Durante a tarde de sábado, os alarmes soaram em Madrid e no Wanda Metropolitano: na segunda parte da receção do Atl. Madrid ao Valencia, João Félix colocou mal o pé, torceu de forma evidente o tornozelo e saiu em ombros diretamente para o balneário, sem conseguir caminhar sozinho. Na conferência de imprensa, Diego Simeone reconheceu que achou, na altura, que se tratava de uma lesão simples — mas que as coisas poderiam não ser bem assim. Mais tarde, o clube espanhol revelou que o jogador português sofreu um grave estiramento nos ligamentos do tornozelo, um problema que pode provocar a ausência de João Félix durante quatro a seis jogos.
Tudo isto quer dizer que esta terça-feira, ao receber o Bayer Leverkusen na terceira jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões, Simeone não tinha aquela que é, inevitavelmente, a estrela da companhia. Depois de empatar com a Juventus de Cristiano Ronaldo em casa e ir à Rússia vencer o Lokomotiv Moscovo, um resultado positivo perante os alemães deixaria os espanhóis numa posição apetecível para lutar pelo primeiro lugar do grupo com os italianos: mas para isso, primeiro, era necessário ganhar. No fim de semana, o Atl. Madrid desperdiçou uma vantagem garantida ainda na primeira parte graças a uma grande penalidade de Diego Costa, sofreu um golo do Valencia logo após a saída de João Félix deixar a equipa com menos um elemento e passou os instantes finais do jogo a segurar o empate. Empate esse que foi o segundo consecutivo e o terceiro em quatro jogos, depois dos nulos com o Real Madrid e o Valladolid, e que confirmou o momento morno da equipa de Simeone. Mais do que isso, confirmou uma estatística pouco animadora — este é o Atl. Madrid menos goleador dos últimos 50 anos, com um registo de apenas oito golos marcados nas primeiras nove jornadas da liga espanhola.
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Era perante este cenário pouco confortável, adensado pela lesão e ausência de João Félix, que os colchoneros se apresentavam esta terça-feira no Wanda Metropolitano. A saída do jogador português, que entretanto está entre os 30 finalistas à conquista da Bola de Ouro, do onze inicial abria espaço à entrada de Herrera, que ocupava um lugar mais central no meio-campo, empurrando Koke para o lado direito, onde costuma estar Félix. Na frente de ataque, Morata perdia a titularidade para Correa, que fazia dupla com Diego Costa. Do outro lado, o Bayer — que está a dois pontos da liderança na Bundesliga, numa edição da liga alemã em que do primeiro ao nono lugar vão apenas esses dois pontos — tinha Kai Havertz enquanto titular. O jovem avançado, de apenas 20 anos, foi apelidado de “João Félix alemão” pela imprensa espanhola durante toda a semana e apresentado como principal perigo para a equipa de Simeone.
Num jogo arbitrado pelo português Artur Soares Dias, foi preciso esperar meia-hora para assistir à primeira real oportunidade de golo. Ainda assim, era o Bayer Leverkusen que mostrava mais iniciativa e que tinha mais bola, entre lances mais rendilhados em que circulava durante vários segundos à volta da grande área de Oblak e transições rápidas normalmente coordenadas por Havertz ou Bellarabi que apanhavam desprevenida a defesa do Atl. Madrid. Os espanhóis iam procurando o jogo interior de Koke e Saúl, que buscavam espaço entre linhas para desequilibrar no setor intermédio e encontrar as desmarcações de Diego Costa ou Correa, mas a falta de paciência dos jogadores colchoneros desembocava habitualmente em passes verticais e infrutíferos que eram rapidamente asfixiados pela defensiva alemã.
⏱ 30' [ 0-0 ] ¡Primera media hora! ¡Vamos equipo! ????
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A equipa de Simeone, que ficou sem o central Giménez ainda durante o primeiro quarto de hora (lesionou-se e foi substituído por Mario Hermoso), tinha em Renan Lodi, brasileiro que é reforço de verão mas que entrou diretamente para a esquerda da defesa no onze inicial, o principal impulsionador e agitador, fosse junto à linha lateral ou mais perto da grande área. O lateral acabou mesmo por protagonizar a única ocasião de golo que o Atl. Madrid criou na primeira parte, ao rematar rasteiro para a defesa de Hradecky depois de um grande passe de Herrera (32′). Do outro lado, o Bayer Leverkusen não conseguia transformar o fluxo ofensivo em oportunidades ou golos e falhava normalmente na hora da decisão e do último passe, desperdiçando lances bem construídos que deixavam a defesa espanhola longe da tranquilidade.
Na segunda parte, o Bayer — que em duas jornadas, perante Lokomotiv e Juventus, levava duas derrotas — precisava de correr atrás do prejuízo e procurar o golo e os três pontos que ainda garantissem uma esperança de futuro nas competições europeias. A equipa alemã subiu as linhas e deslocou os blocos com o objetivo de chegar perto da baliza de Oblak, algo que raramente aconteceu durante a primeira parte: Bellarabi, tombado na direita mas com muita presença na faixa central e nas costas de Volland e Havertz, era o principal impulsionador da equipa de Peter Bosz e era através do alemão que o Bayer ia, ainda que timidamente, chegando ao último terço do Atl. Madrid. O conjunto de Simeone continuava com os mesmos problemas com que tinha partido para o intervalo, com pouca paciência para pensar o jogo e construir e a partir para a verticalidade e o imediatismo que raramente causava frutos.
Esta incapacidade por parte da equipa de Diego Simeone de chegar à baliza contrária de forma ponderada tornou os lances de bola parada os mais perigosos criados pelos espanhóis e levou o treinador argentino a esgotar as alterações ainda antes dos 70 minutos (entraram Lemar e Morata, saíram Correa e Koke). Herrera ficou perto de voltar a marcar na Liga dos Campeões com um remate que saiu enrolado e que obrigou Hradecky a uma grande defesa, ainda que o lance tenha terminado anulado por fora de jogo, e o Bayer Leverkusen ia aceitando cada vez mais o empate com o passar dos minutos.
Peter Bosz tirou Kai Havertz para lançar Paulinho e dar a ideia de que ia à procura da vitória mas acabou por ser o Atl. Madrid, numa das primeiras jogadas organizadas que conseguiu empreender, a chegar ao golo. Lemar descobriu espaço nas costas da defesa alemã pela primeira vez, Renan Lodi apareceu em terrenos avançados pela primeira vez na segunda parte e Morata fez o primeiro remate desde que havia entrado em campo: o lateral brasileiro recebeu na ala esquerda e cruzou para o primeiro poste, onde o avançado espanhol surgiu em velocidade a cabecear para inaugurar o marcador (78′), tornando-se o primeiro jogador da história a marcar na Liga dos Campeões tanto ao serviço do Real Madrid como do Atl. Madrid.
Menos de 10 minutos depois de entrar no jogo, Morata resolveu e desembrulhou uma partida que estava muito difícil para o Atl. Madrid e somou sete pontos na grupo da Liga dos Campeões, assumindo a candidatura ao primeiro lugar. Já o Bayer, com três derrotas em três jogos, tem o adeus às competições europeias praticamente garantido. O Atl. Madrid continua a marcar poucos golos, continua a vencer pela margem mínima, continua a golear à Simeone mas conseguiu ganhar: e nesta altura, sem João Félix e com a Juventus no grupo, o mais importante era não somar o quarto empate em cinco jogos. O treinador argentino soube mexer na equipa e venceu o encontro a partir do banco, tanto com o óbvio Morata como com Lemar, que fez subir o meio-campo espanhol, ofereceu a definição que faltava desde o início e construiu a jogada do golo.