Reforçar a autoridade dos professores dentro das escolas é uma prioridade imediata para a Fenprof, que vai pedir também ao Governo que dê apoio jurídico a todos os agredidos que decidam avançar com queixas em tribunal. O anúncio foi feito esta quinta-feira, em conferência de imprensa, depois de uma semana em que foram conhecidos vários casos de agressões a docentes por alunos ou pelos seus familiares, e em que foi denunciada a agressão de um professor de Informática a um estudante, a quem terá apertado o pescoço. O secretário-geral da Fenprof aproveitou o momento para criticar o silêncio do Ministério da Educação, considerando que Tiago Brandão Rodrigues, reconduzido na pasta, deveria ter tomado uma posição pública sobre a violência nas escolas.

“O que os professores esperavam ouvir do Ministério da Educação, desde logo do ministro, era, sem rodeios, a condenação da violência exercida sobre os professores e que estes merecem ser respeitados”, disse Mário Nogueira, em Lisboa. Em contrapartida, lembrou que nesta mesma semana, a tutela foi rápida a condenar, “e bem”, a agressão de um professor a um aluno numa escola de Lisboa.

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Este silêncio, para Mário Nogueira, é também uma forma de desrespeitar os professores. E quando pede maior autoridade para quem ensina dentro de uma sala de aulas, lembra que em muitos casos têm sido os vários  governos a desautorizar os professores, situação que espera ver terminada na atual legislatura.

“Compreende-se a dificuldade dos governantes em fazer esta afirmação, pois, ao longo de anos, têm desrespeitado os professores nas suas condições de trabalho, no seu direito à aposentação, na sua carreira com a eliminação de tempo de serviço cumprido. Estando em vias de se iniciar uma nova legislatura, a Fenprof desafia a equipa ministerial que tomará posse no próximo sábado a assumir uma postura diferente da dos últimos quatro anos, e um sinal disso mesmo será, precisamente, a condenação da violência exercida sobre profissionais que merecem e têm de ser respeitados”, detalhou o líder da federação afeta à CGTP.

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Na quarta-feira, contactado pela agência Lusa, o Ministério da Educação garantiu que as situações de violência grave nas escolas são “residuais” e que existe uma tendência de diminuição de casos. Na nota do gabinete do ministro Tiago Brandão Rodrigues, a tutela repudia todas as agressões “inaceitáveis, seja quem for o agressor”. Sobre um possível aumento de casos, afirmou ter “registo das ocorrências de situações de violência em contexto escolar através do reporte feito pelas escolas à direção de serviços responsável pela segurança” e que, apesar de 2019 não estar fechado, é previsível uma diminuição de casos.

Mário Nogueira defende que não é possível fazer esta afirmação com base nos dados existentes e lembra que muitos casos ficam por denunciar. Só aos sindicatos da Fenprof, durante este ano letivo, que começou há um mês e meio, já chegaram dezenas de denúncias, a maioria das quais agressões verbais ou ameaças. A violência física representa uma minoria das denúncias.

“O facto de terem surgido todos estes casos na imprensa não traduz, por si só, um recrudescimento da violência em espaço escolar. Contudo, afirmar, como fez o Ministério da Educação, que, de acordo com os registos policiais, esta tem vindo a decrescer, é ilação que não pode ser retirada. E não pode porque muitas situações que ocorrem nas escolas não são registadas, por não ser apresentada queixa, e muitos outros atos de violência não têm expressão física, mas verbal ou, até, escrita e posta a circular nas redes sociais. São insultos e ameaças, que muitas vezes os professores procuram não valorizar, embora devam fazê-lo”, acrescentou o secretário-geral.

Muitos dos casos ficam sem denúncia, às vezes porque os professores têm medo de represálias ou de que as ameaças se concretizem, outras vezes por haver pressão das direções para não avançarem com queixas, detalhou Nogueira. “Ninguém, por ser professor pode ter medo de exercer a sua profissão ou de circular livremente na rua e se esses casos são frequentes ou, como afirma o ministério, residuais, isso não retira importância ao problema.”

Por tudo isto, considera fundamental que seja criado um Observatório para a violência nas escolas — proposta que também faz parte do caderno reivindicativo da FNE, a segunda maior federação de sindicatos de professores, afeta à UGT — “com o objetivo de monitorizar o problema, identificar causas e apresentar propostas que o combatam”.

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Para resolver o problema da violência escolar, a Fenprof irá pedir ao Governo — na primeira reunião que tiver com o ministro da Educação — que tome algumas medidas que passam, por exemplo, pela redução do número de alunos por turma, pela colocação de pessoal não docente nas escolas que garanta efetivas condições de segurança, e que os alunos com necessidades educativas especiais recebam o apoio que precisam de docentes e não docentes.

Pede também o agravamento do quadro penal aplicável a situações deste tipo — proposta em que é acompanhada pela FNE — e o apoio jurídico a quem dele precisa, sublinhando que a tutela não tem sequer dado uma palavra de apoio aos professores agredidos este ano letivo.

Na quarta-feira, na resposta à Lusa, o Ministério da Educação afirmava que “tem havido o cuidado de contactar as vítimas de agressão, independentemente do seu estatuto ou condição, para disponibilizar apoio”. Esta afirmação foi desmentida pelo secretário-geral da federação de sindicatos.

“A Fenprof está em condições de afirmar, após ter contactado diversos professores que foram vítimas de agressão, que isso está longe de corresponder à verdade. De todos os contactos efetuados, apenas em alguns dos casos — que remontam ao ano anterior — se registaram contactos. Ainda assim, salvo uma exceção que foi mais mediatizada, o contacto foi efetuado por um elemento de uma direção-geral que disponibilizou apoio psicológico e nada mais. Um dos docentes decidiu apresentar queixa contra o agressor, mas, como não lhe foi dado qualquer apoio jurídico pelo Ministério da Educação, já gastou mais de 2.500 euros com o recurso a tribunal. Mas nem em relação àqueles casos em que houve contacto e que, repetimos, foram os que tiveram maior visibilidade pública, o Ministério da Educação considerou relevante tomar posição pública, condenando a agressão dos professores”, concluiu Nogueira.

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