O hacker Rui Pinto disse numa entrevista à revista Der Spiegel que tem “dúvidas” de que vá ter um “julgamento justo”, reconhecendo que poderá vir a ser condenado por “vários crimes” que não terão sido cometidos por ele mesmo, mas por outros que ele prefere não denunciar.

“Não vou ser bufo de ninguém”, sublinhou, numa entrevista dada dentro do Estabelecimento Prisional de Lisboa. “Aceito completamente que, do ponto de vista da lei portuguesa, algumas das minhas ações possam ser consideradas ilegais, e vou falar sobre isso. [Mas] mantenho que muitas coisas que são referidas não foram feitas de forma ilegal.”

Em entrevista à alemã Der Spiegel, que publicou em parceria com Rui Pinto e outros hackers não identificados um conjunto de artigos que apontavam para várias instâncias de fuga ao fisco entre jogadores e personalidades do futebol, como Cristiano Ronaldo ou José Mourinho, o homem de 30 anos fala de forma crítica da justiça portuguesa.

“Duvido que venha a ter um julgamento justo. Creio que este caso acabará por chegar ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, porque Portugal não se preocupada nada com a proteção de denunciantes”, disse Rui Pinto.

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Só 12 dos 59 alvos de Rui Pinto apresentaram queixa. Um deles foi Bruno de Carvalho

Naquela entrevista, o hacker gaiense que foi detido na Hungria em janeiro e extraditado para Portugal em março, recorre ao exemplo do Benfica — Rui Pinto é suspeito de ter entrado em vários emails da sociedade de advogados da PLMJ, que defendeu o clube da Luz no caso do e-toupeira — como exemplo ilustrativo das suas críticas.

“Se olharem para o Benfica, que é o clube mais popular de Portugal, vão ver que é um polvo de influências entre a elite da nação”, assegura o hacker, acrescentando que o clube da Luz tem “boas relações com a polícia, procuradores e políticos a quem dá regularmente bilhetes VIP para jogos”. “Seria um enorme conflito de interesses caso algumas vez eles tenham de investigar o Benfica a sério”, sublinhou.

De forma geral, Rui Pinto critica o poder do futebol, que diz ser um meio “intocável” e sobre o qual poucas pessoas chegam a olhar com um olhar crítico que vá para lá das quatro linhas.

Ministério Público acusa hacker Rui Pinto de 147 crimes

“É sempre a mesma merda, estes anos todos. Continua e continua. Desde que a equipa deles esteja a ganhar, as pessoas não querem saber de mais nada, mesmo que saibam das falcatruas, dos crimes e das falhas sistémicas. Eu não consigo lutar contra isso. O futebol é intocável. E as autoridades protegem o setor só porque é de grande interesse público”, diz.

Em prisão preventiva desde março de 2019 por suspeitas de ter entrado nos sistemas informáticos da PLMJ, do Sporting Clube de Portugal, da Doyen Sports e até da Procuradoria-Geral da República, entre outros, Rui Pinto conta que, depois de ter estado em regime de isolamento, agora está inserido num regime em que está lado a lado com outros prisioneiros que podem desempenhar tarefas.

“Eles podem cozinhar, lavar roupa, até têm uma pequena loja. Eu posso sair da minha cela e passar algum tempo com eles, mas não posso trabalhar. Também não posso ir para o pátio exterior. Isto foi uma ordem específica do diretor da prisão”, disse o hacker.

Reconhece que passar o Natal na prisão vai ser “duro”, mas admite que até agora não tem tido uma experiência totalmente negativa. “Até agora, não presenciei qualquer tipo de comportamento violento”, diz. “Mas os guardas também já me disseram que esta prisão é o paraíso comparada com outras que há no país.”

O encontro secreto entre o ex-advogado de Rui Pinto e a Doyen — com a PJ na mesa ao lado