. Mas para os ouvidos de Paulo Cafôfo é música.

Previsivelmente a CDU irá manter o mesmo número de deputados — dois. Dentro das margens de erro das sondagens cabe ainda a possibilidade de os comunistas perderem um mandato, embora as percentagens tornem esta hipótese algo improvável.

Com dois lugares na Assembleia Regional, o objetivo de afastar o PSD do poder e a experiência da “geringonça” na bagagem, os comunistas não serão o entrave a que se forme um governo minoritário do PS com apoio parlamentar. Isto, claro, se a distribuição de lugares que resultar das eleições de domingo assim o permitir.

PAN. O estreante que pode entrar pela porta grande

Com a possibilidade de eleger um dos 47 assentos do parlamento regional da Madeira e com as sondagens a não fecharem nenhum cenário, o PAN pode entrar pela primeira vez na política madeirense e logo para baralhar as contas. Sem assumir se é de esquerda ou de direita, PS e PSD olham com curiosidade para o que este partido pode fazer nas eleições.

Do lado dos socias-democratas, o Observador sabe que Miguel Albuquerque não põe de parte, em caso de necessidade, a hipótese de somar os votos do PSD e do CDS aos do PAN. Serão o único partido que poderá vir a entrar na equação laranja além dos centristas. Mas só num cenário muito específico, em que os dois partidos de direita ficassem a um lugar da maioria absoluta.

No PS, com Paulo Cafôfo disposto a liderar uma coligação de todos contra o PSD, o PAN é visto como mais um partido que conta para a aritmética parlamentar e que pode reforçar esta frente anti-PSD. Não será certamente um partido preterido das mesas de negociações.