O terreno junto à Ponte da Arrábida, no Porto, não pertence à imobiliária da família do autarca Rui Moreira e é mesmo da Câmara Municipal do Porto. Foi essa a conclusão do Tribunal da Relação do Porto (TRP), que decidiu confirmar de forma integral a decisão da primeira instância, há oito meses.

A notícia é do jornal Público (link para assinantes), que dá conta de um acórdão que pode levar ao fim das pretensões por parte da imobiliária Selminho sobre aqueles terrenos de 1661 metros quadrados, envoltos num intricado processo de disputa de vários anos. O caso ganhou especial relevância uma vez que a pretensão da família do autarca portuense era a de precisamente negar a propriedade do terreno à Câmara Municipal do Porto, liderada por Rui Moreira desde 2013.

O terreno em causa foi vendido pelo casal João Batista Ferreira  e Maria Irene de Almeida Pereira Ferreira, tendo essa transação sido registada pelo Cartório Notarial de Montalegre, a 31 de julho de 2001. À altura, o casal vendedor terá explicado ter adquirido os terrenos em 1970 a Álvaro Nunes Pereira, através de um contrato verbal, não havendo dessa forma qualquer registo dessa transação.

O que o TRP veio agora confirmar é que a posse dos terrenos não pode ser atribuída à Selminho (da qual a mãe de Rui Moreira detém 5% e cujos restantes 95% são dos seus filhos, incluindo o autarca portuense), uma vez que nunca chegaram a ser legalmente do casal Pereira. Antes deles, os terrenos tampouco seriam de Álvaro Nunes Pereira. Desta forma, sobra a opção que remete para o último documento legal que indica a propriedade dos terrenos: são da Câmara Municipal do Porto, que à altura expropriou os terrenos para ali ser construída a Ponte da Arrábida.

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Embora o acórdão do TRP, consultado pelo Público, diga que “não houve qualquer entrega da coisa, material ou simbólica” na escritura celebrada entre o casal Ferreira e a Selminho em 2001, é também sublinhado que  “não foi produzida qualquer prova direta do conhecimento, no momento da celebração da escritura pública de compra e venda, da irregularidade da propriedade” por parte do casal Ferreira.

Um dos pontos que já tinha levado o tribunal de primeira instância, e levou também o TRP, a determinar que o casal Ferreira não era proprietário do terreno, era o facto de a família de Álvaro Nunes Pereira (o tal que teria vendido, em contrato verbal, o terreno àquele casal) ali continuou a viver.

O tribunal confirmou ainda que os terrenos não podem ser atribuídos à Selminho também pela via da usucapião, referindo que “a posse só se inicia com a prática dos atos materiais que a revelam e não com a outorga do título nem como registo deste”. Já com a compra feita, a Selminho chegou a obter (em 2002)  direitos de construção no terreno — e que mais tarde lhe foram negados em 2006, por aquela ser uma zona de escarpa. Estas ações não são, porém, “atos materiais”, como qualifica o tribunal.

O primeiro ato desse género por parte da Selminho é identificado a 30 de janeiro de 2014 “com a apresentação à Câmara do Porto de um documento sobre a qualificação de um documento sobre a qualificação proposta pelo Plano Diretor Municipal para a área da escarpa da Arrábida”. Assim, para o tribunal, uma vez que é nula a escritura de 2001, é apenas em 2014 que a Selminho age como proprietária dos terrenos.

No entanto, de acordo com a lei, no caso de não haver registo do título de propriedade de um terreno, a usucapião de um terreno só é considerada em casos de quinze anos (se a posse for de boa fé) ou de vinte anos (se a pose for de má fé). Tanto de uma forma como de outra, entende o tribunal, esse período não passou, já que começa a contar apenas em 2014.