Várias cartas subscritas por centenas de artistas que contestam os resultados dos concursos de apoio às artes e reclamam financiamento para todos os elegíveis vão ser esta sexta-feira entregues, às 15h, na residência do primeiro-ministro, António Costa, em Lisboa.

As cartas, que segundo a ORG.I.A — Organização, Investigação e Artes, representam mais de 800 entidades, artistas e públicos, surgiram como reação à divulgação, há uma semana, dos resultados provisórios dos Concursos Sustentados Bienais 2020/2021 de apoio às artes.

A 11 de outubro, a Direção-geral das Artes (DGArtes), responsável pela organização dos concursos a nível nacional, divulgou esses resultados, segundo os quais, de um total de 196 candidaturas apresentadas, 75 consideradas elegíveis pelos júris, em “qualidade e diversidade”, não vão receber financiamento.

Das 177 entidades artísticas que foram consideradas elegíveis pelos júris de todas as áreas, 102 vão receber financiamento, e 19 foram totalmente excluídas do concurso por terem sido consideradas não elegíveis.

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A divulgação dos resultados provocou uma reação de estruturas artísticas reclamando o aumento das verbas disponíveis para estes concursos, que ascendem a de 18,7 milhões de euros para o próximo biénio, num aumento de cerca de 17% em relação ao anterior.

Num comunicado assinado por Filipe Abreu, Levi Martins e Tânia Guerreiro, é referido que as cartas que vão ser entregues “sugerem como ponto de partida, a atribuição de apoio a todas as estruturas elegíveis, como proposta de solução intermédia, até alteração profunda do atual sistema de apoio às artes, que tem revelado desde o início, problemas graves”.

Recordam ainda que António Costa afirmou este ano que “daria à cultura uma importância cada vez maior, tendo referido, inclusivamente, o objetivo de dotar o ministério que a tutela com uma orçamento mais consentâneo com as verdadeiras necessidades do país”.

“No entanto, a realidade com que nos agora nos confrontamos é uma repetição do passado, com largas dezenas de candidaturas elegíveis nas várias áreas artísticas a não serem contempladas com qualquer tipo de verba, pese embora tenham sido reconhecidas pelos diversos júris como elegíveis”, acrescentam.

Na generalidade das dezenas de reações de entidades artísticas, é apontada uma “reduzida dotação orçamental face à dimensão do setor”, e alertam que a falta de apoio “pode vir a causar danos irreparáveis” no tecido artístico do país.

Na sexta-feira tinha já sido divulgada uma carta aberta na qual, as entidades então signatárias – cerca de 50, e mais 300 artistas individualmente – recordavam ainda as posições tomadas pelos júris dos concursos para o Teatro, que, numa carta à ministra da Cultura Graça Fonseca decidiram: “[…] apelar à sua sensibilidade e compreensão para que se encontre uma solução que resgate as expectativas dos candidatos. Entendemos que um reforço, tão sólido quanto possível, da dotação para este concurso seria a melhor forma de pôr fim a esta profunda discrepância”.

DGArtes: 50 entidades artísticas pedem reforço de verbas ao Governo

Afiançavam, na carta, que cerca de 6,1 milhões de euros “é o suficiente para o financiamento anual de todas as estruturas elegíveis nestes concursos”.

Várias outras estruturas, como a associação Plateia ou a PERFORMART (que reúne entidades como as fundações de Serralves, Centro Cultural de Belém e Casa da Música, ou os teatros nacionais D. Maria II, São João e Opart), vieram ainda criticar a divulgação dos resultados mais de um mês depois da data da última reunião do júri, sugerindo um propósito eleitoral para o atraso.

“A retenção dos resultados até à semana após as eleições vem apenas comprovar a consciência, por parte do Ministério da Cultura, da desestabilização que iria provocar a inadequação dos resultados às necessidades concretas do tecido artístico”, podia ler-se no comunicado da PERFORMART.

No dia em que os resultados foram divulgados, o diretor-geral das Artes, Américo Rodrigues, contactado pela agência Lusa, disse que as entidades que não foram contempladas “podem e devem” contestar estes resultados provisórios, se deles discordarem.

A fase de audiência de interessados terminará no próximo dia 25 de outubro.

Segundo Américo Rodrigues, neste concurso “houve mais 48 candidaturas admitidas, num crescimento de 32%, e um aumento de 46% de entidades elegíveis”, tendo “o valor médio de apoio concedido” aumentado “cerca de 16% face ao anterior, representando um apoio médio de 183 mil euros por entidade”.

O diretor-geral das Artes destacou igualmente “um rejuvenescimento do meio artístico, com a entrada de outros protagonistas”, e 33 novas entidades apoiadas.

Américo Rodrigues disse ainda que, no final do processo, será feita uma análise dos concursos, para avaliar com a tutela da Cultura a necessidade de “criar novas formas de apoio” às entidades artísticas nacionais.

Os contratos com as estruturas apoiadas realizar-se-ão até ao final do corrente ano, indicou a DGArtes.

Os Concursos Sustentados Bienais 2020/2021 foram realizados no âmbito de uma segunda remodelação do novo modelo de apoio de apoio, que entrou em vigor em 2018.

Na altura, o novo modelo foi fortemente contestado por artistas e agentes culturais, que em abril desse ano realizaram manifestações de protesto a nível nacional.

Respondendo a esses protestos, a anterior tutela da Cultura, liderada pelo ministro Luís Filipe Castro Mendes, voltou a ouvir os artistas, com o objetivo de recolher contributos para a melhoria do modelo, através de um Grupo de Trabalho — composto por entidades artísticas, sindicatos e personalidades da área da cultura – que deu contributos à remodelação atualmente em vigor.