O ano judicial começa esta segunda-feira, numa sessão de abertura que deverá ser marcada pelo combate à corrupção, delação premiada, megaprocessos, morosidade e falta de funcionários nos tribunais e na Polícia Judiciária.

Ao contrário do que estava inicialmente previsto, a cerimónia deste ano terá o primeiro discurso de Menezes Leitão, em representação da Ordem dos Advogados (OA), apesar de só tomar posse como bastonário no dia 14 de janeiro, em vez da intervenção de despedida de Guilherme Figueiredo, que saiu derrotado na sua recandidatura à liderança da instituição nas eleições realizadas em dezembro passado.

O evento, que conta com intervenções da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem; da procuradora-geral da República (PGR), Lucília Gago; do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), António Joaquim Piçarra e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ocorre numa altura em que importantes investigações – caso BES/GES, operação Lex, caso TAP, processo EDP (que envolve o ex-ministro Manuel Pinho e o presidente da EDP, António Mexia) – ainda não saíram da fase de inquérito, e em que processos como o do BPN se prolongam e arrastam em recursos sem trânsito em julgado à vista.

A cerimónia, sobretudo de caráter simbólico e que este ano coincide com o fim das férias de Natal dos magistrados, assinala também o arranque de um ano em que é aguardado o fim da instrução do processo Operação Marquês, que determinará se o antigo primeiro-ministro José Sócrates, o seu amigo e empresário Carlos Santos Silva e o ex-presidente do BES Ricardo Salgado, entre outros arguidos, vão ou não a julgamento.

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Em 2020 são ainda aguardados desenvolvimentos no processo Octapharma, no caso Lex (que já levou à expulsão do juiz Rui Rangel) e no caso de Tancos, cuja instrução se inicia em 8 de janeiro, apenas dois dias após a abertura do ano judicial, com as atenções viradas sobretudo para o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, acusado de prevaricação e denegação de justiça no caso da recuperação de armas furtadas dos paióis da base militar de Tancos.

É esperada também evolução na instrução do processo relativo ao “hacker” Rui Pinto, bem como no caso do grupo motard “Hell Angels”, e também no julgamento do caso de Alcochete, que implicou, entre outros, o ex-presidente do Sporting Bruno de Carvalho. Com atraso na resolução do inquérito continua o caso Raríssimas, assim como o da TAP em que o ex-presidente daquela companhia aérea Fernando Pinto é arguido.

Em termos de política de justiça, um dos temas que parece incontornável na abertura do ano judicial é a iniciativa do Governo de criar um grupo de trabalho, liderado pela ministra da Justiça, para definir, no prazo de três meses, uma estratégia plurianual de combate à corrupção. Prevê-se, entre outras medidas, a implementação e aperfeiçoamento do instituto da delação/colaboração premiada, que incentive e proteja quem colabore com a justiça na descoberta dos crimes, sobretudo de natureza económico-financeira, mas o tema revela-se polémico, tendo ficado fora das medidas aprovadas no último Pacto para a Justiça, pacto esse que acabou por ficar em larga medida “na gaveta”, designadamente as medidas anticorrupção aí previstas.

Vários partidos com assento parlamentar colocaram já reservas à figura da delação premiada, incluindo o Partido Socialista, que avançou com a medida para assinalar o Dia Internacional Contra a Corrupção.

A falta de funcionários judiciais nos tribunais, o atraso na aprovação dos seus Estatutos, o défice de inspetores na Polícia Judiciária, a falta de peritos na investigação criminal e no combate ao cibercrime, a par do descontentamento sindical nos Registos e Notariado são outras questões que ensombram a imagem da Justiça em vésperas da cerimónia, que irá decorrer no salão nobre do Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa.