E no primeiro espaço de comentário de Luís Marques Mendes em 2020, o ex-líder do PSD escolheu a temática do Orçamento do Estado para traçar aquilo que, na sua interpretação, pode vir a ser o cenário governativo português dos próximos quatro anos. Começou pela sua avaliação do atual governo de António Costa, que classifica como sendo mais fraco que o da legislatura passada. “O governo ‘Costa 2’ é mais fraco que o governo ‘Costa 1′”, começou por dizer antes de justificar a afirmação com base em três critérios: “Tem mais votos e deputados [Governo] mas é mais precário porque acabou a Geringonça, agora são acordos à la carte. Não tem causas mobilizadoras — antigamente tinha a devolução de rendimentos, agora já não — e é um governo cansado por causa de um “erro de fabrico” que Costa cometeu logo no início: fez um Governo recauchutado.”

Foi tendo isto como base que Marques Mendes teceu as suas opiniões sobre o Orçamento do Estado: “As negociações dos últimos dias são a prova do que acabei de dizer. No passado, com quatro Orçamentos, toda a gente sabia logo que eles acabariam por passar. Agora há dúvidas.” Mesmo assim, tendo em conta toda esta fragilidade, Marques Mendes acredita que o OE vai passar “porque ninguém quer criar já uma crise política”. Olhando para os tempos que aí vêm, também não será no OE a seguir a este, o de 2021, que surgirá um chumbo, isto porque tudo se passará “em vésperas das eleições para Presidente da República” e da “presidência portuguesa da UE” — “ninguém quererá criar uma crise nessa altura.”

O problema surgirá no terceiro Orçamento, “o de 2020″, porque já não vão haver constrangimentos desse género e, por causa disso, haverá menos resistência ao chumbo.”Não vai ser fácil e pode haver uma crise política”, diz o comentador antes de enunciar os motivos que poderão ou não gerar este cenário de crise: “Vai depender do desgaste do governo, das sondagens, das autárquicas e de quem for o líder do PSD.” É por tudo isto que Marques Mendes afirma: “O PCP e BE não têm alternativa se não absterem-se na votação deste OE. Votar a favor não podem porque já não têm a influência política que tinham. Como também não podem passar já para o voto contra — seria uma rotura brutal com o passado –, vão abster-se.”

Eleições no PSD e Isabel dos Santos

As eleições no Partido Social Democrata, que estão a pouco mais de uma semana de acontecer, foi outro dos temas em cima da mesa. “É difícil antecipar o resultado da eleições internas porque não há sondagens.” Mesmo assim não se inibiu de tecer uma análise sobre o panorama atual desta corrida à liderança do partido que já encabeçou: “Acho que entre Rui Rio e Montenegro as coisas estão muito empatadas. Vê-se pelo apoio nos distritos. Admito que Rio possa ter alguma vantagem na primeira volta mas longe dos 50%. Deverá ser precisa uma segunda volta. Teve 54% na última [eleição] mas desta vez não será igual. Já Miguel Pinto Luz deverá ter melhor resultado do que está à espera.”

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Na sua opinião existem cinco distritos principais que serão determinantes para a eleição: Lisboa (onde “Miguel Pinto Luz será o mais provável vencedor porque joga em casa”), Porto (onde “pelo mesmo critério Rio terá a vitória”), Braga, Aveiro e Leiria, onde Montenegro terá uma “vantagem ligeira”. Tudo isto, afirma, cria uma conjuntura que se traduz numa “competição muito renhida que pode não se resolver no dia 11 mas sim no dia 18, numa segunda volta, algo que nunca aconteceu no PSD.”

Angola e Isabel dos Santos são outros temas que também têm dominado a atualidade, com o “previsível” arresto de bens da filha de José Eduardo dos Santos. O comentador explica que João Lourenço sempre teve “na família dos Santos um alvo principal na sua cruzada política ao longo dos anos” e por isso “havia sempre de ir chegar à pessoa mais famosa da família, Isabel dos Santos.”

O ex-líder dos sociais democratas explica ainda que aos “empresários e investidores ligados ao ‘antigo regime'” foi dada uma de duas opções: “negociação ou tribunais”. Ora como Isabel dos Santos sempre “recusou sempre a negociação (ao contrário de outros que se livraram de problemas)”, era só “uma questão de tempo até que fosse parar à justiça.” O que mais importa, porém, é o timing da decisão, algo que não é inocente, na visão do comentador: “Esta ação, neste momento, dá muito jeito ao governo de Angola porque o país está a atravessar aquele que será talvez o pior momento da era João Lourenço: a economia está em baixo, o desemprego está altíssimo, a desvalorização da moeda e galopante e há uma perda de popularidade enorme. Um caso deste género ajuda a desviar atenções e dá popularidade internamente.”

Panorama internacional: Irão e Espanha

Finalmente houve também tempo para duas notas sobre o panorama internacional. Primeiro os recentes desenvolvimentos que envolvem os EUA e o Irão, algo que para o comentador marca o “regresso da instabilidade” e traduz-se num “mundo que fica mais perigoso”. As razões para esta tomada de posição de Trump, aponta Marques Mendes, justificam-se por “um misto de tentar reforçar popularidade interna criando um inimigo externo” e “a imprudência tradicional de Trump”. Essa imprudência também pode muito provavelmente ser ilegal, já que Trump não só não informou o Congresso da sua decisão como também não deu esclarecimentos às Nações Unidas — “Se fosse a China ou a Rússia a fazer o mesmo todo o mundo ocidental caía-lhe em cima.” No meio disto tudo o mais preocupante é a certeza de que “o Irão vai retaliar” — Não está em questão um conflito mundial, “eles não têm capacidade para tanto”, mas assiste-se ao “aumento de tensão numa zona que já é um barril de pólvora.”

A investidura de Pedro Sanchez em Espanha também mereceu reparo, com o comentador a louvar o facto do país “finalmente ter Governo” mas realçando que nem tudo pode ser positivo, isto porque, primeiro, trata-se do “primeiro governo de coligação em Espanha e o mais à esquerda que ela já teve, algo que pode exigir maior atenção aos investidores externos”, por causa da instabilidade. Depois porque Sanchez prometeu “direito de consulta aos catalães” mas não foi explicado ao certo o que isso é, instabilidade que pode criar problemas. Finalmente porque a fortificação da esquerda por muito bem criar uma “radicalização à direita.”