O candidato às eleições presidenciais na Guiné-Bissau Domingos Simões Pereira admite que o Senegal possa temer a sua eleição por saber que a sua capacidade de defender o país “é incomparavelmente superior” à do seu adversário.

Em entrevista à agência Lusa em Lisboa, o candidato apoiado pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) refere que “provavelmente o Presidente do Senegal [Macky Sall] e o próprio Senegal” poderão ficar “bastante mais tranquilos” se for eleito o seu adversário, Umaro Sissoco Embaló, na segunda volta das presidenciais, em 29 de dezembro.

“Se for o caso, será exclusivamente por eles perceberem que a minha capacidade de defender a Guiné-Bissau é incomparavelmente superior àquela do meu adversário, que olha para o Governo e olha para o Estado numa perspetiva completamente folclórica”, diz. Questionado sobre se considera que o alegado apoio do Senegal ao seu adversário pode ser uma ameaça à soberania da Guiné-Bissau, Domingos Simões Pereira refere que a ameaça “não é necessariamente aquilo que é a posição e a visão das autoridades senegalesas”, mas “a ignorância que pode haver por parte das autoridades guineenses”.

É medonho pensar que nós podemos ter um chefe de Estado que não sabe rigorosamente nada sobre a história dessas relações”, diz, referindo-se a Sissoco Embaló, a quem acusa de nunca ter ouvido falar de questões como a definição da plataforma continental ou a delimitação de fronteiras, que dominam as relações entre a Guiné-Bissau e o Senegal.

Segundo o candidato do PAIGC, os guineenses “precisam saber dessas questões” para perceberem “o risco que paira” sobre a Guiné-Bissau. Neste sentido, Simões Pereira defende que a questão que se coloca atualmente é perceber se “a delimitação da fronteira marítima entre o Senegal e a Guiné-Bissau está abrangida pelo acordo que foi assinado antes da proclamação da independência dos dois países e portanto os dois reconhecem esse traçado e a inalterabilidade dos limites que foram fixados ou se é algo posterior a essa proclamação” e deve ser reavaliado.

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Ressalvando que não está a propor nenhuma revisão dos tratados existentes, o candidato defende, no entanto, que esta questão deve ser “um objeto de estudo” e de “um trabalho consistente”, sobretudo agora que o Senegal anunciou a descoberta de petróleo.

“O Senegal descobriu petróleo, descobriu gás, mas descobriu petróleo onde? Descobriu gás onde?” – questiona, referindo-se ao traçado que delimita a fronteira marítima entre os dois países e a zona conjunta, bem como os azimutes que levaram à definição desse traçado.

A Zona Económica Conjunta tem cerca de 25 mil quilómetros quadrados da plataforma continental e é gerida por uma agência de gestão e cooperação, baseada em Dacar, atualmente presidida pelo antigo primeiro-ministro guineense Artur Silva. A ZEC é considerada rica em recursos haliêuticos, cuja exploração determina 50% para cada um dos Estados, e ainda hidrocarbonetos (petróleo e gás), mas cuja divisão é 15% para a Guiné-Bissau e 85% para o Senegal.

Sob orientação do Presidente cessante, José Mário Vaz, o Estado guineense disse pretender uma nova partilha em relação ao petróleo, mas as negociações que começaram em 2014 ainda não foram conclusivas. Várias personalidades da sociedade civil guineense e o ex-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Zamora Induta defendem que estas negociações devem ser suspensas até que o Senegal aceite renegociar a delimitação de fronteiras marítimas e terrestres.

Domingos Simões Pereira considera que as suas partes devem respeitar as regras que foram definidas e que “não pode ser o Senegal a interpretar as regras” pela Guiné-Bissau. “Nós vamos continuar a ser a periferia dos outros Estados que nos deixam migalhas e nós temos que nos contentar com isso?”, questiona.

O candidato defende ainda que se as interpretações dos acordos não forem coincidentes, será necessária a intervenção de “entidades terceiras”, mas não como em negociações anteriores em que o Senegal foi assistido pela França, ex-potência colonial, enquanto a Guiné-Bissau foi assistida pela Argélia.

“Não compreendo e certamente enquanto chefe de Estado irei querer compreender, mas na base de um diálogo franco, de um diálogo sem comprometimento porque os chefes de Estado africanos que me conhecem hoje sabem que eu falo sem restrições porque a minha única responsabilidade é defender a verdade e o meu país”, diz. “Isto não pode ser folclore, isto não pode ser brincadeira. Isso pode pôr em causa a nossa soberania”, remata.