alta de luz, água e segurança, baixos salários e a escassez de produtos alimentares e medicamentos continuam a ser as principais preocupações dos venezuelanos, que vivem o dia-a-dia “num desafio constante” que se repete. “A vida, na Venezuela, transformou-se num constante desafio. Cada dia há algo novo com que se preocupar. Coisas que noutro país podem ser simples, por exemplo, encher o depósito de gasolina ou ir ao supermercado fazer compras básicas, podem exigir várias horas”, explicou uma venezuelana à agência Lusa.

Gloria Menezes, viúva de 55 anos, trabalha a dias na limpeza de escritórios e casas, diz que “sempre foi difícil manter a família” da qual fazem parte um filho e uma filha e um neto de quatro anos. “A insegurança não é algo novo, há anos assassinaram o meu outro filho, em Petare [bairro popular do leste de Caracas], mas às vezes parece que está mais perto”, desabafa, explicando que houve alguns meses em que, mesmo no autocarro, as coisas pareciam mais calmas, mas “há uma semana roubaram os telefones e as carteiras a todos os passageiros”, disse.

Quanto à alimentação, explicou à Lusa que os patrões e amigos a ajudam, mas que frequentemente tem que tocar-lhes à porta à procura de algo mais, como pão, comida ou dinheiro.

“O salário mínimo é de 450 mil bolívares (5,47 euros à taxa de câmbio oficial) e um quilograma de cebola custa 90 mil BsS (1,09 euros). Em dezembro pediam quase o dobro por um quilograma de tomate. Comprar um quilograma de queijo mozarela ou amarelo há muito deixou de ser possível porque atualmente custam dois ordenados mínimos por mês”, explica.

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Para Miguel Pereira, divorciado de 40 anos e empregado de uma empresa de segurança, as principais preocupações são “a alimentação para si e dois miúdos em idade escolar e o transporte” que “além de difícil de conseguir leva grande parte do salário”.

“Além dos alimentos, os miúdos precisam de livros, roupa e medicamentos. Eu cobro quinzenalmente e ganho, ao mês, quase dois salários mínimos, que em menos de uma semana se esfumam. Se não fosse a ajuda da minha mãe, com o dinheiro que conseguiu guardar enquanto trabalhava, teria que emigrar”, explicou à Lusa.

Miguel Pereira salienta que “cuida” de um edifício de escritórios em Caracas, uma profissão que requer muita atenção, principalmente durante a noite e os apagões elétricos.

“A luz falha com frequência. É preciso abrir manualmente os elevadores para as pessoas saírem e reforçar a vigilância não vá alguém aproveitar-se da escuridão para roubar um escritório ou algum trabalhador. Como a água só chega semanalmente durante algumas horas à semana, temos que estar pendentes das bombas, verificar se há fugas e muitas vezes ouvir as pessoas queixarem-se pelo estado do comedor e das casas de banho”, acrescenta.

Para Carlos Peña, de 65 anos, reformado, a principal preocupação é conseguir os medicamentos para a diabetes e a hipertensão que, diz, “às vezes estão esgotados e algumas marcas importadas custam muito dinheiro” e por isso estão fora de alcance.

Vários comerciantes explicaram à agência Lusa que mais de 60% da economia está “dolarizada”, ou seja, os preços são afixados em dólares ao câmbio do dia, em bolívares, nalguns casos com uma pequena margem para “compensar” possíveis variações cambiais.

No entanto, queixaram-se que os fornecedores sobem os preços com frequência, “mesmo em dólares, o que implica que a inflação ocorre primeiro em moeda estrangeira e consequentemente em bolívares”.

Em várias regiões do país surgiram vários ‘bodegones’ (lojas com produtos importados) onde as pessoas que têm moeda estrangeira podem conseguir os produtos que escasseiam nos supermercados tradicionais.