As manifestações em Hong Kong estão a “dar força a Taipé”, disse em entrevista à Lusa o embaixador António Santana Carlos, considerando que a China tem “efetivamente um problema” com a situação na antiga colónia britânica.

António Santana Carlos, que exerceu funções como embaixador de Portugal na República Popular da China entre 2002 e 2006, depois de ter chefiado a parte portuguesa do Grupo de Ligação Conjunto (GLC) para a transferência de Macau, considerou que dificilmente se alastrará ao território administrado por Portugal até dezembro de 1999 a contestação verificada em Hong Kong.

Para já o território é muito diferente de Macau, a região tem outra dimensão, outra economia. Tem um peso muito importante, os grandes trunfos da área financeira de Pequim são Xangai e Hong Kong”, afirmou.

Questionado sobre as diferenças verificadas ao nível da consciência política nos dois territórios, Santana Carlos respondeu: “Hong Kong tem uma massa crítica que às vezes cria problemas à China, como agora está a acontecer, porque tem uma opinião pública – até por ser maior – que não tem a atitude da opinião pública de Macau”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Não quero dizer que há interferências, mas eles criaram uma situação complicada para a República Popular da China em Hong Kong”, acrescentou.

O problema, está a “refletir-se nas relações entre Pequim e Washington”, porque “quer o senado, quer a câmara dos representantes norte-americana aprovaram decisões apoiando o lado de manifestações em Hong Kong e criticando a China”, observou.

“E essa posição foi posteriormente utilizada pelo presidente Donald Trump, o que criou dificuldades à China”, acrescentou.

Na análise do diplomata, a China não só pensa na estabilidade de Hong Kong e Macau, como essa estabilidade é “muito importante para aplicar o objetivo de ‘um país – dois sistema’ a Taiwan”.

“Essas manifestações, no fundo, acabam por dar força a Taipé, porque é fácil perceber, não é? A República Popular da China tem, efetivamente, um problema com a situação que decorre neste momento em Hong Kong”, declarou.

Já em Macau, “a opinião pública é muito mais pequena, a massa crítica é menos ativa”, disse o ex-responsável pelo Grupo de Ligação, frisando que Portugal conseguiu manter uma “relação de amizade e cooperação” com as autoridades chinesas diferente.

Tanto no processo de Macau, como no de Hong Kong, houve primeiro uma festa portuguesa antes da meia-noite, depois da cerimónia de transição, com as duas partes presentes ao mais alto nível e depois, finalmente, uma festa chinesa”, recordou.

Em Hong Kong, contou, “nem nenhum representante da China foi à despedida britânica, nem nenhum representante do Reino Unido foi à festa chinesa, depois da transição”.

Em Macau, o ministro dos Negócios Estrangeiros chinês foi à despedida portuguesa e o homólogo português, Jaime Gama, também esteve presente na celebração dos chineses.

“Conseguiu-se um entendimento que julgo que é mais do que simbólico”, considerou Santana Carlos, para quem a postura das duas partes “valorizou e continua a valorizar o relacionamento Portugal – China”.