Tornou-se um momento habitual no início de todos os jogos dos Michigan State Spartans. Cassius Winston, o base de 21 anos que é a estrela da equipa universitária de basquetebol, cumprimenta todos os colegas, saúda os adeptos nas bancadas e vira-se para o cesto que vai defender. Bate a mão contra o vazio, passa-a no ombro esquerdo e dá um pequeno salto para a frente, como que à procura de um outro corpo para dar um amigável encontrão. Não  está lá mais ninguém, mas Cassius parece estar a cumprimentar especialmente outra pessoa. Porque para ele, essa outra pessoa está lá.

O jogador norte-americano, candidato a saltar para a NBA a curto prazo, é o principal elemento dos Spartans e um olhar à vista desarmada poderia achar que os gestos não passam de uma de tantas superstições que os atletas colecionam. Mas o gesto é um hábito — um hábito adquirido durante a infância, durante a adolescência, durante a passagem de menino para jovem e de jovem para adulto. Era a forma como Cassius cumprimentava Zachary, o irmão mais novo que se suicidou no início de novembro do ano passado. O irmão mais novo que Cassius quer manter em cada pavilhão em que joga.

Com apenas 19 anos, Zachary Winston foi colhido por um comboio — numa tragédia que chocou o basquetebol norte-americano, tanto universitário como profissional, já que também o irmão de Cassius praticava a modalidade, na Albion College. No dia seguinte à morte de Zachary, quando ainda nem se conheciam ao certo as circunstâncias da morte, o base jogou, marcou um triplo no primeiro lançamento da partida e fechou a exibição com 17 pontos e 11 assistências antes de sair no final do segundo período. “Para ser honesto, não estava à espera de que ele jogasse. Mas toda a gente faz o seu luto de forma diferente e nós deixámos que fosse uma decisão do Cassius a 100%. Os irmãos são o mundo inteiro para ele. Nunca conheci um miúdo, ao longo de todos estes anos, que fosse tão próximo dos irmãos. O Zachary também cresceu com esta equipa, era próximo de todos os jogadores”, disse Tom Izzo, treinador da equipa, no final do jogo.

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Com Tom Izzo, o treinador dos Spartans

Tom Izzo, que nesse jogo menos de 24 horas depois da morte de Zachary teve de controlar as lágrimas antes do apito inicial, tem sido o principal braço direito de Cassius Winston. Em conversa com o The New York Times, o treinador garantiu que este é “o período mais difícil” pelo qual já passou e que pediu a Cassius para lhe ligar “sempre que for preciso” — mas que, por vezes, não sabe também o que dizer porque ele próprio está a atravessar um período de luto. “Não há livro para isto. Só quero perguntar: ‘Qual é o capítulo?’. Quando perdemos, as pessoas ficam chateadas e parece que é a morte para essas pessoas e tentamos tornar os jogos como se tratasse de vida e de morte, mas não são nada disso. Mesmo algumas dessas coisas, por muito traumáticas que sejam, não são vida e morte. E isto, o que torna tudo isto diferente, é que se trata de vida e morte”, explicou Tom Izzo, acrescentando ainda que por vezes se coíbe de festejar vitórias porque “não se sente bem a sentir-se bem”.

Desde novembro que os Spartans jogam com um emblema no equipamento onde se lê “smoothie”, a alcunha pela qual os amigos de Zachary Winston o tratavam. No passado domingo, menos de dois meses depois da morte do irmão, Cassius quebrou o máximo pessoal ao marcar 32 pontos num único jogo. No final, disse aquilo que toda a gente vê no início de todos os jogos. “Todas as memórias que tenho dele são boas memórias e isso é tudo o que posso pedir. Não existem más memórias. Não existe nenhum arrependimento. Agradeço tudo o que ele foi na minha vida, agradeço pela nossa relação e esta é a minha maneira de mostrar que ainda aqui estou, que ainda me esforço por ele e que um dia vou vê-lo outra vez. Ele está ali comigo”, confessou.