A “maior fragilidade” da investigação em saúde em Portugal é a falta de transferência do conhecimento para empresas e hospitais, alerta Sobrinho Simões, que há 30 anos fundou o Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto.

“Nós continuamos a ser excessivamente investigadores. A maior fragilidade da investigação em saúde é a translação do conhecimento. Falta a dinâmica das empresas e dos hospitais na procura pelos institutos”, salientou.

Manuel Sobrinho Simões, que falava à Lusa a propósito do 30.º aniversário do Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (Ipatimup), marcado durante este ano por várias iniciativas, admitiu que a “falta de translação” existente na área de investigação em saúde é “um defeito do país”. “Isto impede a capacidade de tornar o modelo mais vivo, porque continuamos a ter muitos papers [artigos científicos] e poucas patentes. Isto não é uma coisa sui generis, é Portugal”, defendeu.

Se em 1989, aquando da fundação do Ipatimup, Manuel Sobrinho Simões, ainda com 42 anos, desejava “ter as vantagens da universidade, sem ter os inconvenientes”, isto é, liberdade, capacidade de contratação e de concorrer a projetos, hoje acredita que o essencial é “aumentar o valor social” da investigação produzida. “Tivemos condições excecionais para fazer o Ipatimup. Somos uma história de sucesso e viemos de muito baixinho, num país que tinha ficado virado ao contrário”, contou o médico, relembrando que, à época, eram 50 as pessoas, desde técnicos a doutorados, que trabalhavam no instituto.

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E se, por um lado, a década de 1980, marcada pela introdução da avaliação externa, deu “um arejamento brutal” à produção científica portuguesa na área da saúde, nos últimos anos “tal não se verificou”. “Sentimos que estávamos num platô, precisávamos de aumentar a capacidade de interação e produção científica transversal e de dar utilidade social, porque já não interessava só publicar os melhores papers“, explicou o professor.

Foi deste “platô”, isto é, das “pequenas e poucas elevações” existentes no caminho traçado pelo instituto que, em 2008, surgiu o Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S), resultante da fusão entre o Ipatimup, o Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e do Instituto de Engenharia Biomédica (INEB).

Pelos corredores do i3S circulam, atualmente, 1.500 pessoas, que, entre laboratórios e escritórios se debruçam sobre “três universos”: o cancro, as doenças neuropsiquiátricas e a interação dos hospedeiros com os organismos.

No entanto, apesar do “excecional trabalho desenvolvido” pelos investigadores, Sobrinho Simões afirmou que falta “aumentar o valor social” da investigação, mais concretamente, no que à capacidade de elaboração de “produtos e serviços com valor comercial” concerne.

À semelhança da introdução de “valor social” na investigação, o patologista sustentou a necessidade de a área ser “mais determinante em algumas políticas”, dando como exemplo os açúcares, tabaco, alimentação, obesidade e pseudociências. “A saúde é um problema muito complexo. Devíamos estar preocupados com a saúde e estamos sempre preocupados com a doença, mas não nos podemos esquecer que, na investigação em saúde, e mesmo no tratamento e prevenção, a incerteza faz sempre parte da equação”, concluiu.