Em 2016, a Apple abandonou os planos para dar aos utilizadores total encriptação dos dados que guardam na iCloud, o sistema de armazenamento na nuvem da marca. A decisão surgiu depois de o FBI (a polícia de investigação dos EUA) se queixar de que a medida iria prejudicar investigações, avança a Reuters. A agência de notícias cita fontes desta autoridade norte-americana, que afirmam que, ao contrário do que a Apple tem sido acusada, a empresa compactua bastante com as autoridades.
A notícia surge uma semana depois de Donald Trump, presidente dos EUA, ter utilizado o Twitter para afirmar que a Apple não ajuda a desbloquear os seus smartphones para auxiliar investigações. A crítica do chefe de Estado foi feita após o procurador-geral do país, William Barr, ter acusado a empresa tecnológica de não dar “ajuda suficiente” em alguns casos. Na origem desta última polémica está o facto de o FBI querer desbloquear um iPhone de um militar da Arábia Saudita (que matou três norte-americanos em Pensacola, na Florida, em dezembro) e não conseguir fazê-lo. A Apple tem refutado as críticas dizendo que tem auxiliado nas investigações.
We are helping Apple all of the time on TRADE and so many other issues, and yet they refuse to unlock phones used by killers, drug dealers and other violent criminal elements. They will have to step up to the plate and help our great Country, NOW! MAKE AMERICA GREAT AGAIN.
— Donald J. Trump (@realDonaldTrump) January 14, 2020
A decisão da Apple já tem dois anos, mas é conhecida depois desta polémica. Apesar de, no passado, a empresa ter-se mostrado inflexível, nos bastidores, o cenário, pelos vistos, é outro. Em 2016, quando o FBI pediu acesso ao iPhone de um traficante de drogas, a Apple chegou a ir tribunal porque não queria comprometer a segurança dos seus equipamentos. Contudo, à Reuters, fontes da Apple dizem que a empresa não avançou com a “ecriptação end-to-end” no seu armazenamento na nuvem, o iCloud, para evitar mais casos como esse.
Privacidade. Apple ganha caso contra o FBI que pode abrir precedente
A encriptação “end-to-end” é uma forma de criptografia digital que é considerada das medidas mais seguras para se proteger informação trocada entre dispositivos eletrónicos. Teoricamente, ao utilizar esta tecnologia, nem a Apple teria poder para descodificar conteúdos dos seus clientes. Exatamente por isso é que a empresa de Sillicon Valley não aplicou este mecanismo ao iCloud.
Segundo o mesmo meio, a Apple tem dado às autoridades norte-americanas informação de cópias de segurança de utilizadores para auxiliar investigações. E fê-lo inclusive no caso de Pensacola. O problema é que a Apple, ao não permitir encriptação end-to-end, pode estar a comprometer a segurança dos dados dos utilizadores apenas para evitar problemas com o FBI, que recorrentemente pede ajuda à empresa.
Apesar de a Reuters assumir que a marca pode ter largado os planos para criar uma encriptação mais eficaz por outros motivos, seis fontes afirmaram à agência de notícias que tal aconteceu depois das reuniões entre responsáveis da empresa com o FBI. Um antigo funcionário chega a afirmar que a empresa largou o projeto para proteger melhor o iCloud, porque depois teria mais clientes que deixariam de poder aceder aos seus dados caso se esquecessem da palavra-passe.
“O departamento legal [da Apple] acabou com o projeto, por razões que podem imaginar”, disse ao jornal uma destas fontes. Alegadamente, a empresa ao tomar a decisão de acabar com essa iniciativa fê-lo para evitar as acusações de proteger criminosos que agora recebeu.
Ao contrário dos problemas que o FBI tem para desbloquear smartphones iPhone de alguns utilizadores — porque precisa de aceder fisicamente ao aparelho — o acesso à iCloud pode ser remoto. Como revelou a Apple este sábado, as autoridades norte-americanas pediram para aceder — e acabaram por ter acesso –, a cópias de segurança de seis mil utilizadores para ajudar a investigação de 1568 casos. E estes números são referentes apenas na primeira metade de 2019.