Esta terça-feira, na antecâmara da ida do Benfica do Lyon, alguma imprensa desportiva garantia que uma vitória encarnada seria o confirmar de um período de retoma. Numa análise rápida, sem grande tempo para fazer contas de cabeça, a premissa faz sentido: as duas derrotas europeias, em casa com o Leipzig e na Rússia com o Zenit, parecem ainda muito recentes, e um nulo com o V. Guimarães para a Taça da Liga entre a receção aos alemães e a visita aos russos deixa parecer que só agora os encarnados estão a recuperar o fôlego. Mas numa análise mais aprofundada, a conclusão final é que o Benfica atravessa nesta altura o melhor período da temporada.

Entre Taça de Portugal, Liga dos Campeões e Primeira Liga, a equipa de Bruno Lage leva cinco vitórias consecutivas, 13 golos marcados e apenas um sofrido. Pelo meio, aproveitou a derrota do Famalicão com o FC Porto e o deslize dos dragões na Madeira para subir à liderança isolada do Campeonato e assumir uma tranquilidade que escapava desde o início da época. Apesar de uma certa irregularidade exibicional, de vitórias garantidas por margens mínimas e de uma gestão do plantel que afastou Seferovic, Raúl de Tomás e até Pizzi das opções iniciais e trouxe algumas críticas a Lage, a verdade é que o Benfica vive o melhor momento desde o regresso à competição depois do verão e era assim que visitava o Lyon, esta terça-feira, na quarta jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões.

Ficha de jogo

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Lyon-Benfica, 3-1

Fase de grupos da Liga dos Campeões

Groupama Stadium, em Lyon, França

Árbitro: Björn Kuipers (Holanda)

Lyon: Anthony Lopes, Dubois, Andersen, Denayer, Koné, Thiago Mendes, Tousart, Aouar (Marcelo, 90′), Reine-Adélaide (Traoré, 73′), Dembélé, Depay (Cornet, 45′)

Suplentes não utilizados: Taturusanu, Rafael, Jean Lucas, Cherki

Treinador: Rudi Garcia

Benfica: Vlachodimos, Tomás Tavares, Rúben Dias, Ferro (Jardel, 16′), Grimaldo, Gedson (Seferovic, 45′), Florentino, Gabriel, Cervi (Pizzi, 73′), Chiquinho, Vinícius

Suplentes não utilizados: Zlobin, André Almeida, Taarabt, Raul de Tomás

Treinador: Bruno Lage

Golos: Andersen (4′), Depay (33′), Seferovic (76′), Traoré (89′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Gabriel (43′), Tousart (50′)

Depois das duas derrotas nos dois primeiros jogos, os encarnados ficaram com uma curta margem de erro mesmo após vencerem os franceses na Luz — na partida em que Anthony Lopes ofereceu a Pizzi o golo da vitória. O encontro desta jornada em Lyon tornava-se então decisivo nas ambições do Benfica em relação aos oitavos da Liga dos Campeões: algo que não os três pontos, tornava complexa a passagem à próxima fase; os três pontos, deixavam a equipa de Lage a depender apenas de si mesma para seguir em frente. Numa coincidência de agenda que se tornou perfeita em termos de enquadramento, Luisão, embaixador do clube, e Pedro Marques, diretor técnico do Benfica Campus, estiveram esta terça-feira na Web Summit, onde falaram sobre o projeto de formação aplicado no Seixal e os objetivos europeus a médio/longo prazo.

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“O Benfica vai continuar a ter sucesso em Portugal, dos jogadores aos técnicos, passando pelos dirigentes. O objetivo é sempre o título, ir à Liga dos Campeões porque é importante para o projeto, e a academia vai ser sempre uma parte fundamental do sucesso para sermos competitivos na Europa. A Champions não é fácil mas podemos ir aos oitavos ou aos quartos e a partir daí tudo pode acontecer. As pessoas têm de continuar a acreditar em nós”, afirmou o antigo central brasileiro que integrou a estrutura durante a temporada passada, logo após terminar a carreira. Luisão estava em Lisboa, a equipa estava em Lyon: mas a mensagem estava bem explícita.

Ainda assim, Bruno Lage voltou a rodar a equipa, uma expressão da qual garantiu não gostar na antevisão. Pizzi, depois de ter regressado à titularidade com o Rio Ave, voltava a ficar no banco de suplentes e dava o lugar a Gedson e Tomás Tavares estava no onze, ao contrário de André Almeida. A estratégia do treinador encarnado, porém, teve de ser reajustada e readaptada logo aos quatro minutos, já que o Lyon não precisou de mais do que isso para inaugurar o marcador. Enquanto culminar de um arranque muito intenso, e quando o Benfica ainda estudava a forma como a equipa francesa se iria apresentar, Andersen surgiu entre os centrais depois de um cruzamento a partir da direita e cabeceou para bater Vlachodimos (4′).

O golo, além de garantir uma vantagem prematura aos franceses, permitiu à equipa de Rudi Garcia adquirir uma tranquilidade que não era, obviamente, intrínseca ao Benfica. O corredor esquerdo do ataque do Lyon, formado por Koné e Aouar, estava a provocar muitas dificuldades a Tomás Tavares, que não só não conseguia parar os dois jogadores com recurso à velocidade como era demasiado frágil a nível físico para corresponder nos duelos individuais. Em cima do primeiro quarto de hora, os encarnados sofreram mais um revés, com Ferro a sair de maca depois de um choque com Vlachodimos (entrou Jardel), e a equipa de Lage só esboçou uma reação já perto da meia-hora, com um remate muito ao lado de Chiquinho.

O avançado, ainda assim, estava a ser o único motor do Benfica, a desempenhar tarefas defensivas e ofensivas e a funcionar enquanto única ligação entre o setor intermédio e o mais adiantado. Carlos Vinícius, muito isolado, estava demasiado apagado para ser influente, e era Chiquinho quem trabalhava entre linhas e provocava os únicos desequilíbrios que ainda iam colocando os encarnados em jogo. Numa altura em que o Lyon desacelerou e baixou o bloco, algo que ainda não tinha feito desde o início do jogo, os encarnados souberam aproveitar — sempre por intermédio de Chiquinho — e equilibraram a partida, com Gedson a ser o protagonista da finalização da primeira jogada com cabeça, tronco e membros construída pelos portugueses (27′).

Foi nesta fase, porém, em que o Benfica parecia estar a conseguir ter mais bola, que o Lyon aumentou a vantagem. Através de uma transição rápida conduzida por Aouar, precisamente no corredor esquerdo onde Tomás Tavares estava a ser totalmente permeável, Depay apareceu no coração da área a responder de primeira ao cruzamento do francês (33′). O segundo golo dos franceses apareceu numa altura em que o Benfica parecia estar a reagir e esse período de retoma manteve-se, apesar do alargar da desvantagem: Chiquinho fez o primeiro remate à baliza já nos descontos, para uma boa defesa de Anthony Lopes, e os encarnados saíram para o intervalo instalados no meio-campo francês.

Na segunda parte, Rudi Garcia surpreendeu ao tirar Depay, um dos melhores dos franceses na primeira parte, para lançar Cornet. Já Bruno Lage, de forma quase inevitável, colocou em campo Seferovic e tirou Gedson, lançando o avançado suíço para fazer dupla com Vinícius, ao passo que Chiquinho ficou mais tombado na direita. O Benfica cresceu no jogo, num crescimento que também pareceu ligado a uma postura mais defensiva do Lyon, e a escassez de situações de ataque dos franceses acabou por permitir as subidas de Grimaldo e Tomás Tavares nos corredores e um maior envolvimento na construção ofensiva.

Ainda assim, o principal problema que o Benfica tinha tido na primeira parte manteve-se na segunda: a ausência de verticalidade, de risco, de pressão elevada e de agressividade. A entrada de Seferovic, ainda que tenha tido o objetivo de colocar mais homens no último terço dos adversários, acabou por fazer mais mal do que bem ao empurrar Chiquinho, o jogador que mais tinha desequilibrado em espaços interiores, para junto do corredor. Até Gedson, apesar de ter estado discreto, tinha sido o médio mais influente na ligação ao ataque — e essa conexão entre setores fez falta na segunda parte.

A partir da hora de jogo, o Lyon percebeu que estava a resistir com relativa facilidade à reação encarnada e entrou em modo gestão, a procurar mais bola e mais posse. Bruno Lage esgotou as alterações com o recurso a Pizzi e a verdade é que o médio português precisou de poucos minutos para ter influência no marcador: com um passe de rotura, do meio-campo para o ataque, que raramente tinha sido visto durante toda a partida, encontrou Seferovic, que dominou com o peito e atirou de pé esquerdo para reduzir a desvantagem (76′). O golo, porém, não teve o efeito catalisador que se poderia antecipar e os encarnados acabaram por sofrer novamente, já em cima do último minuto do tempo regulamentar, por intermédio de Traoré (89′).

O Benfica perdeu em Lyon, somou a terceira derrota em quatro jogos na Liga dos Campeões e já não depende apenas de si para chegar aos oitavos de final da Liga dos Campeões. Numa altura em que restam duas jornadas da fase de grupos, o mais provável é que os encarnados acabem por discutir a vaga da Liga Europa com o Zenit. Esta terça-feira, em Lisboa e na Web Summit, Luisão voltou a falar do projeto europeu do Benfica, que tem como objetivo a ultrapassagem progressiva de etapas até à conquista final da Liga dos Campeões a médio/longo prazo. Mas também esta terça-feira, em Lyon, Bruno Lage tirou do onze André Almeida e Pizzi: e se o primeiro fez falta face à sofrível exibição de Tomás Tavares, o segundo mostrou a influência que tem com a assistência que providenciou assim que entrou. Entre Lisboa e Lyon, a mensagem ter-se-á extraviado.