Não surpreende que os apoiantes de Miguel Pinto Luz e Luís Montenegro ataquem Rui Rio. As candidaturas sabem que uma pode ser o apoio da outra numa eventual segunda volta contra o atual líder. Mas antes disso há uma primeira volta e já há apoiantes do autarca de Cascais a atirar àquele que foi o líder parlamentar durante todo o governo de Passos Coelho. Um diz que Montenegro não tem projeto para o país e que, o que tem, “cheira a troika”; outro disse que, mesmo numa segunda volta sem Pinto Luz, não votaria em Montenegro. E há ainda quem fale da necessidade de “novos rostos”.
O antigo líder da concelhia de Lisboa, Mauro Xavier, escreveu esta quarta-feira no Facebook que se revê na candidatura de Miguel Pinto Luz. E, lá está, sem surpresa, o apoiante de Pinto Luz disse discordar da forma como Rui Rio “faz oposição e gere o PSD”. Mas depois consegue ser ainda mais duro com Luís Montenegro: diz que concorda com o antigo líder parlamentar na necessidade de “unir o partido”, mas discorda da “estratégia de coligações pré-eleitorais”. E acrescenta: “Até ao momento não lhe conheço um projeto para Portugal ou o que conheço cheira a troika.”
Já na terça-feira o antigo secretário de Estado do Ambiente, José Eduardo Martins, tinha arrasado aquela que tem sido a estratégia de Luís Montenegro. Desde logo, em entrevista à TSF, começou por criticar o legado (de Passos Coelho) que Montenegro quer proteger: “O insucesso eleitoral do PSD, vamos ser justos, não começa com Rui Rio“.
Sobre o antigo líder parlamentar, José Eduardo Martins critica as movimentações de janeiro de 2019: “[Foi] uma tentativa de golpe tão fraquinho, tão fraquinho, que morreu numa semana, e só lhe deu mais força [a Rui Rio] para fazer o último ano de mandato com toda a liberdade.” Mas, aí, o objetivo até foi mais criticar Rio e demonstrar que teve todas as condições para liderar. No entanto, quando lhe perguntaram se apoiaria Luís Montenegro caso Pinto Luz não passasse à segunda volta, José Eduardo Martins deixou claro que não dará o seu voto ao antigo líder parlamentar: “Na eventualidade de Miguel Pinto Luz ficar em terceiro, abstenho-me de fazer muito mais escolhas. Também não é preciso sempre fazer escolhas“.
Já quando anunciou o apoio a Miguel Pinto Luz, o antigo secretário-geral do PSD no tempo de Passos Coelho, José Matos Rosa, visou indiretamente Luís Montenegro (ao mesmo tempo que visava Rui Rio). Num artigo que escreveu no Público — publicado no dia a seguir ao antigo presidente da bancada anunciar a candidatura — Matos Rosa defendeu que “o futuro exige novos protagonistas e Miguel Pinto Luz traz essa renovação”. E que, por isso, “o PSD deve posicionar-se já neste cenário, de olhos postos no futuro”. Ou seja: apostar já as fichas em Pinto Luz.
Na segunda volta 1+1 será mais do que 1?
Dos três candidatos até agora anunciados (Miguel Pinto Luz, Luís Montenegro e Rui Rio), o vice-presidente da câmara de Cascais é o menos conhecido entre os militantes do PSD. Na linha de partida, os candidatos mais fortes (com mais aparelho, mais mediáticos) são Montenegro e Rio, o que significa que — numa lógica de casa de apostas — Miguel Pinto Luz parte como o menos favorito e mais candidato ao terceiro lugar. A própria candidatura parece dizer no slogan que Pinto Luz pode não chegar já a líder, mas trabalha para chegar lá mais tarde: “O futuro diz presente”, é o slogan escolhido.
O próprio José Eduardo Martins, na mesma entrevista à TSF, admitiu que a falta de notoriedade de Pinto Luz torna mais difícil que chegue a presidente do PSD nestas diretas de 2020. O antigo governante disse mesmo que “Miguel Pinto Luz não tem ainda a notoriedade suficiente para, à primeira vez, o conseguir fazer [ganhar as eleições]. Mas tudo se constrói”. Se houver bipolarização, Pinto Luz pode ter a sua candidatura debilitada.
Apesar de, em teoria, não ter condições para ganhar, Pinto Luz pode vir a ser decisivo, já que — num cenário de segunda volta — o somatório do terceiro classificado com o segundo será sempre superior a 50% e, portanto, superior ao resultado obtido pelo candidato que ganhar a primeira volta.
Quando houve apenas dois candidatos, como o foi o caso de Rio e Santana, não há o risco de segunda volta porque o vencedor tem sempre a maioria expressa dos votos. Mas agora há três candidatos anunciados. Os estatutos do PSD dizem claramente que “o presidente da Comissão Política Nacional é o candidato que tenha obtido a maioria absoluta dos votos validamente expressos”. E, caso não se verifique “esta condição”, há então “lugar a uma segunda volta entre os dois candidatos mais votados que se realizará no prazo máximo de dez dias a contar do dia seguinte ao primeiro sufrágio, mantendo-se os mesmos cadernos eleitorais”.
Pode, por isso, dar-se o caso de um candidato ganhar à primeira volta, mas haver uma união entre os apoiantes do segundo e terceiro classificados para o superarem à segunda volta. Resta saber se não se abrem feridas incuráveis durante a fase de campanha eleitoral. Também pode dar-se o caso do vencedor das eleições (seja ele quem for) conseguir reforçar o resultado que obteve na primeira volta à segunda, mesmo que os dois outros candidatos se unam contra si.